Sonho de amor
A turma se dirige para a escadaria de mármore. Passos mais ou menos apressados ecoam nos degraus que levam ao térreo. Já passa de meio-dia. Descubro Alexandre no patamar central, procurando não atrapalhar os que descem. Vejo-o e pressinto. Lentamente, ele vai vencendo os últimos degraus; pára junto à porta da rua. Volta-se para mim, numa rápida mirada. Tenho um estremecimento. Em vez de seguir em sua direção, um impulso me leva a cortar à esquerda. Entro na biblioteca. Na verdade, estou precisando de um livro. A funcionária vai procurar no fichário. Dou-me conta de que talvez eu não deva, ou não possa, desperdiçar tanto tempo. Daí a pouco, não o encontrarei mais. Dirijo meu olhar para a rua: através dos vidros, observo-o atravessando a pracinha da faculdade. Quero sair correndo, não consigo. Quando, enfim, me desvencilho da moça, ele já vai longe. Uma vontade de morrer me aperta o peito.
Eu estava, naquela época, com dezessete anos. Caía de paixão pelo colega moreno, bonito, que chamava a atenção das meninas. Era jogador de tênis; no curso, tirava ótimas notas. Eu contemplava de esguelha aquele sonho impossível. Percebia que não poucas vezes seu olhar fixava-se em mim. As coisas aconteciam de longe, sem palavras. Mesmo porque, quando se aproximava de meu grupo, eu perdia a fala. Um dia, uma colega já madura reparou:
- Nosso amigo não tira os olhos daqui.
Virei-me e lá estavam seus olhos negros, agudos. Agora tinha certeza, não se tratava de mera impressão. Alexandre notara minha presença! Indescritível o que eu sentia. Ao mesmo tempo, ele me deslumbrava - quando chegava em casa, depois das aulas, fechava os olhos para vê-lo, e revê-lo, nos menores gestos, nos mínimos detalhes - e me confundia. Era muito encantamento para uma alemãzinha praticamente vinda da roça. Meu primeiro ano de faculdade oscilava, assim, entre o êxtase e o sofrimento.
O dia seguinte custa a chegar. Procuro caprichar, não descuido do batom. Sinto dificuldade para acompanhar as aulas. Nos intervalos, fico mais ou menos quieta no meu lugar. Quero que tudo se desenrole como na véspera. Não posso jogar fora uma nova oportunidade. Meu coração bate forte só em pensar na hipótese de caminhar a seu lado. Juntos atravessaremos a pracinha e seguiremos no rumo do centro. Esperar custa-me muito. Quando, por fim, o professor se despede, arrumo devagar as minhas coisas. Repete-se a situação do dia anterior. Alexandre desce a escada com calma, vira-se para trás e olha-me significativamente. Todo o meu ser se agita. Estou nos últimos degraus, a não muitos passos dele. Nesse instante, a moça da biblioteca me ataca:
- Já tenho o livro que tu me pediste.
Balbucio:
- Estou com pressa. Pego depois.
Retruca, sem perceber o meu drama:
- Chega aqui, é bem rápido.
Deixo-me arrastar até a biblioteca, certa de que ponho tudo a perder. Por menos tempo que eu leve, meu sumiço, nesse momento, poderá ser fatal. Quando consigo livrar-me, não há mais sinal do meu colega. Chego à porta num átimo e ainda o avisto, em companhia de outros. Já não o posso alcançar.
Estamos nos últimos dias do ano letivo. Quase não o vejo; ambos, devido ao bom desempenho, ficamos livres dos exames. Deixo que as coisas se arranjem para o ano seguinte. Depois de umas longas férias, em que tomamos rumos diferentes, março chega promissor. Eu o aguardo, dia após dia, na sala de aula. Alguém me informa que trancou a matrícula, está fazendo o NPOR. O curso, para mim, já não é mais o mesmo.
Reencontramo-nos um ano depois. Um olhar, um sorriso, um "oi" pelos corredores da faculdade. O encanto está desfeito. Dizem que tem uma namorada muito bonita.