O Devoto e o Profano
Capítulo 2 - O Protesto
Capítulo 2 - O Protesto
- Eu protesto! – Grita o homem caindo de bêbado com suas roupas amarrotadas. A igreja fica em silêncio até Pedro falar:
- Ora, protesta o que home? Esse casamento já foi pro brejo! – Diz debochado.
- Acho que perdi a hora – Diz o homem olhando para o relógio.
- Ora vejam só – Pedro diz observando o homem na porta da igreja – É o dotô que me disse as coisa. Como vai dotô?
- Manuel? – Diz Maria sorrindo pela primeira vez olhando para o homem na porta – O que faz aqui?
- Maria – Ele responde se esforçando para manter-se de pé – eu não suportaria ver você se casar com outro sujeito, eu seria infeliz para sempre! Estava num bar tentando esquecer o que estava acontecendo, mas não consegui e vim atrás de você. Eu lhe amo, Maria!
- Eu também lhe amo Manuel! – Ela responde derretida de emoção – Eu sabia que você viria!
- Ora! Mas o que está acontecendo aqui? – Questiona o prefeito desnorteado.
- Eu que pergunto! – Diz João desesperado sem acreditar no que estava acontecendo.
- Eu vou lhes dizer o que está havendo! – Diz o padre Teodoro em fúria – É tudo culpa deste homem! – Aponta para Pedro – Este homem está possuído pelo demônio! Está domado pelo tinhoso! – E levanta um crucifixo na frente de Pedro – Saia dai sua besta! Saia dai chifrudo!
- Acho que o sinhô está cometendo um erro. O único chifrudo nesta igreja é aquele sinhô ali – Aponta para João. E a igreja tumultuava.
- Mas o que o senhor quer afinal? Destruir a casa do Senhor? – Indaga o padre aos nervos.
- Ó céus! Explique pra ele dotô! – Pede Pedro.
- Por favor! Quem daria ouvidos a um bêbado como esse? – O padre já se defende.
- Mas olhe só quem está falanu. – Pedro continua debochado – Se não é o sinhô que toda santa noite fica ali atrás, nos fundo da igreja, enchenu a cara de vinha junto de Tobias.
- Ora! Que mentira absurda! – Responde o padre envergonhado.
- Mentira nada! – Continua – O sinhô nem se qué se lembra de mim?
- Do que está falando? – Pergunta o padre suando frio.
- Ora, depois da morte de minha mainha, eu sempre vinha na igreja rezá pra ela. Chegava aqui sempre a noite, justo na hora que ela morreu. Pobre mainha, morreu tão jovem e cheia de idade... – Pedro faz uma pausa suspirando.
- Ora, continue homem! – Grita o prefeito do outro lado.
- Pois então, toda noite eu vinha rezá pra minha mainha e toda vez escutava uns riso vindo de trás do altar. No dia que eu resolvi vê o que era, nu é que dei de cara com padre Teodoro e Tobias se arrastando de tanto vinho tomado? Tinha garrafa vazia pra tudo que é canto! Seu padre alegre como nunca vi em minha vida de início me confundiu com Jesus, começo a se redimir e pedi desculpas, mas logo viu que era eu e até me chamô pra me juntar a eles. Eu nu queria, porque sô um home de respeito, mas como também nu sô bobo, aproveitei! – Ele ri – Ai vixe! É toda noite que nós bebe vinha da igreja até amanhece. Padre Teodoro de tão ruim nem se lembra de mim notro dia.
O padre não se aguentava de tanta vergonha e Manuel ainda ressalta:
- Agora já sabemos pra onde vai todo dinheiro do dízimo desta igreja.
- Pois é – Acrescenta Pedro – A igreja tá caindo aos pedaço porque o padre só investe o dinheiro ne vinho! – Diz ele irônico como de costume.
- Com ou sem Deus, eu que não contribuo mais com essa igreja! – Declara o prefeito.
Alarmado com a situação, padre Teodoro grita furioso calando a todos:
- Já chega! Calem-se, por favor! Eu vim aqui celebrar um casamento e é isso que vou fazer!
- Ora! – Diz Maria correndo para perto de Manuel – Então case nós dois!
- O quê? Isso é humilhação demais para mim! – Exclama João indignado.
- Ora home, respeite a escolha da moça! – Comenta Pedro.
- Ora seu... – E João avança violentamente para cima de Pedro e toda a igreja se tumultua de novo.
- Chega! – Grita o padre mais uma vez! – Todos assentados! – E todos se sentam acatando o padre já fora de sua lógica – O casamento já vai começar! Que venham os dois para cá! – João se levanta, mas o padre o interrompe – O senhor não, fique ai. Maria e Manuel venham! – E João se senta decepcionado enquanto Maria, alegre, segue ao altar de braços dados a Manuel ainda sem jeito e confuso pela bebida e pelo momento.
E o padre dá inicio a celebração mais um vez:
- Se houver alguém que se oponha a essa união, manifeste-se agora ou cale-se para sempre!
- Eu aqui! – Grita João em desespero – Você não pode fazer isso comigo Maria!
- Alguém mais além de João – Insiste o padre ignorando o noivo abandonado, mas ninguém mais se manifesta. O padre, então, com sua bíblia em mãos inicia a benção apressado e pulando linhas:
- O senhor e a senhorita se aceitam como marido e mulher... Hum... Prometem se amar na saúde e na riqueza... E hum... Na pobreza... Hum... E... Felizes para sempre... Hum... É... É isso! E eu vos declaro marido e mulher! E seja o que Deus quiser!
O padre sai do altar apressado e logo Manuel e Maria se beijam com uma salva de aplausos incompreendida por João e pelo prefeito.
- Até que enfim! – Diz Pedro se levantando – Agora podemu í pra festa!
- E quem disse que o senhor foi convidado? – O prefeito retruca com frieza.
- Ora, mas a festa não era pra todos?
- Mas é claro que não! A festa era só para alguns poucos convidados.
- Ora, então isso tudo pra nada? – Pedro conclui desapontado recebendo olhares ferozes do prefeito e de João.
E os recém-casados se põem a caminhar em direção a saída da igreja e, logo atrás deles, a multidão que presenciara aquela cerimônia fora do comum. Manuel, então, passa ao lado de Pedro e o aconselha:
- Obrigado por tudo Pedro, mas vou lhe dizer uma coisa. Certas coisas nesta vida estão melhores guardadas só para nós mesmos.