À vista
- Finalmente você está aqui. - Disse-lhe logo após uma golada numa xícara quente de café.
- Minha nossa que vista!
- Surpreendente, não é. Não sei porque hesitou tanto para vir para cá. Olha tudo que você perdeu por tanto tempo.
- Sim e nem sei o porquê.
- Porque estava focado demais no que tinha partido e não no que te esperava.
- Copo meio cheio e meio vazio?
- Justo, justo - Concordou o velho, caindo em gargalhada logo após. Sua risada era diferente da sua voz, ela era rouca e castigada pela experiência.
- Eu não to acreditando que cheguei. E, tão pouco que me esperou por tanto tempo. Desde quando mesmo?
- Desde que te obriguei a partir. Me desculpe, eu precisava fazer aquilo.
- Eu sei, eu sei. Nunca vou perdoá-lo por aquilo e acho que nunca entenderei de fato. Mas estou grato. Meu deus, olha essa vista. É incrível!
Esticou os braços, fechou os olhos e inalou a maior quantidade de ar puro que podia. Realmente, toda a dimensão e beleza que contemplava, não haviam palavras.
- Você acreditou em mim, por quê? - Indagou o jovem.
- Precisa de uma razão?
- Sim, preciso.
- Então não aprendeu nada nessa jornada.
- Aprendi muito, na verdade.
- Mas não o mais importante.
- E qual seria?
- Quem você é.
O jovem fez cara de pouca crença naquilo.
- Sou só mais um.
- Os “mais uns” não veem o que você está vendo.
Ele não respondeu. Colocara suas mãos no bolso e ficara ali, em pleno silêncio. O vento balançava seus cabelos. A serenidade do lugar, a paz, o sol tocando o horizonte. Havia mais o que sentir do que falar.
- Tome, dê um gole.
Ele pegou a xícara daquelas mãos enrugadas e engoliu sem perguntar o que havia.
- Rum? - Fez uma pergunta seguida de uma tosse.
- Bom né? Para aquecer seus ossos. Um bom rum e uma boa paisagem. Tudo que um homem precisa.
- Precisei disso por tanto tempo.
- E não estava pronto para ter, por isso demorou tanto.
- E, agora estou?
- Copo meio cheio e meio vazio de novo?
- Sim, acho que sou isso. Um copo que não transborda e nem esvazia.
- Não, jovem. Você é um homem que se cansou de transbordar e ninguém beber da sua fonte; e estar vazio sem ninguém enche-lo novamente. É por isso que está aqui. Não porque precisa se encontrar, mas porque se encontrou. Isso não basta?
- Basta, por ora. Mas tenho medo de voltar e ser quem fui. De me perder. De voltar a estar meio cheio e meio vazio.
- Ninguém que viu essa vista antes, voltou do mesmo jeito. Você não já sente?
O peso nos ombros se foi. Você não é mais quem era. Deixou nascer uma parte de ti que já era para ser, porém teve medo de deixar brotar. Se permita ser dessa vez.
Nada respondeu. Ficou ali, quieto, contemplando tudo. Contemplando a vista que tinha e sentindo o vazio dentro do seu peito partir.