Última gota - Tic Tac

Deixei o relógio enterrado no arroz durante alguns dias, para tentar absorver a umidade de dentro dele, mas quando o tirei de lá, estava apagado - morto.

Talvez a falta de luz tenha sido fatal. Ou o que pensei que era água que havia entrado no relógio, na verdade, eram lágrimas, seja de tristeza ou de alegria - de despedida do ciclo do tempo que para ele terminou.

Aquele funcionário da ditadura do tempo - tic tac...tic tac...tic tac - que controlava cada segundo mal vivido e sobrevivido e aprisionava cada momento no passado - tic tac - que desconsiderava toda a relatividade com suas engrenagens calculistas e secas, apontando os números que contam cada minuto do dia - tic tac - sussurava em sua língua as coisas não terminadas, as pessoas não vistas, os abraços não dados, as coisas nunca feitas - tic tac - nunca feitas - tic tac - As vezes gritava, como uma sirene, alertando para os instantes que passavam...PASSADO - TIC TAC- Aquilo que não volta, a não ser através de lembranças - as danças da memória, histórias. As voltas são para o presente - 24 horas respiradas ou não, válidas ou inválidas - não deixava que nenhuma fosse pulada, mesmo que passasse em branco ou que fosse cinza e escura. Dura maneira de se cabrestear pessoas em suas rotinas bestas e escravizá-las atrás de cortinas de ilusões - tic tac - Mas até os instrumentos do tempo tem fim - Tic...tac. - Assim parou o incessante contaDOR.

GISS
Enviado por GISS em 30/11/2017
Reeditado em 23/12/2020
Código do texto: T6185910
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