Princesinha

Era uma vez, uma garota, numa casa no subúrbio, embora não fosse rica, tinha lá suas mordomias e a sua vida era tomada como perfeita, era um exemplo de aluna, o orgulho dos pais, a mais aclamada pelos garotos, de uma beleza invejável, embora não ligasse para isso, sempre preferiu não ser notada, mas era de tamanha luz que ninguém conseguiria desviar o olhar de si.

Obediente, sempre foi educada e obedecia aos pais de olhos fechados, sempre com um sorriso no rosto, parecia nunca querer contrariar nada que os mais velhos dissessem, o seu pai lhe exibia como um troféu aos quatro cantos do mundo, sua mãe falava para as amigas de como a sua filha era bela e recatada.

No ensino médio, já sabia qual profissão gostaria de seguir, seu sonho sempre foi fazer teatro, era a sua paixão, aos doze anos havia participado de uma peça da escola e alí descobriu-se apaixonada por atuar, tão apaixonada que havia feito isso a sua vida toda e nem tinha se dado conta de tal fato, continuou atuando, até que algo aconteceu, o seu sonho não era o sonho de seus pais, sempre quiseram que a filha fosse advogada, afinal de contas uma menina tão inteligente não poderia jogar fora toda a sua sapiência fazendo teatro, que fizesse aquilo como hobbie, mas que tivesse uma profissão séria.

Ela pensou, repensou, e a resposta que obtinha era sempre a mesma, não iria desistir do seu sonho, tantos anos vivendo em uma bolha, como filha única, sendo privada de viver, tendo uma vida programada, engolindo as coisas só para não fazer desfeita, sorrindo para disfarçar o quão frustrada era, vivendo em uma torre isolada e guardada por dragões, foi criada como uma princesinha intocável, mas até mesmo os melhores atores um dia cansam de repetir aquele espetáculo tantas vezes, e ela estava exausta.

Chegou o momento, ela estava pronta para subir em seu cavalo, fugir do castelo e enfrentar os dragões se necessário fosse, o seu texto estava decorado, já sabia todos os argumentos que usaria caso houvesse resistência, foi até o calabouço onde se encontravam as criaturas cobertas por escamas e com línguas flamejantes, pediu permissão para ter a palavra, resquícios de sua personagem certinha, e quando esta lhe foi concedida, começou o seu monólogo, presenciando os bichos asquerosos lhe olharem com espanto, falava lindamente, com a delicadeza de sempre, sendo bela como sempre, mas em uma personagem diferente, agora era autêntica, ela havia escrito o próprio roteiro.

O castelo se desfez, desmoronou, as criaturas escamosas ficaram ao chão, sem reação alguma, enquanto a princesinha derrubava tijolo por tijolo daquela construção assustadoramente grandiosa, e provava a sua força de uma vez por todas, não engoliria mais nenhuma palavra, e iria atrás do seu sonho a qualquer custo, mesmo que para isso precisasse ir contra os seus próprios pais ou dragões, chame-os como preferir.

Os escombros do castelo pesavam sobre os seus ombros, o peso de sua consciência havia sumido, mas as consequências de seus atos vinham à tona, sentiu na pele a fúria dos dragões e as queimaduras de terceiro grau em sua alma não lhe deixavam mentir, viu as pessoas que juravam-lhe amor virarem as costas para si, no entanto, desta vez ergueu a cabeça, coisa que nunca havia feito antes, por viver sempre a curvar-se em sinal de respeito, e em seguida partiu em seu cavalo para lugar nenhum.

Mas não pense que irei lhe decepcionar, o final feliz também existirá nesta história, ao sair do castelo, ela lutou até o fim pelo seu sonho e conquistou uma pequena escola de teatro no centro da cidade que funcionava aos sábados e domingos, durante a semana apresentava espetáculos em praça pública, nunca mais havia visto os dragões, mas escutava histórias sobre eles de vez em quando.

Não posso esquecer do romance, nesta história também existirá um, aos vinte a princesinha conheceu uma garota, de cabelos crespos, sorriso fácil e pouco filtro nas palavras, haviam entrado em conflito de cara, não se gostavam de jeito algum, mas foi numa mesa de bar, depois de uma reunião do grupo de teatro que havia acabado em festa, que quebraram o orgulho e começaram a conversar de fato, alí nascia um amor, não como os dos contos de fada, um amor íntimo, cheio de carinho e luxúria também, no início foi difícil entender, aceitar e até mesmo identificar que alí existia amor, no entanto, renderam-se ao sentimento e viveram intensamente, não foram felizes para sempre, mas eram felizes quando dava.

Brenda Nascimento
Enviado por Brenda Nascimento em 23/04/2019
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