A dona do palavrear

Era uma mulher da vida. Dessas que encontramos em qualquer esquina, mas ela tinha uma coisa que nenhuma mulher de família tinha. Não entregarei os fatos de mãos beijadas, primeiro fabricarei a linha para depois tecer o tecido.

Eucásia era o seu nome. Nunca soube o porquê do nome. Nunca conheceu a mãe, e muito menos o pai. Mas no RG constava Eucásia, então deixava acontecer pelo simples fato do destino. Se é que existe destino.

Pintava seus olhos para chamar atenção, pintava a boca para provocar sedução, e vestia-se bem para se aproveitar de homens que se diziam machões. Tudo no final das contas, resumia-se em apenas algumas horas de atenção. Era assim. Os homens eram casados, as mulheres preocupavam-se com os afazeres domésticos e com os filhos, mas nunca tinham tempo para os maridos. E a noite: derrapava na esquina, enquanto os homens com aliança no dedo iam para cama. Não para fazer sexo, mas sim o sexo dos sentimentos. Aquele sexo que não tem relação com os órgãos reprodutores. A vida era triste, e Eucásia sabia. Por isso os ouvidos estavam sempre abertos para desabafos que aqueles moços tanto precisavam.

As amigas morriam de inveja de Eucásia. Nunca entenderam o motivo de Eucásia ser a mais requisitada, a mais afortunada em clientes. Inveja é o pior sentimento que alguém pode sentir pelo outro, pois acaba esquecendo de si para dedicar-se inteiramente ao outro. E a vida corria estabanadamente na palma da mão de Eucásia. Parecia uma pluma que o vento insistiu em trazer para abençoar a sua existência.

Sim. Eucásia era mulher da vida. Mas inteiramente da vida. Desejava-a intensamente. Queria sugar-lhe gota por gota. Mas desde sempre lutava contra os seus próprios monstros que existiam dentro de si, mas o que fazer se o destino lhe pregou as peças mais cruéis que pudessem pregar a uma mulher?

O que salvava Eucásia era a sua lábia. Conseguia transformar uma dinamite em uma rosa apenas com as palavras. Dominava as palavras como estivesse nascido com um dicionário nas mãos e uma caneta na outra.

Não captava o que passava dentro de si, mas sabia indizivelmente o que se passava com aqueles homens sem causa, e muito menos, base.