Ausência

Em um bar uma conversa se inicia. Dois homens, um de mais idade e outro mais jovem.

- O que você fez quando soube da morte de seu pai? – Perguntou o homem do outro lado da mesa.

- Não fiz nada, por quê? – Respondeu o jovem vestido elegantemente um terno preto e de chapéu na cabeça.

- Mas como não, ele era teu pai?!

- Sim, mas nunca se importou comigo.

O homem mais velho respirou fundo.

- Mas ele sempre lhe deu tudo, não entendo?!

O jovem colocou a mão no bolso enquanto respondia.

- Sim. Quando criança me encheu de brinquedos, na adolescência pagou meus estudos...

- E agora na fase adulta ele deu a vida por você. – Concluiu o homem.

Um sorriso se abriu no rosto do jovem.

- No entanto tem o principal.

- Principal?

- Amor. Você sabe o que é isso?

A voz do homem era bastante insegura.

- Amor... Bem, amor é quando um homem gosta de uma mulher, ou vice e versa. É isso?

O jovem riu contido.

- É, pode ser. Mas o amor não se restringe a isso apenas. O amor pode ser demonstrado de várias maneiras. Com um bom dia, um sorriso, um abraço. Quando você conta uma história para o seu filho, quando você brinca com seu neto. Existem diversas formas de se demonstrar amor, e esses são só alguns exemplos.

- E seu pai deve ter feito muito dessas coisas com você, não é mesmo?!

O jovem acendeu um cigarro, deu uma baforada e olhou para o teto de estrelas.

- Nunca fez. Ele era um homem ocupado, trabalhava muito.

O homem abaixou a cabeça e por um breve momento olhou para o chão sujo de bitucas de cigarro.

- Então você nunca gostou de seu pai

- Pelo contrário, eu o amava.

- Mas...

- Eu não o culpo pela ausência, pela falta de amor e pelos abraços que eu não recebi. Só não entendo porque ele foi tão distante se ele teve a chance de estar comigo todos os dias.

Os dois se levantaram; o homem mais velho apoiado em uma bengala, o mais novo apoiado na mesa por estar levemente embriagado.

- Você perdoaria seu velho pai? – Perguntou o homem velho tentando esboçar um sorriso.

- Acho que sim. Se ele dissesse que me ama e me desse o abraço mais apertado que ele deu em alguém. – Respondeu o mais novo abrindo os braços.

Com lágrimas nos olhos e a voz fraca o velho disse:

- Esse abraço apertado pode ser dado pelo pai do seu pai?

- Pode vô. É claro que pode.

No mesmo instante em que os dois se abraçaram tudo se transformou. O amor que o homem mais jovem não teve do pai estava sendo trocado pelo amor simples, puro e singelo do avô.

- Não se preocupe garoto, se teu pai não te amou como você gostaria, tenha certeza de que o velho aqui vai lhe dar em dobro, pode apostar.

E lá se foram os dois, de braços dados e de corações abertos.

Fernando F Camargo
Enviado por Fernando F Camargo em 29/06/2019
Código do texto: T6684764
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