JUSTUS SALARIUM

Justus Salarium, todo dia pela madrugada, atravessava uma parte da Via Ápia afim de trabalhar numa Ferraria próxima daquela via. Jovem sonhador, conquistara a confiança de seus tutores, desta forma fora a ele delegado responsabilidades sendo respondidas à altura, deixando-os satisfeitos. Com o tempo Justus Salarium percebera a lucratividade produzida pelo seu trabalho como também de seus colegas forjadores, porém as parcas moedas que recebiam em troca não eram o suficiente para seu sustento. Seus tutores cada vez mais enchiam seus alforjes de moedas de ouro, prata, como também alguns papéis secretos assinados por senadores, governadores, talvez até pelo próprio Imperador.

Num final de noite após longas horas de trabalho, Justus Salarium resolvera conversar com seus tutores acerca daquela situação insustentável, pois cada dia mais, as parcas moedas que recebia pelo seu trabalho se desvalorizavam. Já era a hora de rever o seu ganho como também de seus colegas forjadores, pensava ele para si convicto de que seria atendido seu pedido. Chegando no átrio do palacete fora recebido por um séquito de escravos que não o deixara continuar sua caminhada, forçando-o voltar ao seu lugar de origem. Cabisbaixo e desorientado fora caminhando para o seu lar imaginando ter sido expulso por aqueles a quem trabalhava e o “idolatravam”.

Seus princípios humanistas não o fizeram desistir. No dia seguinte, seguindo a mesma rotina, se encaminhara para a Ferraria convicto de que conversaria com os demais colegas a fim de se unirem numa mesma reivindicação onde todos fossem atendidos em seus reclames. O dia laboral se encerrara ao cair da noite e Justus Salarium iniciara a conversação com seus colegas acerca de seu intento frustrado junto aos seus tutores. A conversa entrara noite adentro junto a mesa da taberna Calígulas onde ficara acertado de que os demais o acompanhariam num próximo encontro com seus tutores.

Passaram-se duas semanas, Justus Salarium e uma comitiva foram ao palacete para uma conversa com seus tutores, no entanto chegando ao átrio, um séquito de escravos novamente impede a entrada do grupo informando de que eles estavam com suas agendas ocupadas, desta forma não poderiam recebê-los. Um dos escravos descontentes com sua mesada, falara ao pé do ouvido de que seus tutores estavam naquele momento discutindo com um grupo de senadores, seus amigos, alterações na lei que iriam alterar demasiadamente a relação tutor/tutorado. Mais uma vez Justus Salarium é preterido por seus tutores causando mal estar nos demais amigos que nele confiavam, provocando certa desconfiança no grupo. As discussões se tornavam intermináveis a cada dia que passava. De um dia para outro, toda a comunidade passara a discutir seus problemas, cada qual opinando a cerca da nova lei que os senadores discutiam no Fórum, somente entre eles e aqueles que representavam o Imperador.

Com tantas informações recebidas, bem elaboradas, diga-se de passagem, uma grande parcela daquela comunidade se convencera de que a nova lei traria mais benefícios do que prejuízos. O caos se abatera naquele local. O grande incêndio que destruíra toda cidade e vizinhança, sem nem mesmo saberem sua origem, deixara a comunidade em polvorosa, se bem que corria um boato de que o responsável fora um baixinho louquinho que se imaginava o dono do mundo, “amante das artes”. Outros falavam vir do oriente este braseiro, no entanto nada se confirmara. A única certeza era de resolver o mais rápido possível a situação dos tutores para que a cidade ressurgisse das cinzas tal qual a Fênix sob a batuta de um grande imperador.

Justus Salarium não cria no que estava acontecendo. Seus próprios colegas, os mais atingidos pela famigerada lei, concordavam ser este o melhor caminho para refrigerar o solo aquecido de um insano incêndio. E os nossos tutores, não vão abrir seus alforjes recheados de moedas e dividir o prejuízo, refletia Justus Salarium em momentos de tensão, angústia e apreensão. O Fórum e o Sinédrio começaram a vê-lo como uma persona non grata ameaçando sua estabilidade emocional e laboral. Seus colegas o evitavam. Justus Salarium sentira-se só, desprotegido, caluniado, desvalorizado. E ele que um dia fora bajulado por seus tutores, condecorado por seu trabalho, símbolo de honestidade, hoje relegado ao ostracismo, ficara cansado, fora morrendo, morrendo, sem valor da mais valia...

Valmir Vilmar de Sousa (Vevê) 16/08/20

valmir de sousa
Enviado por valmir de sousa em 16/08/2020
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