"CANGACEIRAS" (entre aspas, mesmo)

"Maria Bonita e outras na desconstrução do mito... Nada de 'participação feminina' no bando de Lampião" - é o que nos diz uma *escritora e jornalista. Tudo fantasia: o código de conduta no bando era extremamente machista e, longe de terem direitos iguais eram tratadas como propriedades. Sim, menos que um bichinho ou um objeto "mudo e calado"... A avó da moça contava repetidas vezes como a cidade natal, Mossoró / RN, conseguiu conter o bando de Lampião, início do século XX. E o mote do "não/exatamente/cordel", durante anos, foi 'um-dia-escreverei-essas-estórias'... Livro gerado e parido, nos termos do sertão. Oh, não !morena de muito sol como pioneira do empoderamento feminino... nunca ícone feminista guerreira em prol da igualdade de gêneros! Ela nem tinha esse nome nos velhos tempos - era apenas MARIA DE DÉA, nome sem vestígios de maquilagem de carmim - pelos padrões da época, subjugada pelo machismo. Em todo caso, uma transgressora no sertão dos anos 30; infeliz no primeiro casamento com o sapateiro Zé da Neném, mulherengo, ela inconformada, largou-o e acompanhou o cangaceiro de péssima fama em todos os sentidos, nada de príncipe encantado, cavalo branco, clima de contos de fada... Trocou a opressão marital pela aventura do cangaço, novamente subjugada pelo homem tido como superior a ela, coitada precisando a vida inteira de um tutor. Sonoridade é palavra de agora; nada de uma voz defendendo o grupo das sertanejas: campanha "Mexeu com uma, mexei com todas" - elas não se apoiavam. No cangaço, severo código de conduta - jamais trair O companheiro, mesmo que não escolhidos no clã - havia rapto de mulheres (=lendário Rapto das Sabinas, na Roma Antiga). Lídia, mulher do cangaceiro Zé Baiano, morreu apedrejada, flagrada em adultério (na Bíblia?!), nenhuma mulher em defesa. Complicado! Elas achavam que a vida era "assim mesmo"... de obedecer, fosse no sertão ou nas cidades. No bando (e nas embarcações de águas", sempre rechaçadas, porque mulheres dariam azar. Ousado Lampião em levar Maria, casada, eterna dúvida na genuína relação de afeto. Bom. a favor do amor. O valentão gostou dela, quis uma mulher ao lado o tempo inteiro -"caiu de quatro", expressão popular. Durante muito tempo as pseudo-cangaceiras foram ignoradas até mesmo pelos jornalistas, depois as taxavam de sanguinárias - pegavam em armas como defesa pessoal, na verdade praticamente donas de casa: clássica monotonia de varrer, lavar, passar (não, impossível no meio do mato) e cozinhar. A indústria do entretenimento criou roupagem romântica e Maria se assemelhou a uma Joana d"Arc da caatinga.

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LEIAM meu trabalho "O cordel - Pesquisas antigas", início do seriado.

NOTAS DO AUTOR:

*ADRIANA NEGREIROS - Autora do livro "Maria Bonita, sexo, violência e mulheres no cangaço". - O ator global NELSON XAVIER, paulistano de nascimento, ator e diretor, lampioníssimo na telinha (1982), deixou saudades...

FONTE:

"Mulheres no cangaço eram praticamente donas de casa", artigo de Luiza Barros - Rio, jornal O Globo, 29/9/18.

F I M

Rubemar Alves
Enviado por Rubemar Alves em 12/12/2019
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