Um pouco sobre mim
- Me fale sobre as mulheres que você teve antes de mim. – Maria disse, enquanto secava o cabelo diante do espelho.
- Mulheres em geral? Ou as que realmente importaram. – Respondi depois de pensar um pouco sobre a pergunta.
- As que realmente importaram.
- O que você quer saber sobre elas?
- Ah. Você pode começar falando sobre o que eu tenho de diferente delas.
- São pessoas completamente diferentes. Mais fácil falar sobre o que tem em comum.
- E o que seria isso?
- Todas escondiam alguma coisa.
- Como assim? O que você acha que eu escondo?
- Vou começar por elas, ok? Depois falo sobre você.
- Tá certo. – Ela respondeu contrariada.
- Bem. A primeira, L... Escondia um terrível medo de ficar sozinha. Não digo sozinha num ambiente... mas sem ter alguém que realmente a entendesse e quisesse ficar com ela.
- E como ela está agora?
- Sinceramente eu não sei. Da última vez que a vi, ela não estava muito satisfeita com o sexo masculino.
- E as outras?
- K... Ela escondia o próprio egoísmo. Acho que ela era incapaz de colocar qualquer pessoa ou relacionamento à frente do próprio desejo. Não haveria nada de errado com isso, caso ela fosse sincera sobre essa postura. Mas sobre isso, ela era incapaz de ser sincera.
- E você a amava?
- Por muito tempo achei que ela havia sido o amor da minha vida.
- E agora?
- Acho que ainda tenho muita vida pela frente pra chegar a essa conclusão.
Maria largou o secador de cabelos na pia, foi até a janela e acendeu um cigarro.
- Pode continuar.
- Depois de K, veio outra que eu sequer gosto de pronunciar o nome. Essa escondia algo podre dentro de si. Era um sepulcro caiado, como diz a bíblia. Matheus 23:27, se não estou enganado.
- Não sabia que você era religioso.
- Não sou. Mas ouvi essa frase de alguém e ela ficou na minha cabeça.
- Ah sim.
- Voltando ao sepulcros caiados. Eles são bonitos por fora, mas por dentro escondem podridão e imundice. Como era o caso dela. Diferentemente de K. ela não tinha remorso algum pelo sofrimento que causou. Ter conhecido essa mulher talvez tenha sido a maior tragédia da minha vida. Acho que todo mundo tem alguém assim no passado. Ela com certeza é a pior história que eu teria para contar.
- E você realmente a amou?
- Sim. Genuinamente.
- E se arrepende disso?
- As vezes. Mas esse é o meu jeito. Tenho o hábito de apostar no cavalo errado.
- Tem mais alguma outra?
- Não.
- E o que tem pra falar sobre mim?
Me levantei da cama e fui até a geladeira na cozinha. Voltei com uma lata de cerveja e parei perto de Maria, que ainda fumava o seu cigarro mentolado na janela. Era um fim de tarde de domingo. Ventava bastante, mas apesar disso, fazia calor. Ela estava apenas de calcinha, com os cabelos esvoaçando na janela. Dava pra ver em seus olhos toda a curiosidade sobre o que eu tinha a dizer. Era clara a sua ansiedade para saber o que eu pensava.
- É engraçado, mas percebi isso em você na primeira vez que te vi.
- É sou tão transparente assim?
- Acho que não.
- O que é então? – perguntou contrariada.
Maria não gostava de mistérios. Gostava sempre de estar às claras e de saber onde estava pisando. Frequentemente eu me divertia com sua curiosidade. Mas dessa vez não seria o caso.
- Acho que você tenta esconder dos outros a própria felicidade. Quando você está com alguém, você tem medo de mostrar o quanto aquela pessoa lhe faz bem. Por isso esse seu tom sempre sério, sóbrio, quase mórbido. Você tem medo que vejam que o sente. Por que se souberem, eventualmente vão estragar tudo.
Maria apagou o cigarro e pegou a lata de cerveja da minha mão. Tomou um gole e ficou me olhando, e nesse momento eu vi uma tempestade se formando em seus olhos, como se eles estivessem prestes a me engolir. Mas ela não disse nada até que tivesse esvaziado a lata.
- Eu não vou dizer se você está certo ou errado sobre isso. Mas foi bom ficar sabendo o que você pensa sobre mim.
- Tudo bem, Maria. Mas não seria um espanto para mim se eu estivesse errado.
- E se você tiver certo, o que você acha que isso significaria?
- Significaria que enquanto você estiver calada sobre o que sente, tudo está certo entre nós, e eu não preciso me preocupar.
Maria riu e mordeu os lábios.
- Esse teu jeito assustado é tão fofo. É quase sexy pra falar a verdade. É como se você tivesse quase certeza que algo vai dar errado entre nós, e por isso dá tanta importância ao simples fato de eu estar aqui.
- Estranho você gostar disso.
- Pode ser. Mas talvez seja justamente por isso que eu esteja aqui.
Ela deixou a lata vazia encostada na janela, se deixou cair de costas na cama e me puxou pelo braço pra o seu lado.
Me deitei com a cabeça escorada em seu braço e escondi meu rosto entre o seu seio e minha cama.
Pensei que ali, eu poderia esquecer do mundo e das pessoas do lado de fora...
e de todas as coisas que eu ainda não havia feito
e que precisava fazer.
Mas Maria entranhou os dedos em meus cabelos e me puxou para cima de seu corpo, me trazendo de volta a realidade.
Ela estava sorriu lascivamente para mim e eu pude me ver refletido em seus olhos,
até que finalmente ela me colocou para dentro de si
e eu percebi que chovia lá fora.