A eterna espera
- Chego aí dentro de meia hora.
Foi o que ela o disse ao telefone, pouco antes de desligar. Com os olhos radiantes, ele colocou o fone no ganho e cruzou, saltitante, a sala de estar, até chegar ao banheiro, onde prepara-se para o banho.
Enquanto a água cai sobre o corpo, cantarola uma música medíocre, com uma voz ridiculamente desafinada. Mas não se importa com isso. Dentro de pouco tempo, irá encontrar uma pessoa potencialmente especial em sua vida. Ela, que a pouco tempo surgira em sua vida, tornara-se, em pouco tempo, a sua salvadora. Era um verme sem rumo, antes de conhecê-la. Apressando o banho, sai do chuveiro em pouco tempo, vai ao quarto e veste a sua melhor roupa, passa o melhor perfume e senta na sua poltrona, de frente para uma grande janela, com uma visão privilegiada daquela cidade castigada pelo inverno por meados de agosto.
Esperou uma hora. Olhava para o telefone. Será que eu ligo para ela?, pensa. O medo de parecer inconveniente e ousado, porém, o impedem de fazê-lo. Permanece sentado. Passam-se duas horas do horário combinado. E nada. Levanta-se, vai até a janela. As ruas vazias, como deviam ser. Volta-se a sentar e, quando o relógio marca quatro horas de atraso, pega o telefone. Ninguém atende. Ela não atende. Permanece sentado. Às seis horas de atraso, sente um nó na garganta e os olhos ficam vermelhos, umedecidos por lágrimas de raiva e ansiedade. Mas não ousa levantar. Permanece sentado na sua poltrona, alimentando em seu coração a esperança de que ela apareça. Algo de muito grave pode ter acontecido, pensa ele, mas o que eu posso fazer? Ninguém atende quando ligo. O melhor que tem a fazer, segundo ele mesmo pensa, é esperar.
E ali ele ficou. Ela não veio naquele dia. E nem no outro. E nem no outro. E nem no quarto dia. E nem nos dias seguintes. E ele nem mesmo saiu do lugar. Não comia, não saía, abandonou o serviço e as preocupações com a sua própria saúde. Lutou contra o frio e contra o mal-estar, cumprindo a sua parte no que fora combinado. E ali, naquela mesma poltrona na qual sentara feliz e esperançoso há alguns dias atrás, ele foi definhando, pouco à pouco, sendo engolido pela consternação e pela melancolia, enquanto a chama da confiança permanecia acesa em sua alma.
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Ficara preocupada com o repentino sumisso dele. Há dias que não atende o telefone. Deve ter ficado furioso comigo, diz ela. Não pôde aparecer naquele dia, devido à um seríssimo compromisso, e por tolice esquecera de ligar para avisá-lo. Agora, depois de quase dois meses, na frente da casa dele, abre a porta com a cópia da chave que possui e chama pelo seu nome. Sem ouvir resposta, vai até a sala, e entra em choque com a cena que presencia. Sentado à poltrona, com a péle pálida e cadavérica, está ele, com os olhos abertos, na direção da janela, como se esperasse pela vinda de alguém. Abafando o choro com as mãos, ela nota, na mesinha ao lado da poltrona, uma carta, escrita por mãos debilitadas, levando em consideração a quase inintelegível grafia da mesma. Na carta, assim estava escrito:
"Perdoe-me se não tive forças para te esperar em vida. Aguardarei-te após a morte, então, onde nossas ausências e erros serão recompensados pela eternidade de nossas juventudes".