CADÊ MINHAS ROSAS?

Eu estava com problemas quanto às formigas.
Aquelas coisinhas pretas e marrons, atacando minhas rosas! Onde já se viu?
Era a quarta vez na semana que eu ia até o jardim e mais uma rosa era encontrada com pequenas mordidas nas folhas. Tadinhas delas! Antes verdes e belas, agora raros pedaços verdes.
Era inverno, então não haveria flores ou brotos nas plantas, era a época em que as folhas verdes e os espinhos eram a única coisa que se veria. Mas não ali. Ali as formigas devoraram tudo, deixando apenas os caules.
– Rosaaaa! Olha essas porcarias aqui de novo! Cadê as minhas rosas?
De dentro de nossa pequena casa amadeirada e apodrecida, minha velha e pesada esposa saiu bufando, como se eu estivesse a lhe importunar:
que diiio? De novo Osvaldo, eu já te disse que não tem formiga nenhuma!
– Mas olha, olha bem! Quem fez isso com minhas rosas?
Minha esposa olhou para onde eu apontava a mão, balando a cabeça.
– Osvaldo, as rosas estão normais, para com isso!
Olhei indignado para ela, certo de que algo estava errado. Como ela não via? Com certeza ela não estava bem e isso me preocupou. Preocupou tanto que aceitei a sugestão dela e entrei em casa, esquecendo momentaneamente minhas plantas, somente porque estava preocupado com Rosalina. Estaria ela bem?
Fazia semanas que eu notara que algo a afetava. Salgava demais a comida, não ouvindo os cachorros no quintal e andava me falando coisas estranhas, sobre eu estar com uma aparência mal. Oras! Estava eu tão bem! Jovem como nunca! Mas... E ela?
Dentro de casa, ela me entregou uma cuia de chimarrão, e colocou-se a lavar a louça na pia.
– Rosa, tratou os cán?
Minha esposa parou com o prato ensaboado na mão e se virou irritada.
, o que tu tem Osvaldo?  Não temo cán nenhum!
Má dio santo! O que está acontecendo contigo muié? Claro que temo!
Minha mulher decidiu apenas me ignorar e seguir lavando a louça, como se eu não estivesse tentando ajudá-la. Sinceramente, eu estava começando a me preocupar. Primeiro as formigas, agora os cães.
Com certeza, era o tempo. Rosa estava ficando velha. Eu podia ver isso na pele dela, que antes fora lisa e macia, mas agora era áspera e flácida. Sem falar dos olhos lagrimosos e os pés rachados.
Em algum momento, enquanto observava os ombros dela se mexerem ao fazer o trabalho na pia, entendi que não podia culpá-la por seus enganos, eu a amava fazia anos. E amaria mesmo se ela enlouquecesse. Eu a amaria porque adorava o modo como seus lábios ficavam rígidos quando sorria, mesmo que ela pouco o fizesse. Eu amava como ela rebolava quando caminhava e como ela se irritava quando eu tocava em seu cabelo. Eu a amava, mesmo que estivesse perdendo os juízos.
– Eu te amo Rosa.
Novamente, ela parou o que fazia e focou-se em mim, mas dessa vez com algo que poucas vezes notara em seus olhos escuros: Tristeza.
– Eu também te amo, Osvaldo.
Eu não soube na hora o porquê, mas havia lamento em sua fala.
Como era inverno, anoitecia cedo e logo o céu escureceu, pareceu-me de bom grado deitar-me na cama e adormecer, mas minha mulher resolveu ficar na cozinha costurando. Estranhei o ato, já que há anos ela perdera o hábito viciante.
O mais estranho, entretanto, deu-se na manhã seguinte.
Primeiro percebi que minha mulher não estava na cama ao meu lado. Depois me ocorreu que não havia nada de minha mulher no quarto, nem roupas, nem perfumes, nem porta-retratos. Resolvi então ir à cozinha ver o que estava acontecendo.
Lá, dois fatos me chamaram atenção: Um deles foi a louça suja na pia; o outro, foi o frasco vencido de remédios sobre a mesa. Há quanto tempo eu tomava comprimidos vencidos?
Lembrei-me da recomendação do médico e de seu aviso: Eu enlouqueceria aos poucos, mas o remédio manteria a sanidade suficiente para eu viver mais alguns meses.
Por uns míseros momentos de lucidez, lembrei que nunca me casara, que não tivera cães nem rosas no jardim.
Enquanto estava lúcido, lembrei-me do desgosto pela mísera vida que tivera e a solidão que o fim me parecia.
Depois, simplesmente percebi que isso era besteira.  O que eu estava pensando?
Ali estava minha mulher, entrando pela porta da cozinha e brigando comigo como de costume:
Porco cán, dormiu até agora?
Danieli Mützenberg - 18 anos
Enviado por Ilda Maria Costa Brasil em 09/02/2020
Reeditado em 10/02/2020
Código do texto: T6861920
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