Lembranças da escola

Ah, a escola, que tempos bons!... Tudo é belo na época da escola, exceto ir para a própria!...

Comecemos pela Alfabetização, que hoje se chama de Pré-Escolar, e que nos meus tempos, geralmente ficava a cargo de professoras leigas ou formadas, mas que ministravam aulas em suas casas, as chamadas “professoras particulares”. Munidas de réguas e palmatórias, dispostas a enfiar o cacete e o conteúdo – Cartilha de ABC e Tabuada - nas cabeças dos alunos, procuravam atender religiosamente as recomendações dos pais:

- Desemburre esse menino, professora!

Desses tempos, tenho algumas histórias para contar.

A minha professora de Alfabetização, Dona Marieta, era mais zangada do que um siri na lata. Na aula de soletração ou de tabuada, a regra era a seguinte: errou, pau cantou!

Estudavam comigo dois irmãos, Roberto e Antenor, que moravam na cidade com a tia, mas que voltavam todos os fins de semana para o sítio do seu pai na zona rural. Roberto até que não era mau aluno, mas morria de medo na hora que Dona Marieta ia fazer as argüições. Antenor, mais velho e preocupado com o nervosismo do irmão menor, sempre ficava por perto para, através de um sinal, de um sussurro ou de um código qualquer, prestar-lhe qualquer tipo de ajuda.

Então, um dia, Roberto encontrava-se em plena aula de soletração, sob o olhar severo da professora:

- Bo-la, bola! Ca-sa, casa! Me-lão, me..., me...

- Diga, menino, diga, me-lão, como faz?

- Roberto continuou engasgado com a palavra:

- Me-lão, me..., me-lão, me...

Dona Marieta se enfezou e levantou-se com uma régua enorme em riste:

- Diga, menino, diga a palavra!

Nesse momento, Antenor baixou a voz e sussurrou:

- Besta, é aquilo que a gente come todos os domingos lá no sítio!

Roberto tomou alma nova, abriu um largo sorriso, e falou:

- Já sei, professora! Me-lão, leitoa!

Dona Marieta deu duas porradas na cabeça de Roberto, gritando, furiosa:

- Moleque saliente! Quer brincar comigo, hein? Toma, safado!

Meu colega do Ginásio, Pereira, tinha um sobrinho que nunca quisera estudar formalmente. Aprendera em casa o ABC e a Tabuada, e se recusara terminantemente a ir mais em frente. Até que, quando completou 12 anos, o meu colega resolveu pegar pesado com o sobrinho:

- Délio, é o seguinte: aqui estão cadernos, lápis e borracha. Já falei com Dona Joana; a partir de hoje, vais estudar com ela.

Délio espantou-se:

- Mas, tio, por que tenho que estudar?

- Não interessa! Ou vais para a aula ou vou te moer de pancada, cabra preguiçoso!

Então, Délio foi para a aula particular. Arrumou os seus bagulhos e às 13:00 em ponto, picou a mula para a casa da professora Joana.

Para voltar uma hora depois, bufando de raiva. Pereira perguntou:

- O que foi Délio, por que veio embora tão cedo?

- Essa professora é doida, tio! Ela só estava me ensinando coisas que eu não sabia!...

Santiago Cabral
Enviado por Santiago Cabral em 05/09/2007
Reeditado em 02/08/2009
Código do texto: T639913
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