UM POUCO DE JAPÃO - PARTE III

A partir de Tóquio, um avião até Kamatsu, na prefeitura de Kagawa, um ônibus até o porto e uma barca até Naoshima, pequena ilha de apenas 16 quilômetros quadrados, sudoeste do pais, entre duas grandes, Honshu e Shikoku - maratona cansativa, porém o cenário no meio das águas tranquilas do Mar de Seto é uma das mais interessantes experiências artísticas do mundo: um recanto que passou de vilarejo de pescadores a palco permanente de arte contemporânea, um Japão totalmente diferente da imagem de templos e cerejeiras ou as modernas selvas verticais de neón que o Ocidental conhece. Em oposição, a ilhota Naoshima, paisagem belíssima sem opções de hospedagem, ponto esquecido do país, área semi abandonada, marcada pela poluição industrial, tem uma população de 3.800 habitantes, doze comunidades remotas, antiga população sem esperanças (jovens partindo para os grandes centros urbanos, mais velhos somente com opções de pesca ou agricultura), estava condenada a desaparecer; sofreu metamorfose proposta e financiada pela corporação Benesse House, iniciada em 1992, ano do primeiro museu, já com o sétimo em 2013. Exemplo mundial (atenção, "otoridades" brasileiras!!!) do poder transformador da arte porque projetos culturais ajudam a financiar a despoluição e o reflorestamento. Turistas internacionais /400 mil pessoas ao ano/ a pé, em bicicletas ou micro-ônibus, passeios de um dia em busca dos 'tesouros' em lugares espalhados. A arquitetura local integra arte, natureza, tradição e comunidade numa só fórmula - mestre de obras da ilha, o 'arquiteto' mais conhecido do Japão, autodidata sem diploma, premiado TADAO ANDO, dizem que bilionário, famoso por explorar influências naturais em suas estruturas. Museus de portas abertas ou como o surpreendente Chichu Museum, subterrâneo, iluminação natural, sem nenhuma ligação religiosa - em espaços fechados, ali encontradas inclusive obras de Jackson Pollock e Claude Monet. Em espaços abertos, um penhasco (série de imagens do fotógrafo e arquiteto HIROSHI SUGIMOTO), num pier, como a abóbora de fibra de vidro da japonesa YAYOI KUSAMA, que transformou sua doença mental em arte obsessiva com padronagens repetitivas, em especial bolinhas; ainda na praia, instalações inspiradas em carcaças de navios, de SHIURO OTAKE, esferas gigantes de granito, de WALTER DE MARIA, norte-americano, e culturas coloridas, de KAREL APPEL, holandês, num mar verde esmeralda e clima de paz. A aventura mais completa (e mais cara!) é dormir no museu-hotel do complexo Benesse House, quartos com a estética minimalista da decoração japonesa, sob o barulho do mar. O vilarejo de Honmura, nascido em tempos feudais, é a parte de mais evidente cultura local em Naoshima - algumas casinhas de madeira, entre 200 e 400 anos, estavam sem uso, caindo aos pedaços, restauradas pelo The Art Museum Project, mantidas as estruturas do lado de fora, mas tendo instalações permanentes no interior. como a "Sea of time", série de contadores digitais submersos criados por TATSUO MIYAJIMA. Um templo xintoísta centenário ganhou escadas de vidro, de SUGIMOTO, bela e estranha combinação. Moradores felizes com a movimentação turística, senhoras oferecendo chá, casas decoradas com flores e peças de cerâmica, projetos de pousadas, restaurantes e cafés; os tradicionais milenares banhos públicos em banheiras de águas termais, os chamados 'onsens', versão modernizada numa casa que mistura pop arte, mosaicos e objetos eróticos. Não quiosques de petiscos e bebidas nem espreguiçadeiras ao sol, camelôs e lixo na areia. No Japão, o que parece fantasia, dá certo.

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FONTES:

"Ilha da fantasia" e "As ilhas de arte do Japão", artigos de CLÁUDIA SARMENTO - Rio, jornal O GLOBO, 21/11/10 e 2/6/13.

F I M

Rubemar Alves
Enviado por Rubemar Alves em 16/08/2019
Código do texto: T6722022
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