Secrets

K. acendeu a lâmpada e ficou brincando com a fumaça do cigarro contra a luz vermelha. Tinhamos passado a tarde secando algumas latas de cerveja e conversando sobre uma série de assuntos aleatórios. Então anoiteceu e eu percebi que ela continuava comigo, mesmo que eu não soubesse o motivo. Eu não fazia idéia de como haviamos chegado onde estávamos. Talvez por que ela transparecesse pouco do que estava pensando e sentindo. Ouvia mais do que falava. Absorvia mais do ambiente do que eu, que constantemente estava distraido ou perdido na minhas séries de pensamentos desordenados.

Ela interrompeu minha divagação e falou.

- Você precisa ouvir uma coisa.

e começou a mexer no celular. Quando a música começou a tocar ela abriu um sorriso e continou

- É essa aqui... presta atenção.

Tentei prestar atenção na música, mas ela se aproximou e grudou o corpo ao meu.

Dava pra sentir a sua respiração acelerada, enquanto K. cravava as unhas na minha nuca puxava meu corpo contra si.

Cada vez que ela me mordia os lábios, um arrepio me subia pelas costas e fazia com que eu me reconectasse com a realidade de onde nós estávamos.

Então ela simplesmente ficava me encarando, com o olhar preso ao meu, e sussurrando os verso das músicas com os lábios tocando levemente nos meus.

Não era muito comum que eu embarcasse num momento daquele jeito, ou que eu me perdesse nos olhos de alguém e ficasse sem ter o que dizer.

Eu vinha tendo dificuldades de curtir momentos como aquele... ou qualquer coisa que me fizesse sair de dentro de mim mesmo e da minha solidão já tão particular e quase que confortável.

Mas não tinha como eu não estar fora de mim naquele instante, enquanto ela me beijava e me mordia

e minhas mãos corriam pelos seus cabelos e pelo seu corpo.

Eu estava perdido em toda aquela sincronicidade e só então percebi o quão vulnerável eu era, àquelas sensações.

A música acabou e paramos onde estávamos por um certo tempo até que eu quebrei o silêncio.

- Quem é você agora? - Perguntei.

Ela riu e me deu um dos olhares mais lascivos que eu me recordo de ter recebido.

- Eu, oras.

- Sim. Mas eu não esperava isso. Estou realmente surpreso.

- Por que?

- Eu não me imaginava aqui, hoje... com você.

- Também não. Mas estou aqui, não estou?

Recostou o corpo contra o meu e me mordeu levemente no pescoço e depois puxou o meu rosto contra o seu...

Outra música começou a tocar e ela sussurrou um dos versos no meu ouvido...

- How many secrets can you keep?

- Não muitos. - Respondi antes de voltar a beijá-la com a mesma intensidade de antes.

Não lembro muita coisa do que aconteceu depois disso. Certas coisas acontecem rápido demais pra que minha cabeça consiga arranjá-las em lembranças que façam sentido. Como um tipo de incêndio que vai de fagulha à cinzas em instantes...

Me restam apenas flashes desordenados e o sussurro de despedida dela, quando lhe perguntei se ela voltaria.

- Eu sempre volto. - Foi tudo o que ela me disse antes de desaparecer e me deixar me questionando se ainda havia alguma intensidade dentro de mim, e se eu era realmente capaz de guardar segredos.

Rômulo Maciel de Moraes Filho
Enviado por Rômulo Maciel de Moraes Filho em 19/03/2018
Reeditado em 19/03/2018
Código do texto: T6284720
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