241 - O Jardim
Ninguém antes o viu. Nasceu assim, com as pernas incapazes de marcha e nunca esteve, por seus meios em pé. Em casa ensinaram-no a ler e a fazer contas poupando-o à maldade das outras crianças da Escola. Sem nada para fazer decidiu que faria o jardim no centro da aldeia, um lugar vasto onde, nos bancos de pedra, se sentavam os ociosos e os velhos para conviver. A família não conseguiu demovê-lo e João, sem que a princípio ninguém reparasse, arrastou-se para medir e riscar. Ia, vinha, retirava ervas e alisava o terreno, cavava a duras penas, encaixava pedras, construía. - Que fizesse, autorizara o Regedor. Um dia plantou a primeira árvore e os que, sem ajudar, se riam dele, viram-no por muito tempo, de sol a sol, plantar outras, desenhar e fazer os canteiros, esboçar e fazer os degraus da escada, cuidar das plantas que conseguia, organizar os alfobres e os transplantes, regar com esforço hercúleo puxando baldes com água do bebedouro das bestas até onde fosse preciso. Passou a ser alvo da atenção e das conversas e a ironia deu lugar a uma incipiente admiração. Falaram dele na Feira e o padre tomou-o como exemplo em variadas prédicas. A seguir aconteceu tudo muito rápido: veio a verba para a iluminação e foi decidido, oficialmente, que ele não só merecia um emprego bem remunerado como lhe era devida consideração. Esta história aconteceu num país da América Latina. Infelizmente não consegui recordar-me do local nem do nome real do herói desta narrativa. Chamei-o João.