207 - O Regresso
Preferiu a cadeira mais alta, arrumou a bengala e colocou a caixa com as fotos antigas no regaço. Estavam, todos, ali. Presos ao tempo, imóveis e sorridentes. Dantes enchia-se o peito de ar, encolhia-se a barriga e cada um sorria para alguém que haveria de ver, gostar, quem sabe ter a curiosidade de saber quem era. A vida era dolente, compassada, sem nada de verdadeiramente empolgante. Foi assim que gostou dele, cabelo à Rodolfo Valentino, o herói das fitas que passavam no Recreativo aos domingos. Ao tempo, preparava-se desde sexta. Os papelotes no cabelo, a água oxigenada nos pelos das pernas e nos braços para os alourar, a carne crua nos olhos para apagar as olheiras e sumo de limão para clarear a pele do rosto e das mãos. Quando badalavam as nove horas de domingo iam, todos asseados, em roupa muito engomada, ouvir missa. Ficavam à frente em banco reservado para a família e, a bem dizer, da prédica nunca se lembrava. Queria que aquilo acabasse para sair por ser à saída que a semana tremia tal com as pernas se ele estivesse. E um dia veio às falas e noutro falou com Pai.- Este rapaz quer-se casar contigo, que dizes? E falou por si um silêncio ruborizado, o olhar baixo, as mãos suadas. Casaram. Foram amigos e felizes numa altura de muitos sacrifícios e ela pariu os que agora, um a um, saiam da caixa das fotos para preencher o melhor das recordações. Ele, o marido, ali parecido com um artista do cinema mudo, sorria para ela apoiado a uma coluna onde o fotógrafo colocara o jarro com rosas brancas.