Não espere por mim
Ele partiu sem dizer uma palavra. Não fez qualquer discurso de despedida. Somente se foi. E as palavras que guardei não foram as melhores. O tempo certamente se encarregará de apagá-las da minha mente. Mas para além de qualquer coisa dita, o que restou em mim foram sensações e lembranças. Não um diálogo entre pessoas, nada inteligível. Abandonamos de vez a verborragia.
O que nos restava era uma outra espécie de ligação, que dependia da existência de outros sentidos, eramos irmãos de alma, sabíamos o que era amizade. E quando estávamos abatidos, cheios de angústias existenciais, sentávamos em um bar barato, pedíamos algumas cervejas e sorríamos. É quando penso que o sol poente é uma figura linda, quando estamos com alguém que gostamos.
Quase nunca falávamos sobre o futuro, para isso existe as cartomantes, búzios e as cartas. Apenas dois caras, algumas notas do bolso e risadas. As amizades surgem de onde não esperamos, quando forçamos esta ligação, ela simplesmente não existe. Nos conhecemos em um ônibus, rumo ao centro da cidade, daqueles que possuem ar-condicionado e paradoxalmente as poltronas são desconfortáveis demais para uma viajem simples.
Não que eu tenha perdido o rumo desta história, apenas me perdi em meio as lembranças. Este é o problema da linguagem, quase sempre nos confunde. E a memória sempre está inventando coisas que nunca aconteceram. Apensar disto, sem me ater as palavras e as lembranças, ainda tenho algo dentro de mim, algo significativo. É uma coisa que faz nossa amizade condensar num estado de permanência, ter valor mesmo agora.
Sim ele partiu sem dizer uma palavra. Mas os muitos dizeres nunca foi o nosso forte. Acho que foi melhor assim, me pergunto para onde ele foi, ao menos poderia ter dito. Só que agora isso não faz sentido. Sentado em frente a lápide dele, tomando algumas cervejas e relembrando certas coisas, isso ainda me faz sorrir.