Não se deixe levar
Um pobre rapaz adotado por uma família que tinha dois filhos legítimos, a quem davam todo o carinho e atenção, e ao pobre menino adotado entregavam tarefas e obrigações.
Naquele ano o baile teria uma motivação extra, além de cumprir uma tradição, que se repetia a todo final de cada período, era chegado o momento de a princesa escolher o varão que a levaria ao altar.
Toda a elite, príncipes de reinos vizinhos, nobreza e privilegiados, passaram a se aprumar, para tomar daquela donzela o coração, e o trono em questão.
Cortando lenha, e cumprindo todos os deveres que cabem aos menos afortunados, o pobre rapaz adotado sonhava em dançar uma valsa de Strauss, levando nos braços a herdeira tão cobiçada e linda.
Sonhos e lamentações se confundiam, pois não era dado a pobres homens o direito de pleitear a formosa dama... mas fadas existem, e foi sonhando que ele viu se aproximar um velho, de feições bondosas e cheio de caridade para distribuir.
-O que o faz tão triste, menino? Perguntou o desconhecido ancião
-Eu gostaria tanto de participar do baile, tenho até sonhado em dançar com a princesa.
-O seu desejo será realizado, terá roupas e um convite para entrar na festa, mas você deve conter os seus impulsos: não seja autoritário antes de lançar mão da coroa, a ser dada como prenda, e evite ostentações, nunca revele as quantias que você ganhou, transportando pessoas da corte, que não justificavam o transporte. Esteja sempre atento ao relógio, agora, mais que nunca, você deve saber a hora.
O baile foi inesquecível, onde um garboso rapaz monopolizou a atenção de todos, particularmente da princesa, também louca para sentar no trono.
-Bela senhora, eu trabalho como um escravo, mas consegui acumular moedas suficientes para dar tudo que minha princesa pedir; conduzi tantas pessoas pelo mundo afora, tantas vezes fui, por isso, agraciado, que tenho o bastante para atender a todos seus desejos.
O pobre, mas não tão pobre rapaz, percebeu que a princesa estava se deixando envolver pela sua história, percebia-se, claramente, que ela lhe entregaria o coração, e isso deixava claro que era chegado a hora dele partir... a hora era aquela hora, e ele deixou o baile correndo, para a surpresa de todos, mas deixou cair nas escadarias a sua gravata, tirada para permitir velocidades maiores, livre da respiração ofegante.
Desolada, e preocupada com a fortuna que estava perdendo; fortuna acumulada por um homem que transportava pessoas... a princesa segurou aquela gravata, e jurou encontrar o seu dono, ainda que tivesse que experimentar em todos os pescoços do reino.
Tarefa árdua e interminável, pois aquela donzela nunca poderia supor que em seu reino houvesse tantas pessoas que acumulavam tesouros transportando outras pessoas, e estarrecida ela percebeu que o nó daquela gravata cabia no pescoço de todos os homens da corte, e que aquele nó da gravata poderia, tranquilamente, e sem ser injusto, ser o nó da forca.