O último adeus

Era véspera de natal. O céu no bairro onde eu e minha família contemplávamos a virada do natal parecia mais dia do que noite, de tantos fogos estourados que enfeitavam os céus da cidade.

O entusiasmo tomava conta de todos nós e o céu não parava de receber brilhos, por mais que já estivesse bem iluminado com as próprias belezas naturais da noite de calor que fazia naquela virada.

Os poucos segundos que faltavam para o natal, as pessoas da rua começavam a se abraçar e aquilo contagiava a redondeza. Nossa família era a única que não participava, afinal, não esperávamos que aquele natal pudesse ser do jeito que veio a nos surpreender.

Tímidos pelas vestes que estávamos, apenas acenávamos com a mão, acompanhado de um sorriso para uma grande vizinha. Vizinha amada, que por idiotice humana, jamais pensávamos que aquele natal seria o nosso último ano!

Ela, lá do portão da sua casa, esbanjada ao mesmo sorriso, nos correspondia. Afinal, dali a alguns instantes, tudo voltaria como era antes e amanhã poderíamos conversar melhor... Já que a poucas horas, a maior parte da minha família precisaria pegar no batente, indo ao trabalho. Enfim, estávamos apenas esperando os fogos pararem de esbranquejar o céu para que pudéssemos pegar no sono.

Ciente daquela decisão, não nos importamos de pelo menos dar um abraço naquela velha amiga, agradecendo-a por mais um ano de estarmos juntos. Já que ela e toda sua família sempre fizeram parte de nossas vidas.

Os fogos cessaram. E o momento em que a maior parte da minha família aguardava, chegou. Entramos para dentro de casa, fechamos à porta, logo indo para a cama, arrancando profundos suspiros de sono que já contagiava a família.

Porém, o tempo passou, mas o dia ainda trazia as primeiras horas do dia vinte e cinco de dezembro. Algo que numa distante batida de palmas, fui o primeiro a ouvir, parecia vir do portão. Acostumados com certos babacas, que não davam conta de dois ou mais copos de bebida alcoólica num único dia, não dei muita importância ao chamado. Pensei que fosse um deles. Pensei errado.

Eram três horas e cinquenta e três minutos daquele dia, por incrível que pareça era um dos filhos da tal vizinha.

Foi a minha mãe que o atendeu primeiro. Ao som baixo eles iniciavam a conversa. Tom que logo era aumentado. Um susto logo tomava conta da minha mãe. Algo que nos contagiava de vez. Pois, aquela nossa vizinha que a gente apenas na virada do natal, a cumprimentou com um aceno de mãos acompanhado de um sorriso, partiu a poucas horas desse mundo.

O recado foi momentâneo. Mas a saudade foi implacável. A partida, sem ao menos ter-lhe dado um abraço a poucas horas, ficou na história. Uma história acompanhada de remorso. O por que, não sabemos de que aquele era o nosso último adeus? O por que, de não sermos avisados de que ali seria a nossa despedida eterna?

O nosso plano de nos encontrarmos no dia seguinte com mais tempo, ficou e ficou de vez na história. Do que restou do nosso plano, foi de realmente no dia seguinte, velarmos o corpo dela, numa ferida profunda junto a sua família.

No lugar do abraço. Um aperto de mãos sobre as mãos geladas dela, conscientizados de que realmente perdemos de vez uma grande amiga! Uma grande oportunidade que sempre nos fará falta. Ainda mais pela falta daquele abraço que até hoje sinto.

Os dias estão passando. E nunca mais vou poder ver esse dia retornar, para corrigir o erro cometido. Mas essa grande vizinha me ensinou uma grande coisa... Nunca deixarmos de abraçarmos ou demonstrarmos a alguém numa data na qual sabe-se lá Deus, quando é que a teremos de volta. A vida é uma caixa de surpresa; pronta pra se abrir e no momento em que vier a se abrir, nunca saberemos da maneira que ela nos surpreenderá... Seja com coisas boas ou coisas más!

Viva o hoje! Nunca pensando no amanhã! Mas sempre pensando em fazer o melhor, porque, se o amanhã existir, que não seja um amanhecer de remorso, mas sim, do quanto valeu a pena amar com o coração, aquilo que a vida na simplicidade veio nos dar...