Momento Solitário

Estava escurecendo, tudo tão calmo, tão sereno, do jeito que mais odiava. Seu coração pesava, sabia o porque, mas não queria aceitar. Em sua mente circulavam fantasmas do passado, pessoas que nunca mais vira e que teria certeza nunca mais poder fazê-lo. Era a saudade de um amor inesquecível, da amizade, de tudo, tudo o que não mais teria, não com aquele sentimento, não do modo como fora.

“Ainda era um adolescente” – pensou - “Nunca mais serei um”.

Estava sentado no sofá, olhando pela janela o céu alaranjado. Sentia-se incomodado com aquilo, com a solidão. Deitou-se, fechou os olhos e tentou assim relembrar os momentos felizes. Não desejava dormir, somente pensar, pensar...

"O chão era de um verde vivo, todo coberto. As núvens de um branco ralo. O céu de um azul claro. E o horizonte sumia em tons limpos. Via tudo tão maravilhoso, diferente de onde vivia. E era por esse motivo que preferia passar o tempo ali, naquele lugar isolado em sua mente. Caminhava por entre a grama alta, sentia-se melhor, naquele local não havia motivos para deixar a tristeza tomar-lhe conta, a não ser pelas lembranças do mundo exterior, mas essas deveriam sumir, serem extintas se sua mente. O que sobraria seriam somente as coisas boas, os momentos felizes, raros, mas existentes. Aquele último encontro, as piadas dos amigos já a muito ido embora de sua vida, o beijo meio envergonhado dado na garota que nunca sonhara ter, a última vez que a teve na sua cama e a música que ela adorava."

Abriu os olhos, tinha lembrado da música, dos versos cantados tristes, mas românticos. Levantou-se e pôs-se a procurar o cd que a continha, lembrara onde o tinha guardado pela última vez, o único trabalho que tivera fora colocá-lo para tocar. Sentou-se no chão, encolheu as pernas, circulou os braços nelas e apoiou a cabeça nos joelhos. A música começava lenta, sua introdução era calma, ajudava a relaxar. Fechou os olhos novamente e voltou ao mundo dos sonhos...

"Estava agora sentado na grama, olhava o horizonte, sumia com a imaginação nos grandes penhascos, todos verdes e belos. O vento soprava fote, incansável, forma ondas que seguiam os rítimos inciais da melodia."

Uma voz feminina tomou conta do primeiro plano da música, era jovem, melodiosa. Respirou fundo, a muito não escutava essa canção, a muito não tinha esse prazer. Deveria estar louco, ou então desejava esquecer algo. Mas agora era totalmente diferente, não gostaria de esquecer, mas sim de relembrar, reviver tudo.

"Seus olhos estavam vidrados no gramado, seguiam o titmo da música, mas somente até que o vocal feminino começou sua melodia e a lembrança dela surgiu. Ela estava em pé, a beira do penhasco, seus cabelos cumpriam a vontade do vento, sua roupa era negra como a maquiagem que usava e seus lábios pronunciavam a letra da música, cantava a mesma melodia que tocava no outro mundo. Levantou-se e seguiu em direção a sua musa, tinha-a então a sua frente, bela como sempre sempre a vira. Chegou perto o suficiente para sentir seu calor, ficou a observá-la, admirá-la."

A mulher parou seu cantar, houve uma breve pausa nos vocais, somente os instrumentos seguiam o ritmo.

"Ela fechara os olhos, lágrimas escorriam em seu rosto. Ele pôs as mãos em seus ombros e os acariciava."

Novamente houve a retomada do vocal, mas agora por um homem, não era melódico como a da mulher, mas sim rude, nervoso, parecia odiar sobre o que cantava.

"Ela o abraçou, caiu nos seus braços e chorou como a uma criança. Ele não sabia o porque, era fruto de sua própria imaginação, mas mesmo assim desconhecia o que ela lhe preparava. A garota o abraçava forte, parecia querer sentí-lo. O seu coração batia acelerado, era uma pulsação anormal, diferente do que já havia sentido. Estavam os dois sendo influenciados pela letra e tristeza da música."

O vocal voltou à mulher. A música tomou outro compasso, as guitarras com um forte peso e a bateria rápida. Não era mais o clima de romance, era o da guerra que tomava conta do ambiente, o forte som da música imitando armas de fogo.

"Parou de acariciá-la, relaxou os braços e a observou mais uma vez. Ela também o olhava, estava com a maquiagem escorrida, com a expressão como a de uma criança com vergonha de fazer qualquer pedido. Ele passou as mãos pelos cabelos da garota e a beijou. Os dois sentiam-se prazerosos, excitados. Ele a apertou forte sobre seu próprio corpo, sufocando-a e assim que a música teve a última nota tocada a empurrou do penhasco."

Abriu os olhos assustado. Olhou para frente, nada podia ver, o ambiente se encontrava totalmente escuro. Uma nova música começava, mas desta não gostava. Levantou e desligou-a. Sentou-se no sofá, e fez um sorriso satânico.

- “Por isso a perdi” – Pensou.

Deitou-se e dormiu.