Os sonhos
Já era tarde demais. O silêncio da madrugada era como música para seus ouvidos. O cansaço da jornada dupla pesava-lhe as pálpebras e por duas vezes se perdeu na oração recitada de forma automática. Logo mais adentraria um mundo mágico. Acontecimentos inusitados, lugares imaginários e gente as vezes conhecida.
Pessoas com roupas antigas passavam numa rua onde se via olhando pela janela... logo depois viu o ambiente do escritório com seus sons peculiares. Na sequência, o sorriso pueril da sobrinha que lhe fazia sorrir também... Cenas que passavam tão rapidamente que mal podiam ser gravadas na sua memória.
Abriu os olhos para afastar aqueles devaneios, apagou o abajur e se virou buscando uma posição melhor.
Subitamente o despertador tocou e então recordou do último sonho que tivera: Um abraço demorado em alguém do seu passado. Podia sentir as mãos mornas e macias nos seus cabelos. Balançou a cabeça num movimento como se quisesse afastar essas lembranças para bem longe.
Lavou o rosto, coou o café e percebeu que as horas já corriam apressadas.
Acordara para o sonho da vida, onde tudo fazia mais sentido. Tomou o ônibus e foi fazendo as contas de quanto faltaria para comprar seu primeiro carro. Lembrou com alívio que aquele mês era finalmente o da última prestação do celular e rascunhou num pedaço de papel os itens que compraria para a casa nova, recém financiada após tantas economias canalizadas para a entrada do pagamento. Tantas coisas para organizar até o dia do casamento...
Nesse instante, um menino entrou no ônibus com um tabuleiro e ofereceu seu produto aos passageiros. Veio na sua direção e lhe mostrou aqueles tradicionais biscoitos fritos envoltos em canela com açúcar.
- Compre um para me ajudar?!
Com um sorriso curto agradeceu e informou que não apreciava muito os sonhos.
Cláudia Machado
Nota: Em Minas Gerais é tradicional o biscoito frito, envolto na mistura de açúcar e canela, o qual chamamos Sonho.