Conversa de bar IV

Conversa de bar IV

(Ana)- Tiago, você reparou que não decidimos as coisas o tempo todo, que a gente precisa de uma força de coisas estranhas.

(Tiago)- Sim, Ana, elas adoram dar umas voltinhas na mente da gente. Às vezes nós as chamamos propositalmente, tipo, me confundam a mente pra eu fugir do tédio.

(Ana)- Até nas coisas mais simples, tipo, tal pessoa me ama, e é tudo mentira, aí de repente tal pessoa está namorando com você e cai a ficha, ela deve estar enganada, como se fosse um feitiço mal feito, aí, a farsa continua e você pensa, como se sai dessa loucura de namorar. Você não sabe o que faz, chega no caixa eletrônico e pensa se sair os códigos da senha todos do lado esquerdo é pra continuar. Então os códigos saem todos saem do lado esquerdo, você respira e pensa, obrigada por decidir por mim, e não resolve nada da sua vida.

(Tiago)- Já cheguei a me embriagar mais do que devia por esses sinais, pensando, se o rótulo da garrafa vier virado pro meu lado a próxima vai ser a saideira, se estiver virada pro outro lado, bebo mais três, se sair espuma congelada, só vou embora quando o dia amanhecer... então, a espuma veio congelada, que era uma hipótese descartada, era só pra encher o saco, e ela veio e foi ótimo ter ficado pra ver o dia, um dos melhores da minha vida, daí continuei com essas piras.

(Ana)- E música, você aposta música de rádio?

(Tiago)- Direto. São como guias, eu tenho duas opções para fazer duas coisas diferentes, penso: a primeira música vai ser um dos programas, a segunda, o outro, aí a música que eu gostar mais vai ser o programa que eu vou escolher.

Já fiz isso com viagem também, praia e tal, primeira música, uma praia. E a outra praia, a quarta música que tocar. Mas, nem sempre eu sigo.

(Ana)- É como se tudo fosse oráculo e a gente ficasse consultando. Se aparecer uma estrela agora, é para escrever para um amigo que não vejo faz tempo, se eu ver a lua de manhã, é pra passar o dia lendo, se três flores estiverem desabrochadas uma do lado da outra, da mesma cor, na mesma intensidade, tem um filme passando que vai fazer diferença na sua vida, é que preciso ir ao cinema.

(Tiago)- Você consultou alguma coisa pra encontrar comigo hoje?

(Ana)- Consultei.

(Tiago)_O quê?

(Ana)- A sua mensagem me convidando, ora bolas.

(Tiago)- E os sonhos? Você costuma consultá-los também para as decisões diárias?

(Ana)- Ah sim. Há quem considere os sonhos como oráculos de probabilidades. Antigamente, em épocas que o ser humano tinha poucas (mas grandes) preocupações, ele via os sonhos como ferramentas de sobrevivência. Hoje, com muitas (mas em boa parte banais) preocupações, nós temos sonhos complexos e confusos, mas sempre acredito que podem trazer boas respostas.

(Tiago)-Por exemplo?

(Ana)-Se eu sonho com brincadeiras de infância, vou visitar amigos antigos. Se sonho com campos desertos, planto algo. Se sonho que subo um morro carregando pedras enormes, trato de amenizar a vida tomando uma cerveja.

(Tiago)-E já sonhou comigo?

(Ana)-Claro. Ontem mesmo.

(Tiago)-E o que planejava após o sonho?

(Ana)-Te convidar para esta conversa. Mas você me convidou antes!