Um Certo Sujeito - O Conto
Fazia três semanas que o bilhete estava no fundo da bolsa. Um tanto amassado, até molhado de tanto ser manuseado. Ela olhava o número anotado, pensava em ligar e depois dobrava o papel novamente.
Mas naquela tarde resolveu ligar. Será que ele se lembraria? Quantas como ela não receberam seu número de telefone?
Num ímpeto acionou rapidamente o celular e antes de dar pela coisa ouviu um "olá!" amistoso, sorridente e feliz. O homem do outro lado da linha parecia íntimo.
- Olá! Boa tarde senhora ou senhorita! À que devo o prazer?
Ela ouviu aquela frase imensa e pensou em desligar, mas os olhos de jade não lhe saiam da memória.
- É Maria Alice. Tudo bem?
- Agora melhor, querida! Diga, o que posso fazer para alegrar tão distinta dama?
- Estive há quase um mês no clube de gafieira, lembra? Você me deu um papel com seu telefone...
- Como não me lembrar? Claro! Esperei por você, Maria Alice, noite e dia...
- É que sou casada... Faz seis meses só. Ele é super ciumento... Riu sem graça.
- Mas a dama gosta de dançar...Percebi!
- É... Gosto muito. Ele não. Foi comigo na gafieira pela primeira vez porque comemorávamos o aniversário de uma grande amiga, mas jurou que não pisava mais lá.
- E agora, como verei Maria Alice, questionou galantemente o rapaz que naquele dia que lhe passou o telefone, usava um terno branco e gravata vermelha.
Será que ele estaria de chapéu? Ou de bermuda e tênis de corrida? Divagou a moça.
-Alô, moça bonita! Ainda está aí?
Que tal um suco de laranja no Pastel do Bartô? Assim a gente aproveita para se conhecer melhor...
- Ah, sim... Estou aqui. É? A que horas?
Marcaram para meia hora depois.
Para sair de casa, ela cuidou de arrumar o cabelo, passou um batom vermelho, calçou as sandálias de salto e vestiu-se como se fosse à uma festa. Agora lá estava ela na pastelaria que funcionava no andar térreo do clube.
Foi chegando meio sem graça e ele já estava por lá. Encostado num carro a viu chegar mostrando-lhe o seu lindo sorriso que era largo, dentes perfeitos e extremamente brancos.
Deu-lhe um aperto de mão, mas ele se aproximou mais e lhe beijou os dois lados da face.
- Aí está Maria Alice!!!!
Pediram pastéis e sucos porque ele avisou que não bebia fora de serviço. Contou-lhe da profissão de entretenimento na gafieira e dos anos que estudou dança de salão. Era instrutor de gafieira e ganhava a vida assim. Dançava com as damas que frequentavam o lugar e elas lhe pagavam a cerveja como retribuição.
Ela sorriu meio desconcertada quando ele perguntou se tinha interesse em aulas particulares que ele oferecia às mulheres que não tinham muito molejo na pista de dança.
Foi aí que a ficha caiu. O bilhete... Não era o que ela pensava.
A moça ponderou que aqueles olhos verdes deviam causar fortes paixões nas alunas que ele tinha. Ela mesmo, sem dar sequer uma voltinha no salão com ele, estava fixada no "sonho de valsa" que o moreno representava.
Aos poucos ela foi entendendo que tudo fora um grande engano. Ele só era um instrutor de dança e alí, na gafieira, ele fazia seu merchandising, a propaganda de suas aulas de danças.
- Que dia começamos, Maria Alice?
Marcaram para a semana seguinte a primeira aula. Ela fingiu estar empolgada para aprender dança de salão e sustentou o interesse no aprendizado até quando se despediram amigavelmente.
Só que no dia marcado ela não compareceu. Aliás nunca mais pisou numa gafieira...
Cláudia Machado
Nota1 - Baseado na canção Um Certo Sujeito que escrevi em parceria com Germano Ribeiro. Ouça em "áudios" da minha página e deixe seu comentário!
Nota 2 - Ilustração gentilmente cedida por @Sodac_01 (parte do mural).
Fazia três semanas que o bilhete estava no fundo da bolsa. Um tanto amassado, até molhado de tanto ser manuseado. Ela olhava o número anotado, pensava em ligar e depois dobrava o papel novamente.
Mas naquela tarde resolveu ligar. Será que ele se lembraria? Quantas como ela não receberam seu número de telefone?
Num ímpeto acionou rapidamente o celular e antes de dar pela coisa ouviu um "olá!" amistoso, sorridente e feliz. O homem do outro lado da linha parecia íntimo.
- Olá! Boa tarde senhora ou senhorita! À que devo o prazer?
Ela ouviu aquela frase imensa e pensou em desligar, mas os olhos de jade não lhe saiam da memória.
- É Maria Alice. Tudo bem?
- Agora melhor, querida! Diga, o que posso fazer para alegrar tão distinta dama?
- Estive há quase um mês no clube de gafieira, lembra? Você me deu um papel com seu telefone...
- Como não me lembrar? Claro! Esperei por você, Maria Alice, noite e dia...
- É que sou casada... Faz seis meses só. Ele é super ciumento... Riu sem graça.
- Mas a dama gosta de dançar...Percebi!
- É... Gosto muito. Ele não. Foi comigo na gafieira pela primeira vez porque comemorávamos o aniversário de uma grande amiga, mas jurou que não pisava mais lá.
- E agora, como verei Maria Alice, questionou galantemente o rapaz que naquele dia que lhe passou o telefone, usava um terno branco e gravata vermelha.
Será que ele estaria de chapéu? Ou de bermuda e tênis de corrida? Divagou a moça.
-Alô, moça bonita! Ainda está aí?
Que tal um suco de laranja no Pastel do Bartô? Assim a gente aproveita para se conhecer melhor...
- Ah, sim... Estou aqui. É? A que horas?
Marcaram para meia hora depois.
Para sair de casa, ela cuidou de arrumar o cabelo, passou um batom vermelho, calçou as sandálias de salto e vestiu-se como se fosse à uma festa. Agora lá estava ela na pastelaria que funcionava no andar térreo do clube.
Foi chegando meio sem graça e ele já estava por lá. Encostado num carro a viu chegar mostrando-lhe o seu lindo sorriso que era largo, dentes perfeitos e extremamente brancos.
Deu-lhe um aperto de mão, mas ele se aproximou mais e lhe beijou os dois lados da face.
- Aí está Maria Alice!!!!
Pediram pastéis e sucos porque ele avisou que não bebia fora de serviço. Contou-lhe da profissão de entretenimento na gafieira e dos anos que estudou dança de salão. Era instrutor de gafieira e ganhava a vida assim. Dançava com as damas que frequentavam o lugar e elas lhe pagavam a cerveja como retribuição.
Ela sorriu meio desconcertada quando ele perguntou se tinha interesse em aulas particulares que ele oferecia às mulheres que não tinham muito molejo na pista de dança.
Foi aí que a ficha caiu. O bilhete... Não era o que ela pensava.
A moça ponderou que aqueles olhos verdes deviam causar fortes paixões nas alunas que ele tinha. Ela mesmo, sem dar sequer uma voltinha no salão com ele, estava fixada no "sonho de valsa" que o moreno representava.
Aos poucos ela foi entendendo que tudo fora um grande engano. Ele só era um instrutor de dança e alí, na gafieira, ele fazia seu merchandising, a propaganda de suas aulas de danças.
- Que dia começamos, Maria Alice?
Marcaram para a semana seguinte a primeira aula. Ela fingiu estar empolgada para aprender dança de salão e sustentou o interesse no aprendizado até quando se despediram amigavelmente.
Só que no dia marcado ela não compareceu. Aliás nunca mais pisou numa gafieira...
Cláudia Machado
Nota1 - Baseado na canção Um Certo Sujeito que escrevi em parceria com Germano Ribeiro. Ouça em "áudios" da minha página e deixe seu comentário!
Nota 2 - Ilustração gentilmente cedida por @Sodac_01 (parte do mural).