Tatá na Jaguaribe 8
Tatá chega na porta do quarto do Sr. Benito. Duas da tarde, os pacientes estavam dormindo com a TV ligada baixinho. Aproxima da cama do avô, que abre os olhos. Num sorriso recebe a neta.
Da cadeira era difícil dar lhe um beijo na face. Para não o desacomodar, Tatá pegou a mão direita do avô, beijando-a, acarinhando suavemente, perguntando como ele estava naquela manhã.
Para o pássaro que voa, somente a sombra dele não participa da viagem, que fica no chão. Tatá recebeu a graça de voar como pássaro sobre os problemas que a limitação do movimento do corpo a impunha. Da breve confusão na chegada, não a impediu de passar para o estado de felicidade, quando avistou o avô no quarto.
Momento como aquele era único, quando Sr. Benito olhava dentro dos seus olhos, desde sempre, era enxergada enquanto alma, sentia o afeto que transpunha a relação de consanguinidade que tinha com ele. Era tão intima a relação, que soava serem conhecidos há muito, desde a eternidade.
Segurando a mão da neta, e olhando dentro de seus olhos, o avô falou:
___ Minha neta querida! Eu amo a vida! Amo viver! Quero realizar mais um pouco aqui. Estou muito doente, sei disso, mas não quero ir embora agora!
A neta empurrou um pouco mais a cadeira de rodas para ter a oportunidade de colocar uma das mãos no tórax, na altura do coração do avô. E conseguiu. Com a mão em contato, falou carinhosamente:
__ Aquele que bate, a porta se abre, o que busca, encontra. Não falou o Mestre? Fala! Vovô Benito! Fala para Deus que quer viver! Ele está no seu coração!
Vovô chorou muito. Pediu para que Tatá o acompanhasse numa oração. Antes, quis ir ao banheiro.
Como estava inchado! O abdomem, estendido, com respiração ofegante, os pés, calçados com alpargatas no número três vezes maior que o de costume, dirigiu até ao banheiro do quarto. Os ombros e braços, haviam perdido a estética antiga, os músculos que foram adornados nos anos do ofício de Oleiro.
Era um homem completo, inteligente na arte de criar peças com argila. Tinha a agudez mental para refazer peças que não davam certo de amigos. Tornava-as novas, como se não tivessem sido defeituosas.
Retornou, fez uma breve oração com a neta, pediu melhoras a Deus, vida, uma chance de sair daquela situação.
Terminam a oração, abrem os olhos, veem os médicos da equipe entrando, residentes, e outro que indicava ser o professor do curso de medicina da especialidade do coração.
O quarto ficou repleto, a solenidade, o respeito com que tratavam os pacientes. Tatá passou assistir uma verdadeira aula prática do curso. Enquanto um dos cardiologista narrava a minuta, o histórico, de paciente a paciente, os residentes, em semi círculo no leito, ouviam o professor dialogar com a equipe sobre a vida pregressa dos doentes, prognósticos e diagnósticos possíveis para o tratamento.
Momento sacro, muita inteligência e conhecimento envolvidos no diálogo, tudo em prol da vida do ser humano.
Realizavam a visita com esmero, estampando amor na profissão que escolheram. Tocavam o paciente, auscultavam –os pelas mãos, tentando senti-los pelas vibração das veias, no pescoço, abdome e pernas.
Chegando no Sr. Benito, depois de uma breve discussão, aventaram a possibilidade da realização de exames nos rins e pulmão, não estava descartada a Hemodiálise.