Contos de busão I
Contos de busão
I
Eu a fitei! Mesmo estando com cara de cansaço, barba por fazer, roupas surradas e um baita fone de ouvidos tocando qualquer porcaria desconhecida, eu a fitei! Estava sentado um pouco atrás do meio do onibus, em um banco, diga se de passagem desconfortável, quando ela entrou. Meus Deus! Como ela era tão comum. Não tinha o corpo mais sexy que a da média, seus olhos eram pequenos e castanhos do tipo que veio padrão de fábrica. Ela não era muito alta, aproximadamente uns 1,62 de altura. Seu cabelo era médio, um castanho meio preto ou um preto meio desbotado. Parecia mal cuidado, ou ao menos hoje ele parecia. Era morena cor de papelão, carregava uma mochila nas costas, usava uma calça jeans surrada, um tênis baixo de marca desconhecida e uma regata de um vermelho rosado. Enfim, era bem normal. Até que ela sorriu...
Todo aquele barulho de pessoas lamentando os seus dias a quem quisesse ouvir havia silenciado. Dentes bem cuidados e perfeitamente alinhados, covinhas tão suaves que dava vontade de ser enterrado vivo nelas. Havia tanta calma naquele sorriso. Aquele sorriso não era para mim, mas quem se importa? Continuei a encara-la. Meus olhos agora brilhavam maravilhados enquanto observavam.
Um ponto a frente pessoas desceram, o corredor ganhou um pouco mais de espaço e ela se aproximou. Realmente era o sorriso mais lindo que já vi. O sorriso mais lindo que já vi em um ônibus. Parecia sincero e oriundo de bons motivos apenas e não motivos que eram ruins e amenizaram. Fiquei me questionando o que causaria ele: -uma bolsa de estudos?
-uma viajem tão esperada?
Ou...
Continuei a encarando agora de perto. Nitidamente ela se sentiu incomodada, mas quem não ficaria com um projeto de mendigo encarado como se quisesse aquelas moedas que você acabara de colocar no bolso?
Ela ficou corada, mexeu no cabelo, olhou para o celular, mexeu novamente no cabelo, ficou um pouco ainda mais corada, mexeu novamente no cabelo e se virou.
Fiquei com vontade de puxar assunto. Me faltou um pouco de coragem ou me excedeu um pouco de “desconfiômetro”. Obviamente seria uma abordagem mal sucedida. Eu ficaria com cara de trouxa e ela pularia do ônibus em movimento, só para evitar assunto com...
_ Oi! Você tem um belo sorriso sabia? -Disse um camarada que só pode ter surgido do inferno.
Ela sorriu meio sem graça, corou um pouco mais e respondeu apenas um gentil e educado “obrigada”.