Abenteuer
Ele era apenas um jovem guerreiro que vivia com sua tribo e sua família nas florestas da Saxônia. Estava na idade que para nós é considerada o fim da adolescência e início da idade adulta, mas que para seu povo, ainda na infância dos tempos, ele era considerado apenas um garoto. Um garoto que podia andar e brincar pelas florestas da região, quando não estivesse dedicando-se aos alfazares que sua tribo fazia em conjunto, como os treinamentos de guerra, a caça, a pesca, a busca por lenha e as colheitas.
Era final de tarde, e o sol, aproximando-se da linha do horizonte, emitia uma luz que tingia tudo de dourado. O rapaz sabia que, em breve, teria que voltar para perto de sua tribo, pois era um pouco perigoso andar pelas florestas durante a noite. Apesar de conseguir guiar-se apenas pelo brilho da lua e das estrela, e também saber se defender dos animais da mata, ele não tinha coisas em mente para fazer aquela noite. Não planejava sair à noite como havia feito outras poucas vezes, em que havia se esgueirando pela mata para espionar as tribos vizinhas, ou quando, durante as viagens migratórias de seu povo, ele havia visto, a distância, as grandes cidades daqueles estranhos povos latinos.
O jovem guerreiro portava arco-e-flecha. Era a única arma que ele podia usar nos seus passeios pela floresta, enquanto que as outras armas, como lanças, espadas e escudos, tinham que ficar no acampamento da tribo. Ele viu um pássaro voando bem alto no céu e, como uma criança que está aprendendo as palavras, ou como quando a gente fala sozinho pensando em voz alta, ele disse para si mesmo:
- Der Vogel...
Armou seu arco-e-flecha e disparou em direção ao pássaro, meio que em vão, sabendo que o alvo estava longe demais. A flecha saiu com uma velocidade enorme, zunindo pelos ares durante o seu voo. Após atingir uma certa altitude, ela começou a descer, e descreveu uma trajetória no formato de uma parábola, passando longe do pássaro e caindo em uma região da mata que os olhos do rapaz não podiam alcançar.
Colocou outra flecha em seu arco e disparou em direção a outro alvo relativamente próximo: a copa de uma das árvores. Dessa vez conseguiu atingir o alvo, e a flecha cravou-se com violência no tronco da árvore, arrancando folhas e galhos em sua trajetória. O jovem pegou um dos galhos que havia caído e começou a golpear as árvores ao redor, como em seus treinamentos com a espada na tribo. Depois pegou algumas pedras e começou a arremessá-las aleatoriamente. Tentando lançá-las cada vez mais longe.
O sol aproximava-se ainda mais do horizonte e emitia seus raios de tons alaranjados. O rapaz saiu correndo pela mata de volta para sua tribo.
***
Alguns dias haviam se passado e o rapaz com vários outros guerreiros cavalgavam pela mata. Todos pareciam estar prontos para a batalha, pontando suas espadas e escudos, e havia um clima de tensão no ar. Aquele enorme comboio, com mais de cem guerreiros, deixava um rastro de fumaça atrás de si. O rapaz sentia uma certa emoção por estar prestes a participar de sua primeira batalha, após todos aqueles anos de treinamentos. Para ele, era uma grande alegria estar ali, cavalgando com aqueles homens que se pareciam muito com ele. Assim como ele, todos tinham a pela clara, os cabelos loiros e os olhos azuis. Mas os homens adultos tinham barba, e os mais velhos, que haviam ficado na tribo, barba e cabelos brancos.
Em um certo momento, ele e seus companheiros viram, a distância, o exército inimigo. Eram os execráveis latinos, com suas peles um pouco mais escuras que as deles e seus cabelos pretos. Vê-los ali, montados em seus cavalos, gerou uma enorme repugnância no jovem rapaz. Com sua aparência esquisita, sua língua estranha e sem significado, sua fala lenta e pausada, bem diferente da fala acelerada de sua tribo, fazia com que eles adquirissem uma aura diabólica. Ainda mais com suas cidades que pareciam verdadeiras aberrações, pois nunca paravam de crescer e expandir seus limites, e com suas torres tão altas que pareciam querer alcançar os céus. O rapaz sabia que os latinos eram malignos, e que precisavam ser combatidos. Era isso que ele havia aprendido desde pequeno. Não entendia que essas guerras ocorriam porque os latinos estavam expandindo seu império pelas terras saxônicas, mas ele não precisava entender, apenas apoiar ao seu povo e lutar.
Os guerreiros de sua tribo pararam a uma certa distância dos soldados latinos, que ainda permaneciam imóveis, apenas observando a chegada do inimigo. Os soldados perceberam que estavam em menor número, pois havia uma proporção aproximada de um soldado latino para cada quatro guerreiros saxões, e o rapaz viu medo no olhar dos inimigos. O que parecia ser o chefe deles trocou algumas palavras com os outros e deu algumas indicações - palavras que o rapaz não entendia - e, de repente, os soldados bateram em retirada, levantando uma nuvem de poeira.
Os guerreiros da tribo permaneceram onde estavam, meio que sem entender o que havia ocorrido, e depois começaram soltar gritos de comemoração uns com os outros. Felizes, pois os latinos eram conhecidos por nunca recuarem. Depois, começaram a cavalgar, com o objetivo de perseguir os inimigos, pois aqueles latinos não poderiam escapar impunes daquele jeito. Apesar deles acompanharem o rastro de poeira deixado pelo inimigo, os cavalos dos latinos eram bastante rápidos, e eles conseguiram ganhar distância. Apesar disso, eles não perderam os inimigos de vista e continuaram a perseguição.
Após uma certa distância, eles chegaram próximos a um sopé de uma montanha e, novamente, deram de frente com os latinos. Soldados e guerreiros permaneceram imóveis por alguns momentos. Para o rapaz e seu povo, ou os latinos os haviam atraídos para aquele lugar, ou viram-se cercados. Ninguém se movia, e o rapaz ouvia apenas os escassos barulhos da floresta.
De repente, o que parecia ser o líder dos soldados tirou de seu alforge uma trombeta, colocou-a na boca e tocou bem alto, quebrando o silêncio. Tudo continuou quieto, mas o rapaz notava algo estranho no ar, como se o toque daquela trombeta fosse a anunciação de algo terrível que estivesse por vir. Pouco depois, o rapaz notou que o chão tremia um pouco sob seus pés e que nuvens de poeira surgiam do horizonte. Continuou olhando para aquelas nuvens, esperando por aquela coisa tão estranha que estava por vir dali.
Então surgiu algo quase inimaginável: soldados e mais soldados romanos surgiam das nuvens de poeira, por detrás das árvores do horizonte e também por trás da montanha. Centenas, ou até milhares deles, cavalgavam furiosamente em direção a ele e aos guerreiros de sua tribo. Era como se estivessem, inicialmente, nadando em uma praia tranquila e, de repente, surgisse no horizonte uma onda gigante, prestes a arrebatá-los. Era um verdadeiro mar de latinos, e ele e seu povo ficaram praticamente em choque.
A onda começou a se aproximar, e um torpor tomava conta do rapaz, como se tudo aquilo não passasse de um sonho. Viu que alguns poucos guerreiros tentaram bater em retirada, e outros preparavam-se para lutar. Viu também que alguns dos soldados inimigos eram loiros, de pele clara e olhos azuis, e se pareciam muito com seu povo. Pensou naquele estranho fato e, por alguns momentos, quase esqueceu-se de toda aquela guerra. A onda de latinos chegou praticamente atropelando os guerreiros que estavam a frente dele. Viu que faltavam poucos segundos para aquela onda passar também por ele. Pensou nas florestas douradas da saxônia, nos entardeceres e nos pássaros. Viu que sua vida havia sido doce até ali. De repente, sentiu a onda de choque e tudo ficou escuro.