Cachoeira do Carrinho
Final do mês de novembro do ano de 1974. Não muito longe dali, mas faltando alguns metros.
Descendo uma trilha meio íngreme, com algumas pedras vermelhas e pretas ao lado. Uma pedra maior, onde pousam suavemente gaviões, tucanos, urubus e outras espécies de aves. No chão, entre o capim verde, pois o período chuvoso já se inicia, pequenas pedras soltas e alguns formigueiros. Árvores de goiabas se misturam com outros tipos de arbustos. O vento sopra suavemente para refrescar e evaporar o suor derramado pelo corpo arrefecendo o rosto molhado de exsudação como se fosse um ventilador natural.
A primeira curvinha da trilha passa. A segunda curvinha é um pouco mais forte fazendo com que se vire perto de noventa graus à direita. Enfim, uma pequena descida da trilha de pouco mais de cinquenta centímetros. A trilha acaba e logo se embrenha na rústica estrada, não muito larga, com alguns capins no meio dela. Pedras pontiagudas e lajotas de cascalho. O chão se transforma na cor branca. Algumas árvores de madeira de lei são vistas pelo caminho. Pequenos cupinzeiros transformam a paisagem. Uma nova trilha corta a estrada de ponta a ponta, pois é a passagem de animais que vão para o outro pasto, mais abaixo e mais acima.
Vira-se à direita e logo a paisagem muda. À primeira vista, os olhos focalizam-se em uma enorme casa de seis a oito janelas, em vidraças voltadas para o alto. Uma pequena varanda é vista na lateral direita. A cor branca e as janelas pintadas na cor azul lembram as cores celestes combinadas com pequenas nuvens brancas vistas lá no fundo.
A descida é um pouco mais íngreme, mas não mais de que duzentos metros. A terra batida vai-se mudando de cor a cada momento e se transformando em terra mais escura, pois se aproxima de um pequeno riacho. Coberto por uma pequena ponte feita de eucalipto e mantada de terras firmes, ouve-se um sensível barulho de uma minúscula cachoeirinha entre algumas pedras. A vegetação é baixa, mas composta de vários arbustos. Embiris cobrem quase toda a margem do riacho. As grandes folhas e o perfume das flores dão um nobre clima de frescor e de natureza viva e pura.
Após apreciar e sorver o perfume dos embiris, olhando pela esquerda, avista-se uma casa na cor amarela. Uma grande varanda cobre parte dela e o acesso mais rápido é passando por uma pinguela feita de troncos de madeira nobre. A estrada fica um pouco mais abaixo, mas o caminho mais rápido e emocionante é atravessar a lendária pinguela. Uma vasta planície é vista. O verde plano é origem da grande quantidade de gramas que se misturam a pequenos arbustos. Percebe-se, também, árvores de goiaba.
Subindo pela estrada escura, com gramas e capins no meio dela, pois a terra é de origem vulcânica, olhando para o lado direito, depara-se com uma pequena casinha na cor branca. O alicerce é alto. Lindas gramas verdes são vistas até a chegada do local. Lá, como de costume, está erguido um moinho, tocado por um grande canal de água vindo do ribeirão. O som das águas caindo dá a impressão de que está dentro de uma cachoeira. Várias borbulhas de águas são vistas. Cortinas de pequenas gotas de água vão ao encontro de quem ali se aproxima. A vegetação no local é grande pela consequência de muita água. O restante da água corre diretamente para o pequeno córrego e deságua na ponte anterior.
Em uma pequena elevação de menos de um metro, está passando por uma outra ponte de madeira. Logo abaixo dela, estão as águas que movem o moinho. A correnteza é forte pelo grande volume de água. Conta-se que muitas pessoas iam naquele somente para lavarem seus veículos. Sempre tinha alguém ali lavando um veículo. Eram o fusca, o corcel, a variante e o jipe.
Um pouco mais à frente, caminhando pela mesma estrada, agora com restos de fezes de gado bovino, algumas pedras pontiagudas, galinhas, pintinhos, frangos, galinha da angola, patos, gansos rodeavam uma construção feita de paus atravessados, coberta de telhando rústico de telhas de bica. Uma pequena escada feita de pedras era o acesso à porta do paiol. Na mesma construção, foi construída uma grande coberta, onde os bezerros pequenos dormiam. Estavam, também, ali, os arreios e os apetrechos de cavalos, cochos e até um carro de boi. Uma cerca separava a estrada e uma pequena elevação feita de pedra, onde foi colocada uma porteira de madeira, muito pesada, com trinco rústico.
Assim que adentrava na porteira, após fechá-la, olhado para esquerda, surgia a grande casa. Na cor branca, com janelas grandes e vidraças. Um grande muro de pedras limitava o curral, grande, meio de ladeira. No meio dele estava fincado um grande tronco de madeira. Este tronco era para amarrar o gado no momento de cura, que se fazia com o produto chamado “neguvam” misturado em óleo de motor já utilizado. Acima do muro, surgiam algumas flores e uma planta chamada saborosa, que produzia uma linda fruta, na cor vermelha, muito doce e o nome foi dado de saborosa.
Um grande passeio separava o curral da casa sede. Ele era alto. Tinha uma pequena escadinha para tornar o acesso mais disfarçado. Uma pequena porteira separava o passeio e seis degraus já condiziam à varanda. Coberta de telhas de bicas, rodeada com um banco de madeira. Algumas flores ornamentavam o lugar. Uma lâmpada muito forte clareava o escuro da noite. A poucos metros da varanda, uma grande porta de tábuas bem espessas. Era grande, de duas bandeiras, na cor azul, iniciava o deslocamento para a grande fazenda. Uma grande sala, com dois grandes bancos, ornamentada por uma mesa, coberta por um pano branco, onde se via a imagem de Nossa Senhora Aparecida e algumas flores brancas e lírios nas cores vermelha e branca, enfeitavam a imagem. Vários grandes quartos espalhados nas imediações. Um pequeno corredor conduzia à cozinha.
Duas grandes janelas clareavam a grande cozinha. Uma na parte de cima e outra na parte de baixo. O grande fogão à lenha, com o fogo aceso e várias panelas de ferro sobre ele. Lá se armazenavam o arroz, o feijão, o angu, a carne de porco, o frango caipira, a abobrinha, o quiabo, o jiló e outras variedades de comidas. Uma imensa mesa no centro e ladeada por dois grandes bancos de madeira. Acima dela, um bule de café, uma vasilha de biscoitos, broa, bolo e queijo bem fresquinho.
Ao sair da cozinha e caminhar por mais alguns metros, ouvia-se o som lindo e estrondoso, vindo ao encontro dos ouvidos. Eram as águas caindo de muitas pedras e se empossando em um grande lago. As águas caiam de mais de dez metros de altura. Na queda, formavam um lindo véu branco. Muitas pedras ao redor. Ali, na época do calor, vinham muitas pessoas para nadarem. Eram jovens, homens, mulheres, crianças, famílias e amigos. Nos finais de semana, muitos ali estavam para se refrescarem das límpidas e temperadas águas da Cachoeira do Carrinho.