A pele do lábio
Minha cabeça doía e martelava como se um martelo literalmente a tivesse martelando. Era uma sensação estranha que me passava pelo corpo, uma dor estranha. Minha boca estava seca e ao passar a língua pelos meus lábios senti uma irritante pele que virara uma casquinha petulante. Era irresistivelmente atraente, meio redundante, mas é isso aí, a vontade de arranca-la, de tira-la, mesmo que isso signifique que eu vá me arrepender depois, eu queria arrancá-la.
Aquela casca havia sido uma parte macia um dia, parte essa que você beijou, mordeu e se arrepiou quando entrou em contato com a sua pele. Maldita linda pele que me fez lembrar de todas as vezes em que meus lábios se abriram para dizer seu nome. Foi ela que me aguentou morder intensamente quando meu medo era não te agradar, não concordar com você, não ser aquilo que você esperava. Foi ela que me aguentou morder enquanto eram meus dedos que trabalhavam em discutir com você. Cada mensagem, cada mordida, foi ela que testemunhou o final.
Me irrita saber que ela presenciou minha estupidez por tanto tempo e não me disse nada! Logo ela que estava em minha boca, logo ela que me aguentou mais que qualquer um, logo ela que me ouvia falar. Logo ela, porque não me parou.
Minha vontade de arranca-la era simplesmente natural, quem não deseja quando se tem uma? Ouvi dizer uma vez que arrancar essas pelezinhas causa câncer nos lábios, quão dramático isso, não?! É inevitável, e me causará um mal tão forte quanto este se eu não tirar. Morrerei de desgosto, de raiva, de estresse, ela permanece aqui e me lembrava de tudo o que eu vivi com ela, isso não pode.
Puxo com os dentes mesmo, não tenho medo. No início é bom, é gostoso, mas depois arde e temo que era essa pele maior do que eu imaginava porque não acaba. Sinto um gosto metálico de sangue na boca, amargo e azedo. Arde meus lábios, quando termina a dor me lembra que talvez teria sido bom deixá-la lá, mas quando passo a língua pelos lábios e ali só me resta a carne viva, eu lembro, não me arrependo. A dor me gera alívio, alívio das lembranças que com passar dos minutos vai ficando cada vez distante, mais distante e tão distante que eu já tenho uma nova pele. Nova pele.