Simone

Em uma fria manhã de outono, quando folhas amarelas dançam livremente pelo ar, Simone caminhava lentamente entre as árvores do bosque na propriedade do seu avô, pai de sua mãe, o velho Zeque.

Em busca de respostas para perguntas nunca ditas, a doce menina contemplava a natureza, aproveitando o início do dia. Aquele lugar transmitia à sua alma uma tranquilidade tumular, era quase possível ouvir o fluxo da magia que corria por cada raiz dos altíssimos pinheiros centenários plantados por seus antepassados.

A propriedade do velho Zeque era um santuário natural que contrastava com a imponente mansão que quebrava a singeleza das rústicas montanhas ao fundo do vale. Era como um quadro naturalista que tinha, em seu centro, um elemento cubista dada a desarmonia provocada pela Casa Bela, de Zeque. A mansão era um sonho concreto de sua avó, já falecida, Cassandra.

A menina Simone lembrava vagamente da construção, quando, na infância, veio com seus pais para conhecer o novo empreendimento da família. Com 6 anos, a neta de Zeque era como qualquer criança de sua idade, curiosa e ruidosa.

Em uma de suas aventuras pueris, Simone encarnou uma detetive, saindo a vasculhar cada espaço da construção. Correu e correu, até dar em uma sala incomum da casa. A menina se deu ao encanto de um sussurro como brisa, leve, plácida. A voz do vento a chamava para perto, perto da porta talhada na madeira de um carvalho milenar que o avô arrebatara por alguns milhares em um leilão.

Simone fitava a porta com seus olhos castanhos-claro, aproximando-se lentamente, o que fazia ranger o assoalho. O que tanto chamara a atenção naquela porta? Estendendo a mão para tocar na maçaneta dourada que se destacava dos tons marrons-escuro da madeira, o velho Zeque apareceu repentinamente, tirando-a do transe. A repreendeu docilmente para que evitasse andar nos cômodos sem supervisão do mestre de obras.

Ali, sentada sobre a relva verde do bosque, Simone ouvia o correr do riacho no lado nordeste da propriedade, o vento soprava uma leve brisa, e o seu convite continuara a ser o do passado, conhecer o outro lado da porta. Adulta, madura, consciente, Simone lembrou da voz do vento. Por quê? Ela se perguntara. O que ver por trás da porta? O vento se continha no convite e apenas o burburinho da água continuava a ser ouvido. A menina respirou profundamente e tomou a decisão, olhar por trás da porta.

Após voltar à Casa Bela, Simone pediu para que os empregados não fizessem seu avô saber do passeio matinal. A menina correu pelos vãos de escadas até chegar ao velho sótão, que naquele instante se transformara em uma espécie de depósito de antiguidades sem serventia à decoração da mansão.

Torcendo levemente a maçaneta do cômodo, a menina deu passos temerosos, tantos que suas mãos tremiam levemente e a testa deixava correr um fina gota de suor. A adrenalina daquela descoberta fazia com que o coração pulasse em seu peito.

Frente a frente com a velha porta de carvalho de maçaneta dourada, uma surpresa a travou de ir adiante, de olhos abertos e com uma fina

correria de sangue que saíra dos lábios, o corpo do velho Zeque jazia sem vida.