O canto do Uirapuru – parte 1
Inaiê se banhava as margens da Guaíba, os longos cabelos negros cobriam seus seios firmes e empinados de uma jovem dentro de suas dezessete primaveras, e sua pele avermelhada reluzia com os raios do grande Guaraci. Ela penteava os cabelos com movimentos demorados e longos fazendo luzir o brilho escuro de suas madeixas enquanto lentamente entoava um cântico melancólico que atraiu a atenção de um pequeno Uirapuru que se curvou para prestar atenção às palavras ditas no idioma Kayapó da jovem Inaiê.
- Bô medipê bô medipê nahi noaiê êtê!
Exclamava a jovem quase como um sussurro, e o Uirapuru ao ouvir o som começou a cantar serenamente o seu canto uirapuru de modo melancólico quase que junto à moça Kayapó.
Um barulho no mato interrompeu o namoro de Inaiê e do pequeno Uirapuru, com ressalto a jovem correu pra dentro da mata pensando ser o temido Anhangá que rondava por ali.
O poderoso espírito do veado branco que protege as matas era conhecido dos Kayapó, muitos dos índios já haviam sofrido nas mãos de Anhangá, alguns deles não voltaram mais para a aldeia.
O Uirapuru vendo a cena voou para onde o barulho estava para pedir que o espírito do veado permitisse que a moça continuasse seu belo canto.
Ao chegar ao local o pássaro apenas encontrou pegadas que seguiam pra dentro da mata.
Perto da entrada da aldeia a jovem Inaiê diminuiu o passo e colocou a mão sobre o peito para sentir o coração acelerado de medo, quando da maior oca saiu o pajé Ubiratã, este passou por ela sorrindo. Ela sabia o que significava, se aproximava da hora do seu casamento com o filho do cacique.
O jovem filho do cacique era desejado por todas as cunhãs, um guerreiro hábil, mas, não era o que Inaiê desejava, ela gostava mesmo era de banhar-se nas águas da Guaíba e de comer manga no pé, isso é que era vida pra ela. Prender-se em um casamento arranjado por seu pai não era seu objetivo, porem não iria contrariar as leis de seu povo. "Se eu pudesse ir contra isso" ela pensava.
- Inaiê! Gritou seu pai de dentro da maior oca da aldeia, a hora da cerimônia se aproximava.
Na mata o Uirapuru seguia as pegadas que ficaram marcadas no solo úmido enquanto em sua mente de pássaro pensava "não pode ser Anhangá", quando de repente um pau passou rente às suas asas.
O cabelo vermelho como fogo brilhava caído sobre os ombros do curumim, e seus olhos quase da mesma cor dançavam no escuro que já se iniciava com a descida de Guaraci. O Uirapuru só pode exclamar em sua mente de pássaro "Curupira"!
- O que é pássaro velho. Respondeu o curumim de cabelos vermelhos.
“Você pode compreender o que digo?" chilreou o Uirapuru.
- Mas é claro pássaro feio, sou eu quem protege os bichos por aqui, eu e o veado velho.
“Sim, isso é verdade" disse o Uirapuru.
- Agora diz o que você quer comigo.
“Eu vim pedir que deixe Inaiê cantar em paz, ela alegra meus dias"
- Ih pássaro feio, eu não fiz essa cunhã deixar de cantar, ate por que isso não me interessa nem um pouco, eu só estava ocupado dando uma pisa em uns índios bestas que queriam por que queriam matar meu caititu.
O Uirapuru ouviu a todo o relato do curupira, e pediu desculpas pelo seu erro. Contou a ele também a sua historia.
- É pássaro feio, bem achei que você era estranho, mas a tua cunhã preferida vai ter um destino bem ruim, é mesmo uma pena.
“Do que você sabe curupira?”
- De nada que te interesse pássaro velho, é melhor você procurar uma passarinha pra ti. E com essa resposta os olhos vermelhos dançaram pra dentro da folhagem espessa e desapareceu com uma gargalhada rouca diante dos olhos tristes do Uirapuru.