Orquídeas

Eu olhos as flores no canteiro, orquídeas, as minhas preferidas e lembro do dia em que as plantei ali, eu as olho com um sorriso satisfeito, plácido, quase me desapego das memórias que eles me trazem. Me fazem de lembrar de quando eu a conheci, do quanto os meus olhos brilharam quando de vi atravessar a rua com a sua blusa de moletom cor de rosa, você parecia estar vindo na minha direção, para mim, para os meus braços e para a minha vida, eu senti como se o mundo viesse para os meus braços.

Não pude deixar de falar com você aquele momento mesmo, um esbarrão de leve no seu ombro e você deixou cair uns livros que carregava, qualquer coisa de Clarice Lispector, então, eu a ajudei a pegar os livros, comentei alguma coisa sobre os livros, sobre Clarice e depois sobre outros autores, já que eu não conhecia muita coisa da Clarice. Em seguida, tomamos um café junto, fizemos isso pois era propicio, afinal de contas tinha cafés localizados de forma alternada com outros estabelecimentos, eu pedi um café expresso médio e ela pediu um capuccino. Eu posso lembrar do sabor do café e logo depois, do sabor do capuccino que tinha em seu beijo.

Trocamos números e combinamos de nos ver o quanto antes, e foi o que aconteceu, nos vemos a segunda vez, a terceira vez, a quarta veza e na quinta tivemos a nossa primeira relação sexual, foi incrível, duas pessoas extremamente desajeitadas, mas, fizemos e foi muito bom, pois era com ela e assim que terminamos e estávamos deitados olhando para o teto eu a pedi em namoro e ela aceitou, no mês seguinte, fomos comprar as alianças, foi um momento muito mágico, todo o nosso namoro foi maravilhoso, apresentei ela aos meus amigos e familiares e ela me apresentou aos amigos dela e de certa forma tudo parecia estar no lugar certo, todos haviam se dado bem, achei uma das amigas dela meio louca, mas até aí tudo bem.

Com pouco tempo, eu a pedi em casamento e foi um momento único, foi durante um jantar num restaurante três estrelas que era o que podíamos pagar, as coisas tinham tudo para melhorar, tanto que eu só pedi ela em casamento porque eu havia sido promovido no trabalho e ela estava num trabalho estável, pelo sim e pelo não, não ficaríamos tão desalentados,todas as seis pessoas que estavam no restaurante bateram palmas para a gente, até ganhamos uma sobremesa de graça, um mousse de limão, não existe coisa que eu odeie mais do que mousse de limão, porém, ela disse que tudo ficaria perfeito se dividíssemos um depois disso tudo.

A promoção no trabalho veio em ótima hora, aos poucos nós conseguíamos comprar as coisas, tentamos não tirar proveito do dinheiro extra e reservamos ele para comprar algumas coisas para o casamento, separamos o dinheiro e tudo parecia estar seguindo um plano perfeito, no meio do caminho, aproveitamos bastante, saíamos durante os feriados, saíamos com os amigos, as vezes com os delas, as vezes com os meus e as vezes juntávamos os amigos, eles pareciam se sentir bem juntos também, conseguíamos mentalizar churrascos e confraternizações; quem sabe até mesmo com os nossos filhos, teriam tios e padrinhos incríveis.

Um pouco mais de seis meses depois mais ou menos e já estava agendado o nosso casamento, nos casamos três meses depois, num bela cerimônia no civil, reconsideramos e aquele dinheiro que separamos para o casamento, decidimos viajar um pouco, fomos passar uns dias no nordeste, os melhores e mais relaxantes dias da minha vida e eu acredito que tenham sido os dela, assim que voltamos, tomos atrás de uma casa que estávamos de olho, afinal, aquele dinheiro tinha que ser bem utilizado. Era uma casa grande para os nossos padrões, mas era o que queríamos, então corremos atrás para comprá-la e sem muito esforço conseguimos, toda a papelada estava em ordem e por isso tudo correu muito bem e consideravelmente rápido. Lembro dos meus braços cansados de tanto carregar móveis e caixas para dentro da casa nova; lembro também do olhar de alegria dela.

Logo que terminamos de arrumar a casa, resolvemos fazer um churrasco para inaugurar a a casa, chamamos todos os amigos próximos e todos eles trouxeram algo para a casa nova, foi um dia muito agradável, eu me diverti com todos que estavam ali e pra falar a verdade, eu nem reparei que a minha esposa tinha sumido por cerca de meia-hora, provavelmente ela estava arrumando as coisas dentro de casa, ela saiu com duas vasilhas com salada e pedaços de carne, um dos meus amigos até estava ajudando dela.

Os meses se passaram, assim se foi o primeiro ano, o segundo ano e finalmente o terceiro; eu acreditava realmente que estávamos indo muito bem, eu saia para trabalhar todos os dias e conseguia tirar pelo menos um fim de semana para jogar futebol com uns amigos, pelo menos os que ainda jogavam um deles havia parado de jogar com a gente, nem todo mundo consegue ter tempo livre. A minha esposa saía para trabalhar, voltava até mesmo mais cedo, o horário dela havia ficado mais flexível, eu gostava disso, ela dizia que gostava de chegar mais cedo, dava mais tempo para organizar as coisas e como sempre estava tudo em ordem, eu não tinha do que reclamar.

Depois disso, a próxima coisa que lembro, foi o dia em que eu precisei ficar um pouco mais no trabalho, devido a uma daquelas reuniões extremamente chatas, reuniões com pautas que poderiam ter sido enviadas por e-mail, eu olhava o relógio impacientemente querendo chegar em casa, querendo correr para os braços da minha esposa, quem sabe até ter uma noite de sexo que há tempos não tínhamos, mas o chefe não parava de falar. Depois de duas longas horas, finalmente fomos libertos, eu andei apressadamente até o carro e assim que entrei, dei a partida e fugi dali.

Cheguei em casa e a noite destacava as luzes acesas, as luzes da sala, da cozinha e até do nosso quarto, eu estacionei o carro em frente o portão da garagem, peguei a minha pasta e fui em direção a porta, assim que entrei eu percebi que estava tudo fora do lugar, as coisas estavam bagunçadas, eu considerei que ela tivesse tirado o dia de folga da casa, não quis ficar arrumando as coisas, ela tem o direito. Fui até a cozinha e tomei um suco de laranja, coloquei o meu copo junto das demais louças que já estavam na pia, logo eu tirei o paletó e o joguei sobre o sofá, onde já tinha um casaco dela jogado, deixei os sapatos ao pé da escada e subi em direção ao quarto, tanto a luz da escada, quando a do corredor estavam acesas, eu já estava afrouxando a gravata, quando ao empurrar a porta para entrar, eu vejo ela na cama com um dos meus amigos... O mesmo amigo que estava ajudando ela naquele churrasco... O mesmo amigo que não tem ido mais ao futebol.

O meu coração acelerou de repente, senti como se as minhas mãos fossem explodir se eu não usasse elas para fazer algo muito ruim para eles dois, esse tempo todo, eles dois e na minha casa. Eu segurei a minha respiração e andei de costas até me virar para descer as escadas, aproveitei que estava de meia e desci correndo, fui até a cozinha e considerei pegar uma faca, mas eu não pude. Aquilo tinha muito tempo, não poderia ser tão rápido assim, seria rápido demais, eu precisava fazer com que demorasse, então, eu peguei uma panela e enchi de óleo, coloquei na boca grande do fogão e liguei no máximo, esperei o óleo ferver olhando em direção a escada e me perguntando o porquê ele ainda estava aqui em casa, então eu olhei para o meu celular, eu não havia avisado que estava saindo... Eu que marcava o tempo deles ficarem juntos.

Ouvi o óleo começar a ferver, desliguei o fogo e peguei a panela com luvas térmicas, e subi cuidadosamente as escada, passei o corredor em direção ao quarto, terminei de abrir a porta para não derramar o olho que ainda borbulhava um pouco e num movimento instintivo de virar o rosto, eu joguei todo o liquido que estava na panela encima dos dois corpos que se amontoavam, o movimento foi seguido de gritos de dor que soavam praticamente em uníssono, eu ainda acertei a cabeça do meu amigo com a panela quente, o sujeito terminou de deitar sobre o corpo da minha esposa que gritava de dor. Saí as pressas do quarto e corri para o andar de baixo, desta vez eu fui atrás da faca, precisava dar fim aos fritos dela, peguei a maior faca e corri de volta para o quarto, ela já havia se desvencilhado da corpo dele, mas, antes que ela pudesse esboçar qualquer reação de defesa, eu cravei a faca em seu pescoço, o corpo dela caiu pesadamente, em seguida, considerando que ele não houvesse morrido, eu apunhalei ele na nuca.

Sentei ao pé da porta, pensando no que eu faria com os corpos, pensei sobre tudo o que aconteceu, pensei no churrasco, pensei na churrasqueira, pensei que tinha um galão de gasolina na garagem, não pensei mais... E fui até a churrasqueira, coloquei carvão e reguei com gasolina, voltei para dentro de casa e primeiro peguei o corpo dela, aproveitei o corpo basicamente leve dela e encaixei na churrasqueira, dei inicio ao fogo, tentei jogar mais e mais gasolina, não final das contas, não adiantou muita coisa, não tive o resultado esperado. Parei para pensar novamente, olhei para a churrasqueira e decidi.

Fui até a garagem e peguei uma marreta, voltei para o quintal, com uma mangueira eu resfriei o que ainda estava consideravelmente quente, retirei o corpo queimado dela e quebrei toda a churrasqueira, quebrei o solo de concreto que sustentava a churrasqueira, fui até a garagem novamente e peguei uma pá, abri um buraco consideravelmente grande e joguei o corpo dela, voltei para dentro de cara e com um pouco mais de esforço, eu trouxe o corpo dele pra fora e joguei no buraco, junto com ela, joguei a terra por cima.

Voltei para casa e tirei o resto da noite para limpar o quarto e a casa, pela manhã eu fui numa loja de materiais de construção e comprei areia e cimento, joguei escombros da churrasqueira para fazer volume e cimentei tudo. Resolvi comprar vasos de plantas e colocar no lugar da churrasqueira, principalmente orquídeas.

Henrique Sanvas
Enviado por Henrique Sanvas em 07/01/2020
Reeditado em 07/09/2020
Código do texto: T6836292
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