Ilusão

Com olhar pesado e demonstrando cansaço o homem vai seguindo, andando rapidamente, desvencilhando-se dos desligados transeuntes que cruzam seu caminho.

- Estúpidos - pensa consigo - como podem estar tão dispersos?

Não encontra resposta.

Por acaso já gostou de perder tempo? se pergunta. Não, nunca gostou.

Desde criança abstinha-se das brincadeiras de seus colegas para estudar. Seu discurso? Não queria perder tempo. E a adolescência não o mudou. Enamorou-se de uma linda morena com olhos amendoados, mas desvencilhou-se rapidamente; não podia perder tempo com essas frivolidades. A juventude o mudou? Impossível. Ele impassível, manteve seu discurso, abrindo mão dos deleites da mocidade; Não iria perder tempo em aventuras supérfluas. Namorou rapidamente, se casando logo em seguida. Para que perder tanto tempo esperando? Foi sua resposta à mãe da noiva que, desconfiada, o questionou sobre os motivos da repentina união. Os filhos não tardaram a vim, afinal, não podiam perder nem um minuto sequer.

Imerso nesses lembranças e com pressa para ultrapassar os vagarosos caminhantes a fim de poupar tempo, não nota o sinal fechado.

O carro o acerta, lançando-o ao alto.

Ainda em choque, jogado ao chão, sentindo a vida se esvair, reflete:

Foi feliz ? Não, não foi.

Enquanto seus olhos sem vida fitam o céu, ocorre-lhe um último pensamento: Quanta ironia !

Está morto.

Matheus R Botelho
Enviado por Matheus R Botelho em 03/09/2020
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