Contraste (Parte 1)
- Moço, será que você pode me ajudar com o pneu?
Jair a olhou de cima embaixo. Renata, uma moça de trinta anos, "mionzinha", de pele branquinha, cabelos castanhos até o ombro, vestido floral, bolsa de mão combinando com o nude da sandália e óculos de sol como arco na cabeça.
Uma "tetéia", pensou. Num primeiro momento, Jair, um rapaz afrodescendente de 98 kilos, lutador de jiu-jitsu e no auge dos seus 40 anos; teve o ímpeto de meter as mãos por debaixo daquela saia, e segurar à força aquela moça tão frágil. Mas em fração de segundos se recompôs, lembrou do sermão do pastor e saiu para fora da oficina limpando as mãos num pedaço de estopa que estava sobre o capô da caminhonete cabine dupla, que era examinada por dois mecânicos.
Sem dizer uma palavra, fez um gesto pedindo a chave do carro. Abriu o porta-malas, pegou o que precisava para trocar o pneu.
Renata ficou ali parada, olhando os músculos do rapaz. Quanto tempo ele devia se dedicar à malhação? Ou será que a lida na oficina o deixou com os bíceps tão avantajados? Sentiu o cheiro forte de graxa e saiu para a porta. Não resistiu e perguntou o nome do rapaz. Ele olhou para cima e respondeu, entre um aperto de parafuso e outro. Ela sem graça murmurou:
- O nome do meu avô.
- Pronto senhora, o carro está pronto.
Ela pegou a chave, abriu a bolsa e perguntou quanto era.
-Nao é nada não, moça!
- Como não, é o seu serviço?
Ele riu e disse de um jeito descontraído:
- Foi só um favor. Sou professor da academia aqui ao lado. Vim trazer meu carro para olharem o freio.
Renata agradeceu sorrindo graciosamente e voltou para dentro do veículo.
Jair, parado na porta da oficina, seguiu aquele carro, com o olhar fixo, até que dobrou a esquina, a três quarteirões dali.
Renata sentiu uma louca vontade de revê-lo e no dia seguinte, se matriculou na academia.
Cláudia Machado
24/5/18
Leia: Contraste (parte 1), Contraste (parte 2) e Contraste (Final)