INDIVÍNO
I
Sentado, ausente em mim, no âmago da pseudo-abstração, boquiaberto sem razão. Irracional, estirado no sofá, as minhas pálpebras austeras, far-se-iam rijas como as de um defunto vinte e quatro horas em estado de graça. Reitero: eu não estive lá! Ressalvo: talvez não fosse eu! Talvez embriagado ou algum psicotrópico, barbitúrico, ansiolítico, sintético, alucinógeno, exilou-me daquele suave momento. Uma ausência perceptual, privilegiava-me não viver aquilo.
Sentado ao sofá, tenuemente, em uma sala infestada de umidades, baratas, ratos e afins. Afim de que? Por conseguinte viera um homem mais idoso ao cômodo – uns quarenta e três, ao menos. Perfumado, sua camisa desabotoada, dava o passo certo de um relaxado caminhar malandrado. O sujeito de bigode pontudo e amarelado pelo tempo e uso de maconha, cigarros, encarou-me no rosto de menino e meu corpo “teen”. Sorriu! Eu tinha completos dezessete anos de total perdição e predileção pela inocência, integridade e usual indecência. O malandro bigodudo, era meu pai biológico, o qual há pouco havia me reconhecido, informalmente, seu herdeiro. O beberrão, tabagista e maconheiro de quarenta e três anos, ordenou-me uma ereção corporal, colocou-me à sua fronte, sobretudo, deu minhas costas a si e desceu-me as calças até os joelhos.
Recostado a uma velha mesa – e bem acomodado, assim dizendo, de mãos apoiadas ao móvel, os braços sustentavam-me no peso do tronco franzino e delicado. Papai retirou seu pênis da calça sedutora e o introduziu, gradualmente, no meu cu indefeso, iniciando-me no legado, na arte da vida, da filosofia: mágica homoxessualesca! Eu vi tudo, não compactuei, porque não participei. Não senti dor em nenhum jeito, mal senti prazer ou gozei. Pois tamanha era minha ausência de espírito no exato momento e, nunca encontrei respostas sobre o incesto nas “trepadas” do tempo.
I
Hoje, sou um renomado cirurgião plástico. Realizei os propósitos pequeno-burgueses da minha família classe média: tornei-me doutor e patrão! Também sou empregado, pois, na atual divisão internacional do trabalho, postulam-me “ profissional liberal”!
Mas ainda nessa conjuntura: patrão-empregado, contratado-contratante, eu tenho, digo, tinha um advogado. Cumpria sabiamente meus desmandos. Tratou do meu divórcio tão maquiavelicamente, que minha ex e filhos nem tiveram os respectivos direitos na divisão patrimonial e ao benefício alimentício!
O advogado cuidava de minhas finanças e bens também! Eu era o seu chefe enquanto nossas transações foram jurídico-burocráticas. Até que um dia ele desejou aplicar botox; silicone na bunda e diminuir as dimensões de seu queixo pontiagudo. Ele patrão, eu empregado. Eis, outra vez, a divisão social do trabalho!
Sucesso! Remodelei todo o doutor, como bom escultor que sou da figura humana. Tendo em vista, que ele tratava de um processo criminal, no qual eu havia me envolvido pouco antes: prisão em flagrante numa rave, portando considerável quantidade de ecstasy. Imaginem a soberba jornalística, lidando com bizarra informação? Não obstante, três telefonemas do brilhante profissional e uma mixaria dispensada ao delegado responsável, abafou-se o caso. Agora, eu mandava! Era o supremo, ele meu subordinado.
Subalterno, foi até manifestar a vontade de voltar ao centro cirúrgico e corrigir seu nariz, levemente inclinado para o lado direito da face. Aí, eram cobranças, gritos, gargalhadas: -“Eu quero assim, assim, porra!” Foi infeliz nesta intervenção: uma parada cardíaca no momento operação e uma infecção generalizada no pós-operatório.
Sua família, seus amigos, sua secretária, sua amante, à Ordem dos Advogados, acionaram-me no judiciário e nos meus respectivos conselhos profissionais por homicídio culposo, erro médico, dentre equivocadas acusações. Mas ainda trabalhando, os processos tramitavam de recurso em recurso. Fui ganhando tempo e liberdade. Até que o arquiteto, cujo vinha decorando a cobertura adquirida por mim no Morumbi, pensou em fazer uma lipoaspiração em sua formas barrigudas.
I
Janeiro é mês de recesso na autarquia onde me preparo, acho, na vida para porra nenhuma! Janeiro é mês de sol, mulheres, praia. Janeiro é mês do samba, cerveja, drogas. Desde o segundo dia desta duzia de meses anuais, eu já subo os morros para sambar e tomar parte em rodas e barracões, antecedendo-me ao maior espetáculo dos verões.
Saio e já saí em todos os blocos e escolas em outros carnavais. Tempo bom! Mato aulas no período letivo, compareço às passeatas no meio-fio, acho até que faço política e nem aparo há meses a minha barba, suando melada com um espuma alcoólica, correndo entre suas entranhas castanhas, até atingir o vestido roubado de minha mãe e me manchar o toráx.
É parte de minhas rotinas carnavalescas, sair às sextas e só voltar às quartas de cinzas, muitas vezes composto apenas com a cueca encardida destes dias, dias, dias,.. no tocante, naquele infértil ano, eu dançava pelas ruas com os olhos vermelhos; com o olhar amarelo; com à puta abraçado; com o cigarro me queimando os bigodes e os lábios, com o copo à mão. Até que Marcos, tomou-me surpreso com um forte empurrão: “FILHO DA PUTA, ALIENADO”... babava em cima de mim, enquanto eu tentava uma manobra, para à defesa daquele infortúnio. Porém, o obreiro protestante se pôs a orar por nós, lendo em sua bíblia salmos milenares!
Marcos é militante do movimento político, organizado na faculdade: do qual compõe, uns poucos discentes recalcados e docentes frustrados. Marcos é também da Medicina, sobretudo, segue à direção do esquerdismo-extremo, neoconservador, anarco-sindical, pseudo-maoísta, sandinista e lá sei? Ele me socava bêbado no asfalto, em meio àquelas marchas sinuosas e toda à massa dançante, fantasiada. Marcos me agarrou pelas alças do vestido de mamãe: “ BABACA, VOCÊ NÃO PERCEBE QUE É ISSO O QUE ELES QUEREM?.. SÃO FESTEJOS CONTRA-REVOLUCIONÁRIOS, OTÁRIO”!.. “PANIS ET CIRCENSES”!... eu disse. O “camarada” me arriou mais uma porrada na mandíbula, até que, sangrando, gritei: “ PÁÁRAAAA PELEGO, TORTURADOR DO CARALHO”!.. Marcos me observou, observou, observou. Fez de encontro sua boca carnuda à minha - ferida -, tocou-me no lábio inferior, levantou -se e correu! Enquanto o obreiro da igreja, com a bíblia aberta, empregou suas mãos pedreiras, calejadas de obras pesadas em minha cabeça, continuando a orar e suplicar minha misericórdia. Aconselhou eu não peregrinar naquela orgia. Só Jesus, segundo o missionário, me salvaria! Clamava o diácono pentecostal, como que cantando uma música de anjos, em comunhão a um desespero satânico, cujo conseguiu afanar minha atenção. Orou-me o pobre humano! Levantei conduzido pelo seu olhar, pelos seus calosos dedos, os quais beijei. Tão logo, a banda tocava Braguinha neste específico bloco e segui no samba, prossegui nas marchas, namorei, "meti", pulei! Hoje me componho piranha, esquecendo daquele carnaval, no qual em meio ao pseudo-marxismo estudantil de um camarada recalcado, apanhei. Tão logo, dancei!
I
Acabou-se a vida doce! Bem, todos os meus recursos se esgotaram. Vim parar na penitenciária. Logo eu, um médico! Ainda me custa acreditar ter deformado ou matado alguém. Defendo a tese que o ser humano se auto-flagela quando submetido, por vontade própria, à intervenção clínico-cirúrgica de correção. Todo homem se inicia no gradual processo da morte quando nasce. Bem, eu não matei ninguém! Estou aqui por causa de uns desafortunados de longa vida. Sou agnóstico, contudo, o meu advogado usou de um conhecido jargão no tribunal do júri: “Deus quis assim!”...
Lembro do Capeta quando penso aqui está, comendo o pão que ele próprio me amassou. No primeiro dia, levei uma surra de quase perder à pele. Dias depois, tentaram me violentar, corri! Ademais, deixaram-me em paz, quando souberam de quem eu era filho. Meu pai morreu aqui! Já era velho na bandidagem. O “coisa ruim”, apagou-se numa briga com um cara uns trinta anos mais novo. Os dois se mataram aos socos. Alguns tortos afirmam ter presenciado, os espíritos malignos do meu velho e seu inimigo, caminhando abraçados rumo ao inferno. Resultado: o coroa virou mito nestes pavilhões!
I
Taliban é um movimento islamita, nacionalista, da etnia Afegane Pashtu, que efetivamente governou o Afeganistão entre 1996 e 2001. Conheci o Jorginho por volta de 1994, efetivamemente, ele ainda era assim conhecido. Foi mesmo entre 96 e 97, que o apelidei, dada a sua desenvoltura na liderança do grupo e porque, tão jovem, já dispunha de barbas esvoaçantes; além de enxergar de um só olho, aludindo à o líder do povo afegão: o Mulah Mohammed Omar; e por ser um delinqüente! Eu conhecia a origem deste ideário fundamentalista, porque, como já disse, meu padrasto é historiador e vivia comentando nas reuniões com amigos, políticos e intelectuais, ocorridas no apartamento onde morávamos – no Leblon, bairro da Zona Sul do Município do Rio de Janeiro -, sobre suas análises geopolíticas acerca do Oriente Médio, naquele período do golpe afegão, em questão. Então, sabendo à essência do movimento, tratei de rotular meu amigo e condutor no crime, tal vulgo.
Eu estava no primeiro ano científico ( naquele período, ainda era o curso Segundo Grau ), quando topei com o Taliban em minha classe. Entrei quase na metade do segundo semestre letivo, dada à expulsão do educandário onde estudara desde o Jardim da Infância. Foi um processo delicado: eu tinha tentado matar meu ex-professor de física com um estilete, no momento em que ele me chamou à atenção numa aula de óptica. Somado aos quase dez anos de inúmeras tensões estabelecidas entre a equipe pedagógica do colégio comigo, este foi o estopim.
Não se demorou muito para papai me alocar noutra instituição. Ele tinha assumido à reitoria da universidade onde trabalhava; publicado um livro há pouco tempo, havendo até uma proposta de assumir um cargo político no governo do Estado do Rio de Janeiro, caso saísse vitorioso na federação, o candidato do partido, ao qual era signatário. Daí, o porquê de me conseguir uma bolsa integral noutra dessas biroscas tradicionais.
Taliban, aluno repetente, era dois anos mais velho que eu e devo dizer: o início de nosso relacionamento foi muito conturbado! Nesse período, descobri em minha casa, numa conversa dessas de empregadas na cozinha, quem era o meu verdadeiro pai e retornei ao subúrbio da cidade onde morava para saber da tal “Rabinho de Ouro”. Por que minha mãe? Fiquei revoltado, passando a me corresponder com o Bandido Louco, então preso em São Paulo.
Jorginho, era do tipo que me perturbava - no pior sentido da palavra! Nas aulas, atirava-me bolas de papel; elásticos em minha nuca; cercava-me nos intervalos das aulas, junto aos seus subordinados e me afanava todo o dinheiro que dispunha, ameaçando-me sempre! Faz-se-ia, convincentemente, valer de suas vantagens em relação a mim: nunca andava só, além da idade mais avançada, era um rapaz de porte atlético. Ele não me conhecia!
Numa ocasião, fez cumprir sua palavra em me surrar. Não quis brigar diretamente, preferiu colocar o melhor brigador entre seus "pela-sacos" para executar à ação. Era um garoto pouco mais forte, e aparentemente, de minha idade. Não me lembro o nome do indivíduo, era conhecido entre as classes escolares como “Van Dame” – Jean Claude Van Varenbergo, de nome artístico, que vinha a ser o mesmo apelido do meu adversário, é um ator e lutador belgo de bem sucedida carreira nos Estados Unidos, devido aos filmes de lutas pelo mesmo protagonizado.
Fui cercado há alguns quarteirões da escola e não fugi à briga! Vi aquela quadrilha infanto-juvenil, torcendo pelo meu fracasso, para que eu apanhasse até pedir arrego. O cara me jogou no chão, em primeiro momento e quando percebi que ele me imobilizaria num golpe de jiu-jitsu, não sei de onde me vieram as forças e reflexos suficientes para empurrá-lo com minha perna esquerda, como fosse num chute que eu, vítima em desvantagem, dei mesmo deitado. “Van”, caiu no asfalto, colidindo sua coluna ao meio-fio. Ouvi seu grito encolerizado. Ali, como arauto do ódio, pensei, pela minha honra de menino-homem, prosseguir. Olhei para os lados e seus amigos se mantinham, uns raivosos, outros ruborizados, desejando acabar com a luta e até me espancar. Mas Taliban, ordenava à continuidade, com apenas nós dois! Não sei de onde surgiu um paralelepípedo solto àquela roda, pois a rua era lisa. Foi o que me serviu para atirar no crânio daquele breve inimigo!
Van Dame morreu a caminho do hospital. Seu falecimento, causou comoção entre professores e colegas de classe. No entanto, por ordem do diretor, amigo e ex-aluno de papai, foi proibido comentar o assunto entre os corredores da instituição. Por conta do homicídio, meu pai, além de arcar com as despesas funerárias do moleque; transferiu para sua família a propriedade um apartamento, que acabara de comprar no distrito da Barra da Tijuca – Zona Norte do Rio de Janeiro -, imóvel este, com um único propósito inicial: ser-lho-ia a complementar nossa renda familiar, com sua possível locação. Papai, também se obrigou a dar uma meia dúzia de telefonemas para esse meu problema não vazar pelas mídias oficiais nem tomar os cabíveis rumos judiciais. Aliás, todos saímos felizes no final: eu, minha família aumentou seu prestígio emergente; a do “Van” saiu do aluguel e que o falecido descanse na paz dos infernos! Por conta do acontecido, Taliban e eu, tornamo-nos grandes amigos!
I
Agora preso, servindo de enfermeiro na cadeia – sou um “coroa” inconseqüente, ensinando aos novos médicos do Estado. Tenho sobra de tempo para inventariar tudo isso. Indivíno é o meu nome! Talvez seja pelo meu triste destino! Na rua do subúrbio carioca onde morava minha mãe, os seus colegas de infância a apelidaram, carinhosamente, "Rabinho de Ouro". Era um lugar de profética paz, até chegar meu pai ( o Bandido Louco ), rapaz bem afeiçoado, para lá de uns vinte poucos, valente e mau demais! Era destemido e dono de uma ficha criminal tão grande que não se sustentava no interior de uma delegacia. Ele já mostrando ao que vinha: matou um malandro local, comercializava armas, haxixe, cocaína e heroína na casa onde se escondia. Impunha o toque de recolher aos moradores; não permitia brigas e o uso de alucinógenos nas ruas. Daí, o meliante quis saber da famosa "Rabinho". No entanto, entre os dois, o relacionamento transcendeu a medianos apelidos e torpes experimentações retais. No momento em que mamãe tomara conhecimento da prisão do Bandido Louco, acabara descobrindo sobre minha gravidez. Ela só com treze anos, expulsa de casa, viciada nas diabruras sexualescas e nas peripécias drogueiras, conseguiu um emprego de doméstica na casa do professor e historiador Antônio Luiz Matheus Augustino Pedroso Antunes Fernández Aloísio Pinto Faria de Benevides Vilar Moreira Damaceno e Silva, recém-aportado no Brasil depois de um forçado exílio, anistiado de todo o terrorismo que ajudou a promover contra o Regime Militar brasileiro nos anos de chumbo (1968-1973). Foi com o professor que mamãe acabou se casando, regenerando-se e me entregando a ele como seu legítimo filho, cujo com o Soares de mamãe, ainda carrego como herança seus doze sobrenomes, embora Antônio Luiz Matheus, entendesse todo o contexto em que fui concebido, ele é o meu pai adotivo. Eu sempre soube quase toda a minha verdade. Não obstante, tomei conhecimento, minuciosamente, de todos os fatos precedidos ao meu nascimento, na adolescência: do trágico passado de mamãe, por exemplo, tive com uns que a traçaram, no mesmo bairro onde era nascida e morava. Soube quem era à tal Rabinho de Ouro!
I
Quando médico recém-formado, o querido pai, assim, considerado por mim, montou com uns poucos recursos, evidenciado por sua vontade e orgulho, um modesto consultório - para me iniciar na clínica - no Centro do Rio de Janeiro. Com um capital de giro limitado e direito a uma secretária idosa, obesa, desdentada e carente. Nada nos impedia de sempre marcarmos – eu e ela – ardentes sessões copulares nos finais dos expedientes. Neste enredo, além de profissional liberal, eu cumpria minhas designações médicas num hospital público. Tirei a sorte de logo me aprovar num concurso. Sorte?
Servidor municipal e fodido por todos os lados: salário baixo; um “elefante branco” cheio de moscas ou uma invisível clientela; namorada gestante; aluguéis; enfim, pouco dinheiro e muitas contas a honrar! Cheguei a prestar serviços para um desses consultórios coletivos, particulares, onde se encontra uma gama variada de médicos das mais bizarras especialidades. Lugar onde se paga pouco, apesar do árduo trabalho, porque os honorários são baixos; onde o paciente-alvo é o pobre, abandonado pelo Estado. Sujeitos desprezíveis e irritáveis!
Não, não estava satisfeito! Antes seguisse os conselhos do meu falecido amigo dos tempos “bad boys” adolescentes: o “Taliban” de Ipanema! Quantas foram às vezes que ele me quis em seus negócios! Chegamos até a puxar uns carros, promover assaltos e trocar com os “meganhas” juntos! Taliban morreu, mas se foi endinheirado, com um título próprio de nobre, naquela conflituosa hierarquia e seus funerais mereceram honras cívicas, prestadas pelos moradores da favela. Enquanto isso, eu permanecia duro, quase pai e doutor! Quem mais lucrou?
Contudo, redundo: não estava feliz! Atava-me sempre ímpetos frustrados, daqueles que só emergem nos derrotados. Naquele momento, no repleto desespero, enxergava que o único caminho era abandonar minha profissão, pois necessitava a princípio, de uma boa especialização, no intuito da triunfal inserção mercadológica. Todavia, não obtinha recursos para tal.
Marcos, meu colega ex-comunista - daqueles semestres amarelos - tinha minha idade e quase o mesmo tempo de formado. Já era neurocirurgião renomado! Lecionava nalgumas universidades, hospitais-escolas, além de ter esculpido uma ilibada reputação internacional. Surpreendeu-me sua súbita ascensão financeiro-profissional. Pois aqui ressalvo, Marcos não era de origem nobre e, para concluir seus estudos, fui testemunha: ele enfrentou inúmeras adversidades! Um dia, a curiosidade me instigou:
- É o Diabo!.. ele afirmou.
- Como?.. Repliquei sem entender.
- Basta uma aliança... Marcos se estendeu.
Hoje, bebo de um uísque importado, no andar onde funciona um dos meus consultórios na Paulista, eis também ofereço meus préstimos no Rio, propriamente no Leblon, uma vez ao mês em Porto Alegre e Estados Unidos. Estou especializado na ARQUITETURA HUMANA – cirurgia plástica. Aliás, já me nego à intervenções em inúmeras celebridades ou personalidades sensíveis ao olhos globais. Minha agenda lotou pelos próximos quinze anos.
Daí, os recursos para manter minhas viagens, mansões, coberturas, fazendas, imóveis na Europa: Dinamarca, Paris, Espanha; meus automóveis importados; mulheres; garotos; veados;..
I
Uma vez perguntei à mamãe para que servem os vovôs. Mamãe disse que eram os pais dos nossos pais e mães. Perguntei também onde estava o pai dela, ela disse que morava com o “Papai do Céu” e a mamãe dela também, junto com à do papai. Mas eu tinha um vovô! Este, ainda não pleiteara um lugar junto a Deus. Ele era muito legal comigo! Era o pai do papai então?! Quando eu fiz cinco anos, o vô disse que eu tinha completado uma mãozinha de vida e me levou para tomar sorvete antes da festa com os meus amiguinhos. O vô era legal: ele me deu um vídeo-game “Atari” e sempre quando nos visitava, papai estava dando aulas, ele me mandava jogar o vídeo-game para ficar conversando com mamãe no escritório do apartamento.
Agora, não sei porquê eu fui parar na secretaria da escola? A tia velha da coordenação estava gritando muito! A Luiza Rangel é minha melhor amiguinha e a tia me puxou pelo uniforme quando dei um beijo na boca dela e passei à mão por baixo de sua saia, tentando tirar sua calcinha. Não entendi, Luiza Rangel chorou; fui para à coordenação; a mãe dela chegou aqui brigando comigo e o papai com muita raiva de mim, pedia desculpas à moça. Até que perguntaram os três no mesmo momento:
- Por que , Indivíno?
- Ela é minha colega, ora!
- E isso se faz com amiguinhas, garoto?.. Perguntava à tia velha.
- Quem te disse ser certo agarrar suas amiguinhas?.. Agora papai me puxava às orelhas.
- Mamãe...
- Sua mãe?!.. Eu estava chorando e a tia Aurora – mãe da Luizinha Rangel, logo ela, uma adulta não sabia disso?
- É!.. Respondi... Ela me disse depois que vi o vovô, arriando sua calcinha no escritório da minha casa, beijando sua boca. Então minha mãe disse: - "Filhinho, só os coleguinhas podem fazer isso viu"?
I
Estes anos de prisão, fizeram-me repensar sobre uma série de situações, as quais me envolvi na vida. Destaco o pacto! Àquele que me fez enriquecer e agora, mal consigo para um baseado. Tempos atrás pensei, pensei, pensei, refleti uma possibilidade de desenlaçar este nó. Daí a causa que me levou a envolver-me em liturgias ocultistas. Aqui na penitenciária, encontram-se de católicos a xintoístas; de budistas a ateus; de protestantes a satanistas. Entretanto, quanto a última opção, nunca me dei – acho! Pois tudo que dele recebi, foi-me tomado. Até sua proteção; até meus entes – acho!
Por fim, encontrei um grupo de médicos, economistas, empresários, enfim, ex-profissionais liberais que mexiam com espiritismo. Eles se reuniam numa sela todas às segundas-feiras para as respectivas sessões improvisadas. Uma mesa com uma toalha branca e um copo de água ao seu centro, decorava o ritual que ali estaria prestes a acontecer.
Um amigo me disse: - “Não se impressione”... Sobretudo, ao darmo-nos às mãos como numa corrente humana, sentados em alguns caixotes, confesso: comecei a tremer e suar frio. Enquanto o colega que conduzia a sessão fazia uma prece, aquele sentimento foi piorando e subindo um calor voraz meu corpo acima. Um do presentes de repente afirmou que via um espírito naquele copo de água. Ora, eu não enxerguei nada!
Um dos homens ali, ainda afirmava que tinha alguns “irmãos desencarnados” prontos a passarem suas mensagens. Passava em minha cabeça as lembranças de minha mãe e meu pai adotivo - os quais jamais perderam seus domingos a me visitarem. Minhas duas ex-mulheres, agora casadas e com novas famílias e meus filhos – adultos que não vi crescerem.
Não sei explicar como interrompi uma prece e tomei a palavra:
- Salve Deus, ó mestre, Jesus Cristo e todos os espíritos expoentes de nossa cultura; todos que ajudaram na formação e manutenção de nossas mentalidades; todos que um dia aqui estiveram encarnados e desencadearam suas revoluções, hoje, evidentes na história. Salve o ideário latino! Salve o idelismo alemão; o grego; o ceticismo inglês; o tolhimento científico; os banimentos religiosos, ó meu Deus, só o senhor sabe o que faz! Ressalvo nesta, os antropófagos, os surrealistas, os parnasianos, românticos, concretos, tropicalistas e os NOVOS BAIANOS. O senhor vá nos guiando!
Tomei o recipiente de água sobre à mesa e bebi. Meus companheiros, estupefatos, testemunhavam meu estremecer. Daí, apaguei de vez! O que soube sobre o sucedido, foi através de relatos de alguns colegas presentes naquele momento. Eu me tremi todo, dizem, virei os cumes e proferi com a voz, um tanto diferenciada:
TERRA
VASTA PLANÍCIE DE TREVAS
HÁ VIRGENS SINERGIAS ERRANTES
E NOSSOS DEMÔNIOS SE VERTEM.
DEUSES ATÔNITOS CONVERGEM!
Relataram-me do meu corpo se abalar novamente e desmaiei sobre a velha mesa. Inconsciente e sem dar sinais, naqueles poucos instantes um comentário atravessou à sessão:
- Baixou um poeta aqui hein!.. Alguém falou.
- E que merda... Outro redarguia.
- Isso é Augusto dos Anjos?
- Nada, esse não chegou à porra nenhuma em vida!
- Puta que o pariu, a gente se reúne, esperando uma mensagem de ao menos Florbela Espanca, Castro Alves, Sophia de Melo Andersen, Vinícius de Moraes, Cabral Melo Neto e nos aparece essas figuras?!.. Vai tomar no cu!... Observou um professor de literatura presente ao ritual.
Até que meu corpo balançou novamente, entrando em transe. Fiquei vesgo, como meu pai - o biológico - e comecei a me colocar de forma incomum ao de costume:
- Bem, o Bandido à casa torna, ah!.. Dizia o espírito que em mim incorporou, olhando ao seu redor.
- Irmão, você foi daqui?.. O mestre da cerimônia perguntou.
- Fui de muitas “morada” como “erta”. “Mar” aqui “disincarnei”, “sabi” “có é”?
- O que deseja de nós, quem é você?
- “Tão mi cunhecenu não”? “Sô” o famoso “Bandido Lôco”!
- Sei, é você!.. Me dê um autógrafo? Um dos homens requisitou.
- Eu “sô” à lenda!
- Todos somos iguais na morada do pai, caro irmão!
- Só se “fô” você, otário! “Porqui” já tenhu o contexto com o cara e ”pá” mim ”tomá” "àr" “Boca Celertial” falta “pôco”!
- Tu é do contexto, chefe, manda o papo aí!.. Um dos meus colegas resolveu desempacar a conversa.
- Vim aqui “dá” “qui” a missão ”derte” cavalo “tá” “cheganu” “nu” “fim”.
- Este CAVALO, você quer afirmar, o seu filho?.. Indagou um advogado ao bandido morto.
- É, meu filho! “Erta” “menti” “qui” aqui “tomu” “comu” “meiu” “di” “mandá” o papu “pá” vocês.
- Qual é a missão dele Bandido?
- Sei não!.. Sei da minha: fui "compometido" com o “már” do “iníço” ao fim “di” minha “passage” aqui na Terra. Agora, “essi” aqui – observava meu pai sobre mim – , isso foi um “porra-lôca”, “qui” nunca “tevi” disposição “di” “pensá” “nus” “procedimentu”. “Aliár”, um “már” da geração "di" vocês – apontava o espírito para todos os participantes daquele ritual, cujos em quase totalidade de minha faixa etária -,.. tudo aí, “incrusive” meu filho: é “dotô”, “már” só tem comédia nessa porra neguinho, ah!
- Concordo irmão, sobretudo, não entendo o teor de sua mensagem. Diga-me: o doutor Indivíno, seu filho, seu canal, como quer que o trate, declara ter selado um pacto com forças malignas na juventude. Daí, explica-se sua ascensão meteórica em todos os aspectos da vida. Embora, hoje, na maturidade, é vontade dele desfazer esse acordo.
- Sei, dis a ele “pá” “ficá” “trankilo”. A coisa “tá” tá “braba” “pá” “essi” "caboco", “qui” até os “capeta” “cum” quem ele “disinrrolô”, tão “correnu” da palavra agora. Ele “tá” “intregui” a “Jisus” “mermu”. O “pela-saco” “matô” tanta “genti”, “qui” tem até agiota “querenu” “fazê” ele de novo lá “dotro” lado, ah! Papai pausou e prosseguiu... “Már” vim aqui “mandá” o papo “pu” “cavalo”: fala “cum” ele “i” “si” “dispidinu” dos “irmão”, dos “filho” daqui, “porqui” sua hora tá “cheganu” mané! A chapa tá "quenti"! “Brevimente” o vacilão vai “morá” “cumigu”, ah!.. Valeu fiel!
Nesse momento, foi-me relatado: mexi a cabeça e tão logo o resto do corpo, desacordando novamente. Todavia, lembro de quando voltei embriagado numa tênue sonolência e uma dor craniana pouco depois. Dito linha por linha do que foi relatado, ainda me revelaram eu ser um médium e pediram para que retornasse mais vezes às futuras sessões. Não mais participei e também não fui feliz!
I
Não apenas existem flores em jardins. Pragas tomam conta! Mas minha sorte sanou todas elas e minha vida agora é maravilhada pelo amor. É, nunca pensei que um dia fosse me entregar a alguém. Eu olho embasbacado uma foto de Berenice que carrego nos meus paletós e jalecos onde vou. Aí entra uma enfermeira no consultório dizendo que o centro cirúrgico está pronto e a paciente à minha espera. “Tudo bem, já vou”! Digo.
Conheci Berenice em Mônaco. Eu acabava de me recuperar de um procedimento cirúrgico, devido a uma pancreatite crônica. Alguns quilos mais magro, impossibilitado de trabalhar, resolvi viajar, claro, seguindo minha própria intuição médica, pois estava apto para tal, sei! Como médico, claro, era de meu conhecimento não fazer mais uso de bebidas alcoólicas e nada que afetasse ao que restava de meu pâncreas. Sobretudo, ainda sim, bastou alguns dias de repouso, agachei-me como um súdito ao soberano uísque e à coroa cocaína. Eu bebia, cheirava e chegava ao ponto de descer a porrada em Luíze, minha esposa, todas às vezes que buscava um punhado de esperança nestes caminhos. Todavia, tentando salvar um fracassado casamento, pus-me em viagem à citada ilha, como fosse uma segunda lua de mel.
Mas o destino – quiçá sorte? -, resguardou-me Berenice! Era uma jovem de vinte anos, dezessete a menos que eu e namorada de um playboy com minha idade: destas figuras falidas, garantidas num sobrenome famoso bem de longe, para circularem nas rodas sociais.
Berenice, estudante de Geografia, era caucasiana de lábios estonteantes, olhos verdes e redondos, sorriso branco-neve, madeixas louras, lisas e pesadas até à fina cintura, dividindo àqueles traços corpóreos, aos que a meus olhos, revelavam sua nudez, mesmo escondida sob tecidos pesados de cores fúnebres. Coisa dessa desviada juventude!
Não demorei a me aproximar do casal. Minha mulher, fez-se um tanto, desconfiada de minhas intenções: em alguns anos de convivência, Luíze reconhecia minha personalidade pouco amistosa e amável. Contudo, sempre arredio, apático, seco, sarcástico até com os nossos filhos, despertou em minha então companheira, uma impetuosa curiosidade. Resultado: voltei a São Paulo, amaciado com Berenice, deixando a mãe dos gêmeos, perdida na Europa.
Bem, existem pessoas que entram em nossas vidas para somar. Neste ponto o Diabo me ajudou: logo ela, minha nova companheira, indicou-me um advogado, o saudoso doutor Romareis, eis que antes de fazer sua passagem para o infinito, diga-se de passagem, através do meu bisturi, como provado em inúmeras instâncias processuais, ele conseguiu meu livramento daquele falido matrimônio sem algum prejuízo. Nem pensão alimentícia, nem a mansão que nós morávamos em São Paulo, nada! Apenas paguei as respectivas passagens de ônibus, para à ex e o casal de crianças com destino ao Rio de Janeiro. Depois fiquei sabendo que eles voltaram para o bairro de subúrbio onde ela residia quando a conheci, nos tempos da faculdade.
O tempo passou, o amor fervilhou e numa infeliz coincidência, descobrimos ser irmãos: ela também era filha do Bandido Louco! No entanto, sempre disse que, ao contrário de mim, foram fracassadas suas tentativas de comunicação com o nosso pai. Fiquei sabendo, através dela, obtermos mais onze irmãs, distribuídas em distintas mães. Foi atribuído o fato de eu ser o único homem, ao que se constava, ele ter me correspondido. O incesto mais uma vez, fez-se sólido em minha vida. Nesta, com amor! Já não traía Berenice, assim, como fiz tantas vezes com minha primeira mulher e outras namoradas, namorados, os quais rememoro agora. Lembro-me bem: no instante, o qual a conheci, mesmo não sabendo se minhas investidas naquela menina seriam triunfadas, terminei pelo telefone com o meu caso, um modelo espanhol, do tipo moreno, peludo, ibérico!
Contudo, nosso pai, tinha de saber! Na prisão, o velho nos abençoou: -“Fica tudo ‘im’ família né”?!.. E tomamos apenas cuidado para que não viessem os filhos. Houve um alarde, logo, eu próprio, interrompi à gestação, salvos os meus conhecimentos amadores em obstetrícia. Não obstante, olho à foto de Berenice antes de operar.
I
COMPLETEI ONTEM CINQÜENTA E CINCO COM A CERTEZA DE LOGO MORRER. MINHA FILHA ESTEVE AQUI, COLHEU-ME O RESPECTIVO MATERIAL A TRABALHAR NUM CLONE. MINHA FILHA VAI GERAR MINHA RÉPLICA. MINHA FILHA É DOUTORANDA EM ENGENHEIRA GENÉTICA APRESENTADA À COMUNIDADE CIENTÍFICA POR MEU PAI. ALIÁS, VIÚVO DE MINHA MÃE, UMA VELHA ESCROTA E SUICIDA! MINHA MÃE AINDA VIVA, SOLETRAVA, VOMITANDO SANGUE EM SEUS ÚLTIMOS E DESPREZÍVEIS SUSPIROS: "B-A-N-D-I-D-O-L-O-U-C-O" APÓS SE ATIRAR DA JANELA DO APARTAMENTO ONDE MORAVA COM MEU MEU PAI ADOTIVO NA GÁVEA. MINHA FILHA É UMA LINDA MULHER E MEU FILHO NEM DESEJA ME VER PELA FRENTE! CASOU-SE E ME DEU UMA NETA: MENINA FEIA, NÃO SE CANSA DE ME PROFERIR O ÓDIO! MINHA EX VIVE BEM COM SEU NOVO MARIDO E BERENICE, FALIU SEU SEGUNDO OU TERCEIRO ESPOSO, PRENDEU MAIS QUATRO E PERMANECE CASADA AOS TRÊS MESES COM UM BILIONÁRIO GAY EM CABO VERDE. SEI QUE VOU ME FODER, AGORA VOU MORRER! ESSA É MINHA VIDA... VEJAM A MINHA VIDA AÍ!
I
Ao contrário do tempo de papai – o adotivo – o universo universitário sofreu consideráveis manobras: quando o professor doutor Antônio Luiz Matheus Augustino Pedroso Antunes Fernández Aloísio Pinto Faria de Benevides Vilar Moreira Damaceno e Silva, ingressou no curso de Direito na Universidade do Brasil – hoje, Universidade Federal do Rio de Janeiro, UFRJ -, no início dos anos sessenta, as turmas e grades eram mais rígidas. Ou seja, a infra-estrutura das graduações, seriadas, apesar de sempre se ter discutido sobre a interdisciplinaridade científica.
Eu já sou de uma geração flexível: à do “sistema de créditos”, um velho-novo modelo adotado, quase em totalidade pelo ensino superior. Segmentos, sob os quais, fundiu-se minha massa encefálica! Desconheço a verdadeira essência do movimento estudantil. O mesmo que meu pai ressalta com tanto esmero; o mesmo que o iniciou na militância política, conduzindo-o ao partido de esquerda, ao movimento revolucionário, à luta armada, à prisão e finalmente, ao exílio forçado na década de setenta, o que somou à sua extensão acadêmica no doutorado em História, no país, ao qual fora asilado. Neste período de banimento, começou a publicar seus artigos e alguns livros, voltados à historiografia contemporânea, ora, traduzidos à língua portuguesa com a revogação do AI-5 em 1978.
Retornando ao espaço temporal atual, além de desconhecer essas agremiações de graduandos revoltosos, onde ideólogos e idealistas discutiam filosofia, rupturas sistêmicas, etc. Fiz uma tatuagem em minha canela direita e coloquei um piercing no supercílio esquerdo. Diferente do meu Segundo Grau, hoje Ensino Médio, não tenho uma só turma. Estudo em várias! Explicam os atuais pensadores e gestores da educação, esse sistema a promover interações entre variadas graduações. Faço minhas aulas em uma diversidade de cursos! Calouro, com apenas dois meses neste imenso campus, já me envolvi nas mais disparas situações: fiquei sócio de um cara da Química, distribuindo balas e outras drogas entre os departamentos da universidade e nas festas organizadas em suas dependências, alojamentos; estou noivo de uma menina - à Luíze da Física – e transo com um professor da Filosofia.
Decerto, sou convicto da premissa desse tal “sistema de créditos”: transformar-me-ei um homem crítico, um profissional capaz de lidar e me abstrair nas adversidades apresentadas na profissão por mim escolhida, seja nos aspectos analíticos, lógicos, sociológicos; além de racionalizar à competitividade, a cada dia evidente, com mais clareza imposta pelos mercados, atualmente. Eis que se Deus existe, ele ajuda os estudantes. Já não necessito quase morrer afogado em literaturas técnico-científicas, sobre as quais à ciência diz impor – apenas passo o básico – enfim, quase nada a ler! Leituras maçantes não são mais requisitos, como nos turbulentos tempos de meu padrasto. Agradeço aos doutores e se existir, Deus também!
I
A amizade com Taliban, rendeu-me uma sólida experiência de vida: entrei de vez no universo das drogas – como usuário e profissional, repassando bagulhos na escola, nas ruas, nas festinhas, enfim, nosso grupo praticava no que concerne ao crime, de quase tudo um pouco! Furtávamos carros, arrombávamos imóveis, batíamos em mendigos, operários, pobres, assaltávamos, agredíamos prostitutas e demais frequentadores das noites cariocas, além de quase sempre, estarmos envolvidos em brigas nas boates destas nigths.
Atribuo à malícia da “turma Taliban”, o início de minha vida sexual. Numa tarde, embriagamos uma colega em comum - e aqui resguardo alguns detalhes da festa feliz! Só posso dizer que eram treze garotos loucos de tesão, muitos há tempos sem ninguém, e eu, virgem, só conhecia mulher através de revistas, tocando endoidecidas punhetas! Lembro bem, dela recostada ao acento do sofá na sala de um dos envolvidos naquela surubada, encurralada, babando com a garrafa de vodka à mão. Quando chegou minha vez – fui o sexto da fila -, coloquei meu pau em sua boceta lambuzada de sêmen e antes que me viesse o êxtase da ejaculação, retirei o pênis e comecei a trafegá-lo naquela geografia de fronteiras rústicas, entre a vagina e ânus, até então desconhecidos à minha realidade. Rememoro, como hoje fosse, o seu berro bêbado: -“ No cu não”!.. Mas foi tarde.
Contanto, diz o ditado: “alegria de pobre dura pouco”. Houve um infortúnio numa dessas frias madrugadas e todo mundo foi detido por porte ilegal de armas de fogo; poucas gramas de maconha, pó, "craque paulista" e alguns sintéticos. Papai, então Secretário de Estadual de Educação do Estado do Rio de Janeiro, interveio com sua influência tosca, junto ao judiciário e à imprensa, livrando-nos dos anos de detenção que aquilo nos acarretaria e óbvio, sua imagem de educador exemplar e político neoconservador. Não era bom para sua carreira ter um filho preso, naquele momento de ascensão político-profissional.
Todavia, não fugi à uma punição! Fui castigado a morar na roça. Ou seja, enviou-me à fazenda de um primo seu. A esposa do primo, obviamente, não ficou feliz com a boa nova. Não era nada bom se ter um Indivíno, dividindo o mesmo espaço com sua filha adolescente. Foi o melhor castigo de minha errante vida! Estou aqui no interior, meus estudos trancados, até retornar à grande cidade. Hospedado numa casa, antes abandonada, reformada para a minha chegada. Nada muito ostentador: sala, quarto, cozinha, banheiro - o básico. Uma serviçal do casarão, encarrega-se de todas as minhas refeições e limpeza dos cômodos deste novo lar. A mesma empregada, a filha e a mulher do primo, revezam-se em visitas, onde, as leciono – em diferentes horários -, traquejos e manobras sexuais urbanas. Acontece, entre a gente, várias trocas culturais em vista disso. Elas terminam sempre por me repassar à plurivocidade do sexo rural: -“UAI, UAI, UAI”...
Abençoado por Deus, creio, consigo amealhar uma grana com a peãozada local. Trouxe minha particular coleção de sementes e a estufa borbulha! Forneço fumo melhor que muito traficante por aí! Não há concorrência, por exemplo, na distribuição de trombeta, ayahauasca na região e adjacências. Além de ter aprendido com o mestre Jorginho Taliban, a produzir do mágico vegetal denominado erythroxylon, um puro branco, o qual neste viés comercial, batizo, produzindo uma propaganda enganosa à minha clientela. Este mês, acho, novamente vou bater a meta!
“ BOA NOITE, HOJE, 23 DE MAIO DE 2005, O JORNAL DA NOITE ESTÁ ENTRANDO NO AR”!
“MORREU HOJE EM CONFRONTO COM À POLÍCIA, JORGE ANTÔNIO MENDES DUTRA: O JORGINHO TALIBAN, UM DOS TRAFICANTES MAIS PROCURADOS PELA JUSTIÇA DO RIO DE JANEIRO, NOS ÚLTIMOS CINCO ANOS”.
I
Os mares estavam mais para piratas: processos; muitos gastos com os advogados mais caros do país e uma teia de problemas judiciais, incluindo tentativas e homicídios, propriamente ditos, em minhas atividades profissionais e outros erros médicos; além da quebra de ética na medicina; problemas com à União, envolvendo sonegação fiscal; dentre inúmeros infortúnios. Mesmo assim, fui nomeado Ministro da Saúde da República Federativa do Brasil, gozando de todas as prerrogativas legais deste Estado Democrático de Direito.
Tudo aconteceu, devido ao playboy, ex-namorado de Berenice, minha mulher. Apropriando–se do status que o sobrenome tradicional ainda lhe impunha, junto a rede de influências, na qual sempre viveu, agora era um dos lobbystas mais cotados do Distrito Federal. Por seu intermédio, entrei em contato com alguns correligionários do Executivo, estabelecendo com eles, naturalmente, uma cadeia de informações e negócios obscuros aos olhos dos políticos e magistrados mais ferrenhos!
Até que consegui contactar o Presidente da República. Pessoa muito simples, porém de hábitos eruditos; dono de uma jornada política enriquecida de acontecimentos históricos, principalmente, ao que nos remete ao esquerdismo de centro, baseado na social-democracia brasileira. Um radical, considerado pelos mais conservadores; moderado aos olhos dos últimos pelegos e extremo-esquerdistas. Aliás, esses discursos demagógicos já deveriam ter se findado na virada do século. Nem minha geração viveu essas utopias. Talvez porque, ainda existam hipócritas, de base neo-marxistas, como se auto-rotula meu pai. O Brasil caminha para trás, como a condição natural do caranguejo, rumo ao atraso, condenado a terminar como um apimentado tiragosto, engolido por uma espécie mais forte: o homem!
Eu e o Presidente, acabamos por estreitar nossos laços: discutíamos sempre sobre literatura, história, pensamento econômico e futebol – cheguei a fazer uma correção a laser na face da seu... Como se trata o marido de um Chefe de Estado? Ele sempre ficava hospedado com sua comitiva nalguma das minhas mansões quando vinha a São Paulo ou Rio de Janeiro e mesmo em nossas poucas oportunidades de folga, ou eu o visitava na residência oficial; ou viajávamos juntos, etc. Numa noite, o então Ministro da Saúde faleceu subtamente. Fulminou em sua casa sem ao menos terminar à refeição. Em menos de uma hora, já se especulavam novos nomes para ocupar o cargo. Por conta, não só, da minha amizade com o Chefe da República, como à ligação estabelecida entre mim e o alto escalão do partido ao qual, eu era filiado, contando que, nossa bancada no parlamento era aliada ao governo, meu nome apareceu entre as possíveis indicações.
Minha nomeação aconteceu dias depois, causando muita repulsa social e até entre os caciques da política internacional! Já eram públicas minhas pendengas judiciais. Não extraindo a ostentação impetrada por mim e meus advogados à minha integridade profissional e pessoal.
Contanto, agora, Ministro, fiz valer de meu poder para indicar o playboy lobysta, também médico formado, Presidente do Sistema Federal de Saúde Pública, órgão fiscalizador da atuação privada quanto às concessões estatais, depois de quase totalmente terceirizada toda a mão-de-obra do Estado, quanto a prestação destes serviços à sociedade. Claro, acontecia nestes meandros, negociações exclusas, as quais, mais aumentavam o meu patrimônio.
Foi um tempo bom: status, negociatas, farsas, falsas empresas, “laranjas”,.. mas alegria de pobre nunca durou muito, como eu sempre imaginei! A oposição, logo preparou um dossiê quanto a minha gestão. E após muitos debates, tentativas frustradas de insuflar uma C.P.I (Comissão Parlamentar de Inquérito), por ordem do próprio Presidente da República, obriguei-me à demissão.
Nesta época, ressurgiram fantasmas há muito enterrados: o doutor Romareis, o Arquiteto, a perua de nariz e de seios deformados num intervenção a laser; juntando tudo isso aos esquemas de corrupção e outros processos, aos quais me envolvi.
Sorte minha, a maioria dos meus bens, há tempos tinham passado para “nomes fantasmas” e maior parte do meu capital de giro, estava aplicado fora do país em nome destes indivíduos inexistentes. Fiz, já pressagiando que o pior viesse a acontecer. Apenas Berenice sabia desses esquemas. Então, a União confiscou uma pequena parte do que eu possuía.
O cerco apertou! Neste momento, após alguns anos, fui ter com meu pai, então Senador da República, a possibilidade de fugir do Brasil. Eu tinha muitas relações no Itamaraty, nas embaixadas brasileiras pelo mundo e estrangeiras, mantidas aqui no país. Mas quem se arriscaria a me ajudar? Não havia nada que motivasse alguma outra pátria me conceder o asilo político. Papai, detinha o traquejo intelectual que me faltava e a mobilidade na comunidade internacional, levando-se em conta o imprescindível prestígio do ex-militante revolucionário, do professor, escritir, pesquisador e pensador intocável desde a década de setenta do século passado.
O velho Senador se negou à ajuda:
- Não Indivíno! Desta vez não. Hoje penso que não deveria nem tê-lo ajudado naquele caso do menino que você assassinou, friamente, quando adolescente. Desde lá, só vivi para encobrir suas atitudes inconseqüentes. Ainda assim, esperançoso que sempre seria um momento, que um dia você teria um pouco de caráter. Eu estava errado!
- Caráter, pai?!.. Você, moralizando o que? Logo alguém que também já roubou, seqüestrou e matou na juventude, vem com discursos demagógicos?!
- O que cometi no passado, é explicado em motivações político-ideolágicas.
- Pai, minha história não é muito diferente da sua! Só que minha má conduta é mais perceptível dentro dos meios institucionais. Na essência tudo é a mesma coisa!
- Meus erros são, ou não, porque sou parte de nossa História, passa bem longe do que você fez a vida toda!.. Indivíno, você tem quarenta e cinco anos! Eu com sua idade, já tinha mudado minhas convicções há tempos. Certamente, não teria cometido os mesmos atos aos quarenta e cinco. Os tempos já eram outros. Eu e meus companheiros, tínhamos ideais, queríamos derrubar um regime de base fascista, instalado no país, apoiado pela CIA. E você, o que fez? Matou, roubou, destruiu famílias, e todas as vezes que a barca virava, corria para o papai aqui. É muito triste para eu saber que meu próprio filho é um homem sem escrúpulos. Basta lembrar o que fez com sua ex-mulher e seus filhos, deixando-os quase à míngua e se “amancebando” com aquela puta!
- Você, Senador da República, sempre com esse papo de ideologia anti-estadunidense, revolução, sessenta e oito. Quem o ver assim divagando, acredita ser o último socialista!.. O senhor, caro Senador, tem razão: não pecisa me ajudar mesmo, nem é meu pai! Neste braço aqui – eu estapeava meu braço direito, lacrimejando -, neste braço corre o DNA de um bandido não é?.. O senhor já fez demais por mim. Obrigado, professor!.. E corri, ainda escutando meu pai gritar...
- Indivíno, não fale assim! Volte aqui, eu sou seu pai! Você sabe que eu sustento seus gêmios! Eu olho pelos meus netos! INDIVÍNNOÔÔ!!!... Berrava... EU TE AMO!!!
Sem a força do velho, tinha de dar um jeito de fugir, caso permanecesse aqui, há qualquer momento seria preso. Fretei um avião, para uma possível fuga ao Paraguai. De lá, usando uma identidade falsa, escolheria outro lugar para me estabelecer e chamaria Berenice a viver comigo.
Entretanto, meus planos falharam. Fui interceptado numa fazenda, minha propriedade no Mato Grosso do Sul – em nome de Berenice -, onde eu estava escondido. No momento em que entrava na aeronave à minha espera naquelas terras, a polícia me deteu.
Fiquei dois anos preso numa cadeia em regime especial: por conta do meu diploma superior. Com inúmeros habeas-corpus negados, após o primeiro julgamento, fui transferido para uma penitenciária paulista. Em São Paulo tramitava a maioria dos meus processos. Decerto, eternamente, permanecer-me-ia detido.
Com o tempo e outros julgamentos, as visitas de Berenice, tornaram-se cada vez mais raras. Até, numa ocasião, recebi o comunicado de um dos advogados, que estavam abandonando o caso, alegando o fato de eu não ter mais condições financeiras de custear seus caros honorários. Soube que Berenice entregou à polícia os meus planos de fuga e após à prisão, utilizou-se de uma procuração e de cada identidade “imaginária” minha, dando-a plenos poderes e transferiu para o seu nome, tudo o que eu havia conquistado, seja pelos meios lícitos e ilícitos: entre bens móveis, imóveis, joias, obras de arte e todo o dinheiro, claro. Ela própria dispensou o escritório de advocacia responsável pela minha defesa. Foi morar nas Antilhas com seu amante. Tudo bem, estou pobre, mas foi nela quem pensei, quando a entreguei todos estes planos, delegando tantas atribuições. Amo essa mulher!
I
As dores abdominais têm piorado dias após dia. Estou definhando com essa barriga inchada. São os aparentes sinais da doença!
A bem da verdade, parto na luz dos quase cinqüenta e seis. Como médico sei: um câncer pancreático sopra um alarde e progride, consumindo todo o meu organismo. Apesar destes anos na cadeia, continuo lendo alguns periódicos da Medicina. Há muitos anos e digo: " bem antes de minha estadia neste Monte Olímpo, a cura do câncer e AIDS já não se segreda".
Entrementes, levantaram-se as cortinas e deixei que espetáculo evoluisse à uma bela tragédia, enquanto aqui, resignado em mim, saboreio os meus podres dentes, gastos pelo tempo e o devido desleixo no de trato da arcada. Agonizo em paz e na paz com o presente da ignorância ao ter, muitos anos atrás, rejeitado parte do legado adquirido nos tempos de universidade, quando, pela primeira vez à pancreatite me deu a nota de sua música. Doença, a qual afetou-me por volta dos trinta e cinco. Era essencial, naquele momento parar com o uso do álcool e tudo o que viesse a afetar o que me sobrou do pâncreas. Como reletado em minha indivína biografia, os fatos não se sucederam assim.
Há cerca de dois anos, após me instalar na cela do Marcelo, parei com as balas, o crack e o pó – ele é totalmente “careta” e apesar de se tratarem de drogas legalizadas, ele não admite algum uso onde passamos grande parte de nosso tempo dormindo, lendo ou namorando. Nunca consegui largar as bebidas alcóolicas e o tabagismo. Entre os pátios do presídio, ainda fumava um baseadinho aqui e ali. Uma atitude tão ultrapassada e antiga que maconha, hoje mal se tem. Difícil de encontrar e quando “rola”, os “coroas”,tem mesmo de “bolar!”
Nestes últimos momentos, mal consigo ingerir meu alimento; mal tenho a sensação de defecar e se me aventuro a transar, não consigo ejacular. Fui liberado dos meus préstimos à enfermaria e os outros presos já não têm requisitado os meus serviços clínicos informais.
EU VEJO MEU PAI, IDOSO, DE TÃO VELHO, DECRÉPITO, LEPROSO, APONTANDO-ME, BRADANDO, BERRANDO: -“É O CAPETA!”.. E FLAGRO MARCELO EM DESESPERO, NUM REPENTE:-“INDIVÍNO, ACALME-SE, NÃO SE VÁ!”.. MEU FILHO SURGE, FINALMENTE COM SUA GAROTINHA NO COLO, UMA MENININHA MAL EDUCADA, BERRANDO DESCONTROLADA, DIZENDO QUE ME ODEIA. MEU FILHO RI MUITO, CAÇOANDO-ME NESTE DEPLORÁVEL MOMENTO:-“VOCÊ É MUITO BIZARRO, PAI”... AÍ UMA FEBRE ALTÍSSIMA, DENOTANDO O APOGEU DA GUERRA E OS GENERAIS INIMIGOS JÁ SE POSTAM À MINHA ESPERA! FAZ-ME OSCILAR EM UM BRUTAL CALOR E UM INTENSO FRIO DO QUADRO INFECCIOSO, NO MESMO INSTANTE EM QUE MARCELO ME GRITA CHOROSO:-“AMOR!”
SINTO À ESCURIDÃO, APAGANDO OS MEUS OLHOS. O MUNDO ME APARECE E SOME, REPENTINAMENTE – VOU ME ENTREGAR. NÃO VALE SE CANSAR NESSA BATALHA ONDE JÁ SE SABE DOS VENCEDORES DESDE O ASSENTAMENTO. Eu, às vezes acordava daquele apagamento insone e me via jovem, ainda nos tempos de estudante, nervoso, fazendo-me uma massagem cardícaca, não me deixando seguir. Mas se Deus existe, de fato, ele não é médico! Eu me enxergava ali, naquele presídio sujo, ainda com uns vinte poucos, tentando me socorrer. Eu, justamente eu, que nunca tive lá muita paciência em salvar vidas quando rapaz, e se numa cadeia! Mas estava ali, sem algum recurso instrumental que não o técnico-intelecutal, me fazendo uma massagem a não deixar, meu músculo maior parar.
Deitado, permaneço onde estava na mesma cela. A cama também é a mesma, e na mesma horizontal, entretanto agora, fazendo de meu travesseiro, o colo de uma “gazela”. Acima daquelas macias pernas, vejo minha mãe, linda como em seus tempos joviais! Ela me acaricia os cabelos grisalhos, no hébrio duma gargalhada sem controle. À porta do recinto, toma-me de susto Van Dame – garoto, cujo matei há uns quarenta anos numa briga de rua. Ele parece ansioso, caminhando de um lado para outro, afirmando:-“ Tá limpo, tá limpo, tá limpo, vamos”!
Meu pai, o Bandido Louco, aparece-me ajoelhado sobre à cama onde permeço sem força alguma, afirmando está tudo pronto para a minha fuga. Doutor Romareis é outra figura assustadora naquele estranho momento: bem alinhado, com terno e pasta executiva, transmite um sensível nervosismo enquanto o eterno “Van”, ainda em estado emocional bem alterado, à porta, bem posicionado, olhando os dois lados do corredor exterior à cela, initerruptamente repetindo: -“Tá limpo, tá limpo, tá limpo”... Mamãe rindo e me acariciando ao seu colo... Travo o caminhar de Romareis ao perguntá-lo... Ressalvo que, pergunta feita com imensurável dificuldade, sobre como encara o infeliz destino que lhe propus. Como enxerga àquela trágica operação que lhe fiz? Sobretudo, o meu ex-amigo e vítima, com a frieza e o traquejo retórico dos advogados, interrompe os seus passos bem audíveis e diz:
- NÃO HÁ JUÍZO SEM DEFESA, DOUTOR!.. ALMEJO O PRESTÍGIO.
- TÁ LIMPO, TÁ LIMPO, TÁ LIMPO, TÁ LIMPO, TÁ LIMPO, TÁ LIMPO... REPETE VAN, SEMPRE OLHANDO À TRANCA DA CELA E SEUS LADOS.
- HA, HA, HA, HA,HA, HA, HA, HA, HA, HA, HA, HA,HA, HA, HA, HA, HA, HA, HA, HA, HA, HA, HA, HA .. MÃMÃE E SEU SENSO...
- “VAMO” SE “ARRANCÁ”?.. SUGERE O BANDIDO LOUCO, ALISANDO O MEU ROSTO.