DOIS TELEFONEMAS... POR ENGANO...

O PRIMEIRO, matinal --- Minha AMIGA mora em outra cidade, litoral maravilhoso (publicidade turística: "entre o mar e a montanha") e, como toda mulher, faz um "dramalhão francês barroco" (cavalheiro sem capa e chapéu emplumado), de espada e lágrimas, apenas duvido que chore à toa: que EU não gosto mais dela (inverdade), que não telefono (verdade), que apenas mando (quando mando) curto e-mailzinho, que o meu boa noite, há muito tempo reduzido a BN, caiu agora nas calendas gregas (minha eterna falta de tempo nunca esticado ou super cansaço às 23 horas) etc. etc. etc. ----- Olhava foto da catedral parisiense, início da construção em 1163 (antiguinha, hein?), numa qualquer manhã, quando o "quase mudo" (trocadilho infame) tocou. Identificador de chamadas na mini telinha do aparelho - viu o DDD da capital do meu Estado, moro relativamente perto, adoro carro veloz na estrada, EU poderia estar na "caça" decente em livrarias na Liberdade ou (ou, não e...) bibliotecas (o primeiro pensamento dela nunca é este), EU estaria f......... /censurado/ - (EU perdôo, cultura é o segundo). ----- Voz masculina, impossível identificar pela interferência de vários sons de rua - buzinas, roncos de motor, apitos, sinos, gritos, falatório... ----- Tenho a minha suprema vaidade Ariana de dizer que o coração da Geminiana bateu mais forte e gritou o meu nome. ----- O CIDADÃO enraiveceu-se. O que falou coincidiu com certos pensamentos diários de minha AMIGA em relação a mim e vice-versa. "Gandaia não." ELE ainda a amava muito (falou), apenas não telefonava mais constante porque......... (desculpas ou explicações abafadas pelos ruídos locais desconexos), mas digitava muitos e-mails grandes (será?) que ELA não respondia e tempos depois dizia "não recebi" (grande mentirona de mulher porque nunca voltava para ELE em quarentena!!!). E enviava (rsrsrs) flores virtuais "imurcháveis" (e sem perfume!), justo as prediletas dela - rosas-chá e orquídeas lilases que ELA chama de "obrigação" nas datas importantes, filosofia feminina do 'dispensável agradecer'. ----- Ora, minha AMIGA me envia e-mails gigantescos, EU é que, após ler tudo com um sorriso esnobe (britânico?), escrevo muitíssimo menos. Flores, EU deveria mandar até mesmo fora das datas especiais: assumo detestar agendas e esqueço... ELA ironiza a ausência, agradece o meu "cavalheirismo onipresente de tirar o chapéu às damas (não uso nem boné!) e beijar-lhes as mãos enluvadas, tempo do gentil-homem francês" (estou apenas repetindo o que ELA me digitou e 'retribui' com a mistura criteriosamente selecionada de fragmentos do poetinha (poeta grande!) VINÍCIUS e do amado CHICO. ----- Bronca e não conformação pesadas! Naturalmente, "EU", isto é, o CIDADÃO do telefonema já tinha sido substituído por um galã alto, Gigante (complexo dos baixinhos). Traição jamais perdoaria pois era fidelíssimo a ELA blá blá blá. Não posso contar aqui o que ELE descreveu de amor sensual e íntimo aos finais de semana, 'casados' antecipadamente... Aí queria que ELA repetisse o nome do "outro" que ELE não entendera, não escutara muito bem. Minha AMIGA notara o engano, havia um tudo errado no ar. Mesmo assim, já debochadinha (aprendeu comigo!), pronunciou o meu nome. Dois erres bem fortes: "letra de macho", sempre me disse. // O CIDADÃO enlouqueceu total! Disse horrores. Que jamais a amara, tinha sido namoro e um ridículo noivado de conveniência devido os pais serem irmãos legítimos e sócios comerciais, embora em cidades diferentes. Que São Paulo e Rio de Janeiro nunca se uniram, rivais desde o náufrago português JOÃO BARBALHO (sabidinho atrapalhou-se todo: é RAMALHO) e São SEBASTIÃO...Também disse que, no papel de homem já aproveitara bastante. Chamou-a de quase gorda (ofensa máxima para uma mulher!) e mandou para certos "lugares" inconvenientes - ao vivo, cara a cara, o cara levaria um bom tabefe de ter que botar bife no olho! Foram xingamentos horrorosos - minha AMIGA nunca pronunciou unzinho dos mais populares, digitou somente as letras iniciais ao me narrar este acontecido... Só uma vez, em ofensa imoral extrema e escandalosa, é que EU a mandei lamber sabão... --- Minha AMIGA tentou explicar telefonema por engano e sentiu que ELA, a verdadeira, perdera o noivo para sempre. Ora, não acata a ideia de casamento religioso, porém é super criativa, imaginativa e imaginou a si própria em cena de novela (em verdadeiro caso de muita ira, assumo que ELA é doce Ratinha, EU é que a transtorno, irrito... estou em casa, finjo que desapareço um dia inteiro), diz que rasgar papel acalma, rasgaria jornal velho em confetes maiores e em apoteose o vestido longo de cetim brilhoso, renda e pequenas pérolas /no Japão do século XXI, mulheres até hoje mergulham semi nuas a procura de ostras grávidas?/ (já foi "auto-estilista"... copiadora de moldes prontos, figurino da banca de jornal...) - jogaria em alto-mar (?) a aliança - exagero: de barca motorizada, é a travessia Rio/Niterói, menos que meia hora, baía fechada, arredondada (olhe mapa, caro leitor), sem ser oceano entre continentes. Pessoalmente, detesta aliança, diz que é símbolo de posse horizontal e escravidão da mulher sem salário - festinha masculina de 'senzala' acabou há quase dois séculos. Festejaria o fim do noivado - pileque de licor (vacilou entre cacau, amarula e anis), juntaria pão-de ló-marguerita da confeitaria de 1894, no centro da cidade, creme de leite ou sorvete e talvez uns pasteizinhos de queijo... de padaria de esquina perto de casa. (Provérbio popular retorcido: "Quem não se mata, engorda.") ----- Fulano falou ADEUS, com muita raiva, e desligou. ----- Questão de consciência. "E agora, Drummond?" Noivado desfeito, a verdadeira noiva quem seria? Ah, porém uma carioquinha nunca fica triste - Mangueira aonde ir sambar!!! E por certo logo apareceria um RUBEMAR-paulista ou então um RAGNAR (meu personagem mais assíduo) de verdade. Idealizou o próximo noivo: alto, bonito, sedutor, hipnotizador, machão, esportista cavaleiro (ELA ama cavalos), cavalheiro cheio de qualidades, intelectual, escritor e poeta (que não pedisse para corrigir a gramática.........), empurrador de móveis pesados, carregador das lotadas malas do casal entre as duas cidades; tai, não se imaginou mulherzinha exeutando as tarefas domésticas.........

O SEGUNDO, VESPERTINO --- À tarde, o agora "menos mudo" tocou. ELA reconheceu a voz, ainda que o barulho fosse idêntico. ELE pediu 'mil' desculpas. Humilde. Sempre a amara. Suspenso no colo da mãe, fora conhecê-la no berçário da maternidade, maldito vidro os separando ("Ah, que lindo!" - minha AMIGA suspirou), um tanto desbotadinha, lacinho de fita cor-de-rosa, mesmo assim gostou, e horas depois pedira ao tio (falava mal, ainda) a 'piminha' em casamento. Sentia no coração jamais permitir que houvesse outro na vida dela, que ELA pronunciara três vezes (foram só duas - mito popular de um, dois, três em tudo...) o nome horroroso, talvez apelido de artista circense (fiquei indignado com o palpite do provável baixinho: trapezista, domador de feras ou... palhaço?) ou um pseudo rival inventado para que ELE, Ariano impulsivo e irascível, ficasse furioso por ciúme. (Sem me conhecer, estaria me descrevendo?) Que ELA deletasse da memória, esquecesse o telefonema (já fiz muito isso em relação a e-mail noturno, raivoso e ridiculamente bobo) e nunca mais tocasse no assunto, como se a tal ligação telefônica jamais tivesse acontecido. ELE fora à capital do Estado, carro veloz na estrada, "caça" decente a livrarias na Liberdade duas doses de saquê) e bibliotecas (e, não ou...), livro de Direito para ELE, um Vade-Mécum atual, e mandaria pelo correio um exemplar autografado de literatura francesa existencialista da rua 25 de março ou pelo menos escanear de imediato a página onde "Roxane oferece a Cyrano bolo, uvas e vinho... e ELE beija, como a de uma princesa, a mão que a prima lhe estende". ----- Minha AMIGA sentiu meia lágrima no olho esquerdo (por mim e para mim, não chora nunca!!!) e salvou o casamento da desconhecida com a frase-clichê hollywoodiana: "AI LÓVI Ú!"

Minha AMIGA sempre diz que por trás da personagem astrológica, EU sou um anjinho doce e sensível. Ah, se for elogio falso, se houver outro amado oculto, escondido sob máscara, EU literalmente a estrangulo.

Pesquisarei antes detalhes de como OTELO estrangulou DESDÊMONA... Mulher, de todo inocente, onde e quando?

SIGNIFICADOS DOS NOMES:

OTELO - O ciumento.

DESDÊMONA - Aquela que sofre.

E lembrando SHAKESPEARE, lá de cima acompanhando a Copa do Mundo, está o nosso inesquecível filósofo futebolista, NELSON RODRIGUES:

"A mais sórdida pelada no Brasil é uma complexidade shakesperiana".

(Futebol = soma de novela, drama, pathos, tragédia, farsa, burla, glória e sacrifício.)

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LEIAM meus trabalhos "Toca, desgraçado, toca!" - I e II, "Estranho telefonema", "Telefone - os prós e os contras" e "Outra Desdêmona?!..."

RECOMENDO os seguintes livros:

"Cyrano de Bergerac", Edmond rostand, 1897, Romantismo - protagonistas Cyrano, militar, e Roxane, a prima encantadora // "O corcunda de Notre Dame, Victor Hugo, 1831, Romantismo - protagonistas Quasímodo, sineiro, e Esmeralda, a cigana-tentação // Novelas românticas francesas, da década de 60, Françoise Sagan.

Gente, 'sebo' é tradição e cultura - livros velhos como atração às margens do rio Sena, programa típico parisiense.

F I M

Rubemar Alves
Enviado por Rubemar Alves em 30/06/2018
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