Escorpiana
Ela se sentou à beira da cama, e colocou as mãos entre as pernas, como se tentasse esconder algo de mim.
Eu não conseguia ver muita coisa, dada a escuridão do quarto naquele fim de tarde chuvoso, mas me sentei no chão e fiquei esperando que ela tomasse coragem para falar o que estava pensando.
O silêncio se arrastou ainda por um tempo até que ela abrisse a boca.
- Você não tem noção de como é difícil para mim, estar nessa situação. Passo os dias angustiada, sem saber o que fazer.
Ela pausou e ficou esperando que eu falasse algo. Mas eu não tinha nada para falar.
- Eu amo você, Rômulo. Mas...
- Tudo bem. Você já me disse isso.
Ela sabia que eu odiava que me chamasse pelo nome. E quando isso acontecia, dava pra prever que nada de bom estava por vir.
- Eu queria que você entendesse! – Disse-me entre lágrimas.
- Mas eu entendo! Entendo realmente.
- O que você entende?
- Que você nunca vai conseguir tomar uma decisão pensando em alguém que não seja você mesma. Foi assim desde que nos conhecemos, pretinha. Por mais que você tente disfarçar, ou mostrar que o que ocorre é algo diferente.
Ela ameaçou se levantar para replicar. Mas no fundo ela sabia que não tinha palavras para me fazer pensar de outra forma e simplesmente se resignou.
- O que você queria que eu fizesse? – Ela perguntou finalmente.
- queria que você fosse sincera e que uma vez na vida, estivesse pronta a lidar com as consequências dos seus atos, sem querer disfarça-los com meias verdades mais convenientes.
A verdade é que eu tinha percebido que certas coisas nunca mudam. E talvez não sejam feitas para mudar. Talvez fosse para eu ser eternamente o amor inalcançável que ela gostava de ter na cabeça. Mas nada muito mais prático do que isso. E dessa forma, qualquer coisa se torna impedimento... as menores coisas se tornam grandes demais.
- Você quer que eu vá embora?
- Sinceramente, pretinha. Eu queria que você ficasse. Mas sei que isso nunca vai ser possível.
- Mas devia ser!
- A única coisa que está no meio do caminho é você mesma. Só que talvez você não tenha percebido.
Ela levou as mãos ao rosto para chorar e eu me levantei para sentar ao seu lado.
Nos abraçamos e ela chorou todas as lágrimas que vinha guardando nas últimas semanas. Lágrimas que eram por mim e também por outras coisas.
Ela dizia que eu não saia de seus sonhos. Que estava sempre em seus pensamentos. E eu tinha percebido que era exatamente esse o meu lugar.
Eu não iria insistir por algo diferente.
Ia deixar o tempo passar, e talvez assim nós dois encontrássemos um lugar comum, e algum sentido dentro de toda essa confusão que tínhamos criado.