Além das sombras - Vazio - IX
A menina do vestido amarelo
Ela tem um cabelo que é a própria poesia, seus olhos de jabuticaba atrevida falam hora mais que sua própria boca
delicadamente tagarela. Tem nos seus cabides além de vários vestidos de menina faceira, alegria de borboleta, esperteza de lagartixa, paciência de tartaruga, memória de elefante, sorriso de vaga-lume e a açucarada força de abelha rainha.
Não lhe falta coragem para as lutas com moinhos de ventos
ou com conversas com fadas e príncipes.
Ela é no rodar de suas saias menina, mulher, mãe, baiana, rendeira, cozinheira, astronauta e um pouco de tudo quando usa seu pó de era uma vez.
Gosta dos clássicos, fica cheia de si com Alice no País das Maravilhas, João e o Pé de Feijão e flutua com Ruth Rocha, Sylvia Orthof, Monteiro Lobato e com as demais pessoinhas gigantes que conseguem transformar uma folha
num reino encantado e até mesmo desencantado.
Mas o que mais me chama a atenção nela é sua ousadia
de contar ( e de aumentar) sobre as montanhas, lagos ,mães, filhos, tribos, caçadas, plantações, aventuras, com a boca de seu coração e com os olhos de sua alma.
Seu vestido amarelo gargalha com a menina lavandeira:
" O menina da beira da praia
como é que sua mãe lava a saia?
assim, assim, assim,
assim, assim, assim.."
Ri também da lavandeira quem por perto estiver dela.
Eu ri e rio tantas vezes que multipliquei esse riso nos sonhos e nos meninos travessos.
Ela também é lágrima quando conta suavemente sobre as mães a cuidar com zelo de seus filhos inocentes e indefesos,
quando fala dos bravos trabalhadores, das lutas honestas
e das batalhas injustas.
A menina que vos falo é um arco-íris de sentimentos ao ser quem ela quer. Consegue ser vermelha quando fala do lobo mal, alaranjada quando canta sobre o pequeno Príncipe, amarela quando mostra os segredos da matemática, verde quando ensina sobre as hortelãs, erva-doces, azaleias, hortênsias, alfaces e beterrabas; azul quando mostra o planeta terra; índigo quando narra Zumbi dos Palmares, Anita Garibaldi; e encantadoramente violeta quando encena Cecília Meireles, Cora Coralina e bolhas e nuvens e ventos...
A menina que vos escrevo tem nome e sobrenome, eu deixarei em segredo sua identidade, mas permita-se atribuir
essas linhas a todas que carregam a arte do " Era uma vez"...