240 - O Mendigo
- Tome lá um euro e não o vá gastar em vinho. O homem olhou a moeda, meteu-a ao bolso, sacudiu os ombros, puxou o chapéu para o rosto e arrastou-se para uma sombra do jardim. Desde que, para escrever, se fingia de mendigo teve ocasião de analisar as pessoas que lhe davam esmola. A última senhora recomendava a utilização do dinheiro que lhe dera e, a anterior, dissera: - dinheiro, não dou. Pegue este pão com manteiga e coma. Raros o olharam nos olhos, poucos o consideraram um homem como os demais. Um, porém, lhe disse: - Não quero saber onde vai gastar o dinheiro, esse é um problema só seu. E abrindo a carteira lhe entregou uma nota. Na verdade não havia um padrão de comportamento nem uma atitude genérica ou o mesmo jeito de considerar o outro em sua fragilidade e contingência. Muitos dos que ajudam são, frequentemente enganados com doenças inexistentes, com falsas receitas para aviar, com crianças que tomam de empréstimo para sensibilizar os renitentes. A caridade , simplesmente, não deveria existir se a sociedade se organizasse para responder com dignidade a quem precisa. E, feitos todos os apontamentos, o pedinte contou o dinheiro recebido, analisou todas as experiências que teve, despiu a roupa, tirou a cabeleira e decidiu que escrever sobre quem dá esmolas ou quem as recebe é dissertar sobre a humanidade em geral. Uns são gente, outros parecem.