UM POUCO DE JAPÃO

1---FAMÍLIA JAPONESA - A palavra 'ie' designa a família tradicional japonesa - estrutura, laços de família entre os membros, patrimônio e atividades: o primogênito casado ainda morando com os pais, seus próprios filhos, irmãos e irmãs solteiros...incluindo-se ancestrais mortos e futuros descendentes. "Família-empresa" no sentido de que sobrevive com a continuidade da linhagem, ou seja, união de atividades com os bens e laços de parentesco. Quase sempre, o filho mais velho permanece e os mais novos casam e fundam novas 'ie' autônomas e serão futuros ancestrais. Nesse tipo de organização, a mulher dá herdeiros à família do marido ou é devolvida a seus pais ou se adota um filho varão. Na casa dos sogros, servi-los e ser sempre amável - não ser caprichosa nem ter vontade própria, respeitar cunhados/cunhadas, ser prudente severa consigo própria; ter comportamento digno e racional; acordar cedo e dormir tarde; dar atenção à casa o dia inteiro; mesmo com criadagem, estar à frente de tudo, pois esta é "a lei da mulher"; personalidade anulada em nome das lis da família; não frequentar lugares públicos antes dos 40 anos. (Opinião deste pesquisador; mulher subalterna, coitada!) / Em contraste, o chefe da família pode até excluir qualquer membro que prejudique a 'ie'; partir do século XIX, todo o patrimônio lhe pertence e mesmo qualquer adulto da família depende da sua autorização até para assinar um contrato. Em contrapartida, pode ser destituído da chefia se negligenciar do trabalho e for incapaz de administrar o patrimônio, por exemplo, acordando tarde, saindo frequentemente à noite ou entregando-se a jogos de azar. No caso de empresa produtiva-lucrativa (comércio ou indústria), será indenizado e abandonará a direção. / A 'ie' tradicional é uma comunidade ou empresa de sangue e o que importa é um 'diretor' competente. O sistema de 'ie', antigo, remonta ao século XI, mas se consolidou e oficializou na segunda metade do xogunato Tokugawa, por influência de doutrinas confucianas. Era assim na casa dos samurais, na classe dos ricos comerciantes e agricultores, logo se estendendo a todas as famílias japonesas. / Após a II GM e a promulgação da constituição de 1945, a família japonesa evoluiu. Apesar da 'ie' tradicional subsistir, as novas estruturas jurídicas concedeu a igualdade de direitos a homens e mulheres com distribuição de patrimônio aos filhos, as transformações industriais e urbanas do país reforçando tais tendências - as famílias reduzidas a um ou dois filhos, as gerações vivem separadas e os filhos solteiros rapidamente adquirem autonomia. A partir dos anos 60, aumentou o número de empregos e consequente mobilidade, os jovens trabalhadores rurais se deslocando para os centros industrializados; mais tarde, os chefes de família rurais em empregos temporários - em breve permanentes - nos centros urbanos em desenvolvimento, ausentes a maior parte do ano, deixando a terra aos cuidados de mulher e dos filhos. Desenvolvimento econômico em novos projetos e a família dificilmente poderia acompanhar deslocamentos profissionais muito frequentes, prejudicando a educação escolar dos filhos - fenômeno conhecido como 'tanshin hunin', um membro da família sem ela em visitas de fim de semana, causa possível para estresse, depressão e alcoolismo. / A mulher, isolada, sofre a ausência do marido que, mesmo vivendo em casa, vai trabalhar muito cedo e volta muito tarde; filho o dia todo na escola e ainda vai para 'juku' (aulas particulares). Ela procura um emprego ou participa de atividades de grupos culturais. Menos filhos, menos companheiros na vizinhança, talvez nenhum em casa. Hoje muitas mães levam os filhos à escola, à universidade ou à empresa no primeiro dia de trabalho. / Há maior número de pessoas idosas, numa expectativa de vida acima de 75 anos para os homens e 80 para as mulheres, participando da vida ativa, morando com filhos. / A crise da família nuclear se reflete na organização das refeições, antigo ritual que fortalecia a coesão do grupo, hoje não feita em comum, pais ausentes no café da manhã ou na hora do jantar: a mãe almoça sozinha. Também o desenvolvimento de meios de comunicação de massa diminuiu o espírito comunitário e a família não mais troca informações, substituída pela televisão e o ato de assisti-la individualmente.

(Segue.)

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PIADA-VERDADE - HQ "Classe e mídia", autor MARCO - 3 quadros, um único personagem sentado em poltrona ante em aparelho de tevê: "Pesquisa, público alvo, audiência... / A televisão é um veículo de massa... / que a gente assiste individualmente." - Rio, JORNAL DO BRASIL, 30/1/93.

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LEIAM meus trabalhos "Educação no Japão", "Japon, né?" (seriado, espec. XI e XI-cont.), "Olhos apertados" e "Viagem imaginária ao Japão".

FONTE:

"Do ie à família nuclear" - Rio, revista O CORREIO DA UNESCO, ano 17, n.9, set./89.

F I M

Rubemar Alves
Enviado por Rubemar Alves em 16/08/2019
Código do texto: T6722017
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