DUAS EM UMA-PARTE II

MEMÓRIAS - MIGUEL PAIVA, o criador da RADICAL CHIC

Nunca fez curso de desenho.

Completamente apaixonado pela personagem que criou em 1982, de uma maneira até concreta como numa relação verdadeira de às vezes excitação. O charme multifacetado e as muitas características revelam um pouco a ambiguidade feminina, o que faz com que - independente de tipo físico ou psicológico - muita gente se identifique com ELA, sintam-se como ELA. Ou conhece alguém que é "a própria" RADICAL CHIC... Sim, porque a personagem representa o que muitas mulheres gostariam de ser e dizer - autocrítica em dimensão muito humana. ----- O primeiro livro com a RADICAL, em 1989, foi num clima de festa enorme, gente até desconhecida do autor. ----- Todo mundo dando palpite. Muitas cartas - uma dentista sugeriu sapatos para a personagem. Autor soube, num papo informal com uma amiga, de uma pessoa real com diversos casamentos - mulher de sorte em atual casamento fantástico: primeiro com "um banco", depois com 'uma fazenda de soja", em seguida com "uma siderurgia" e agora com um GATO de 18 anos... AÍ, inspiração para a RADICAL CHIC casar com... "uma microempresa". ----- Cumplicidades masculinas com o autor nas grandes e pequenas reuniões, muitas estórias.

Filosofias da RADICAl: "Aos 20 anos, coragem e ousadia para revolucionar o mundo /adquire substância e solidez/. Aos 30 (faixa etária dela, assumindo figura definitiva), revoluciona sua vida /se casada, separa-se; se solteira, sai da casa dos pais; se trabalha, muda de atividade/ - grande v irada: de menina, passa a ser mulher, conservando o encanto da juventude. Aos 40, preocupada com o envelhecimento, questionamentos mil, tempo de fazer uma boa plástica." (EU pergunto: transformação total?) ----- O bom humor da RADICAL começou em 1992, revista PLAYBOY convidando para posar nua, cachê negociado, equivalente a uma mulher de verdade. Material desenhado foi entregue como se ELA estivesse em Báli (Indonésia) - criticaram, apenas um pouco, seios caídos, peito caído e barriguinha, porém enorme repercussão. Primeira personagem de HQ a posar nua!

O interesse maior do autor pelas mulheres em geral (trabalhara no PASQUIM de 1970 a 74) foi pela residência na Itália na metade dos anos 70, longe de fazer charge política, e passou a lidar com a área de comportamento - sociedade, família e relações entre as pessoas -, trabalhando também em Genebra, Suíça, com um grupo de mulheres na ONG Instituto Ação Cultural, em ilustração e material didático sobre a identidade feminina - nas discussões, acesso ao universo feminino com mulheres inteligentes, sensíveis e interessantes. Material com visão de humor.

No Brasil, 1980, na revista ISTO É, série de desenhos semanais, "Happy Days" - família de classe média e assuntos considerados secundários, como sexualidade, aborto e orgasmo, personagem-mãe, MARIA DAS DORES, mulher doméstica, maior vítima das opressões familiares. ----- CARTUM - Filho/filha adolescentes. ELE - "A herança que você vai nos deixar será a amargura, a frustração, o fracasso e a mediocridade..." MÃE, avental, cozinhando: "E trate de dividir tudo direitinho com sua irmã, sem brigas, hein?"

Em 1987, o FEMINISMO brotou naturalmente - vivência escondida e defensiva do homem X mulher mais transparente, aberta, exposta, espontânea e inspiradora.

Primeiro personagem feminino - CATARINA, jovem contestadora, desenhos publicados no "Gil", jornal de moda do estilista GIL BRANDÃO, de 1968 a 1969, primeiros movimentos feministas nos States, mulheres se libertando um pouco de cumprir um papal determinado. Antropologicamente, entretanto, homem & mulher na busca do prazer físico e da necessidade de procriação, entendimento atrapalhado porque foi dado ao homem o poder em relação que pode ser violenta.

Personagem masculino - GATÃO DE MEIA IDADE, no JORNAL DO BRASIL e em O ESTADO E SÃO PAULO, fruto de convivência com homens maduros.

Personagem infantil - CHIQUINHA, uma RADICAL CHIC criança.

RADICAL CHIC - Surgiu em 1982 na revista "Domingo" do JORNAL DO BRASIL. Personagem urbana, gostando de futilidades e moda, ao mesmo tempo questionadora. Nenhuma inspiração específica - contestação no estereótipo feminino convencional-tradicional: mulher com cabelos compridos, quadril grande... e loura... Acabou sendo ruiva, esguia, cara um tanto masculina. Convenientemente, mulher "não lembra" o ontem: humor de vivência espontânea, diária, não racional.

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LEIAM meu texto "Pais separados, morando perto..."

FONTE:

"Adoro as mulheres" - SP, revista CARAS, fev./95.

F I M

Rubemar Alves
Enviado por Rubemar Alves em 25/03/2018
Código do texto: T6290524
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