Drible na Ressaca
Ressacado, tentou dar um drible na ressaca. Foi futucar nos seus guardados. Pegou uma caixa de sapatos onde guardava recortes de poemas antigos recortados de revistas e jornais. Sacudiu a poeira, espirrou, sabia que iria gripar. Era tiro e queda, mas precisava arriscar. Leu alguns versos de um poema de Geir Campos:
"Não canto onde não seja o sonho livre,/ Onde nao haja ouvidos limpos e almas afeitas a escutar sem preconceito;/ para enganar o tempo ou distrair/ criaturas já de si tão mal atentas,/ não canto.../ canto apenas quando dança,/ nos olhos dos que me ouvem, a esperança".
Pegou mais um recorte e leu um verao de Cecília meireles:
"Liberdade, essa palavra que o sonho humano alimenta,/ que não há ninguém que explique e ninguém que não entenda".
Espirrou novamente e leu um verso do "Cântico Negro" de José Régio:
"Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!/ Ninguém me dê definições!/ Ninguém me diga: 'Vem por aqui!'/ A minha vida é um vendaval que se soltou./ É uma onda que se alevantou./ É um átomo a mais que se animou.../ Não sei por onde vou./Não sei para onde vou./ - Sei que não vou por aí".
Animado, a ressaca havia passado, sentiu vontade de lavar a prensa com uma lourinha suada daquela marca que desce redondo e não dá dor de cabeça. Perdido por um, pedido por mil. Estava espirrando, mas ora pílulas, havia tomado a vacina dos coroas qe diziam ser remédio santo para cortar a gripe. Tomou um copo, dois... , aí resolveu encarar uma pituzinha gold (estava ficando elitista) com limão, tomou a lapada de vez, mas antes serviu a pitadinha do santo, e não fez a careta e a cara enfezada dos pretensiosos quando provam cachaça.
Depois pegou um disco antigo, tipo bolachão, era u LP de Sílvio César, ouviu uma faixa que gostava e c vibrou com estes versos:
"Eu sou um velho-moço/ Que não viveu cedo/ Que não sofreu muito/ Mas não morreu tudo!/ Eu sou alguém livre.../ Não sou escravo./ E nunca fui senhor./ Eu, simplesmente, sou um homem/ Qu ainda acredita no amor".
Foi tirar um cochilo. Inté.