Nina
Nina encarou o espelho por alguns instantes antes de finalizar a maquiagem. Não havia muito mais o que fazer além de passar o batom vermelho que havia comprado para esta ocasião. Se sentiu bonita, apesar do gosto amargo que tinha na boca no momento. Ignorou a sensação e juntou suas coisas para sair de casa. Faltava 15 minutos para o horário combinado e resolveu esperar sentada no sofá da sala.
Sua ansiedade só aumentava com a proximidade do horário, e seu primeiro instinto foi abrir pequena bolsa que trazia consigo e levar um cigarro à boca. Desistiu antes de acendê-lo, temendo que o cheiro incomodasse a pessoa a quem ela estava esperando.
Quando o seu relógio apontava 20:55, ela resolveu se levantar e saiu do seu apartamento. Desceu os dois lances de escada que a separavam do térreo e esperou na portaria. Quando viu o carro preto de luxo na frente de seu prédio, se despediu do porteiro e foi em sua direção. Quem a esperava não era o homem que tinha visto pela rede social, mas antes que pudesse perguntar algo, ele falou.
- Você é Nina, não é?
- Sou sim.
Ele a olhou de cima a baixo e por fim falou.
- Eu sei que não sou a pessoa que você estava esperando. Sou apenas o motorista dele. Meu nome é Diego. Pode subir que vou levar você ao restaurante que vocês combinaram.
- Ele vai estar lá esperando?
- Sim.
Isso tudo não ajudou a melhorar a ansiedade de Nina, mas ela resolveu terminar logo com tudo e subiu no carro.
Diego parecia ser daqueles tipos conversadores. Sorria bastante e não se deixava irritar pelo trânsito pesado da cidade numa noite de sexta feira.
- Você está ansiosa? –Perguntou ele.
- Um pouco.
- Não tem por que. O patrão é uma pessoa muito gentil.
- Imagino.
- Tô falando sério. Ele só tá nesse negócio de acompanhantes por que ele não teria tempo para um relacionamento convencional. Trabalha muito. Vive ocupado. Mas ainda é um homem como outro qualquer.
- Você trabalha para ele há muito tempo?
- Trabalho faz cinco anos como motorista. Mas o conheço desde criança. Meu pai trabalhou para o pai dele, e eu cresci na mesma casa. Hoje faço alguns trampos de confiança, e de vez em quando fico como motorista quando ele está aqui pela cidade.
- Entendi.
- Você tem quantos anos?
- Vinte e três.
- Ah. Parece ter um pouco menos. Eu tenho vinte e nove.
Nina deixou a conversa morrer começou a mexer no celular. Mandou uma mensagem para Ana, a amiga que a havia indicado para esta noite. Coisa que ela mesma já tinha feito.
Ana dizia que, Pedro, o homem com quem ia se encontrar, era uma pessoa muito rica. Um empresário bem sucedido, apesar de ser de hábitos muito simples. Várias garotas que Ana conhecia já haviam passado noites com ele. A maior parte relatava boas experiências e um pagamento bem acima da média... geralmente mais do que havia sido acordado de início. Só que Nina também ouviu relatos de mulheres que não tinham achado a noite tão agradável assim, e apesar de bem pagas, nunca mais voltaram a sair com ele. Ana não acreditava nesses relatos e só tinha coisas boas a falar.
O carro parou e Nina foi arrancada de seus pensamentos pela voz de Diego.
- Chegamos.
Nina agradeceu e saiu pela porta de trás do carro.
O restaurante era dos mais caros e elegantes de sua cidade. Um jantar simples ali poderia custar múltiplos salários mínimos e só quem frequentava eram pessoas seriamente abastadas.
Um recepcionista a recebeu na entrada e indicou a mesa onde Pedro estava sentado, tomando uma taça de vinho.
Sentiu vontade de desistir, mas três mil reais, apenas por uma noite era algo que ela não podia se dar o luxo de deixar passar.
Nina não era garota de programa. Não no sentido estrito da palavra. Já tinha saído com homens por dinheiro, mas era coisa rara. Sempre para tapar algum buraco financeiro. Os boletos e faturas continuavam chegando e estava ficando difícil pagar a faculdade de direito.
Decidiu que continuaria como o combinado e caminhou até a mesa.
Pedro abriu um sorriso ao vê-la e um garçom ajeitou uma cadeira para que ela se sentasse.
Nina se sentou tentando parecer natural naquela situação, mas sentia um terrível frio no estômago.
- Vinho? – Perguntou Pedro.
- Uma taça, por favor.
O garçom encheu uma taça para Nina, completou a que Pedro tomava e se afastou.
- Tomei a liberdade de pedir algo para comermos. Espero que você goste.
- Tudo bem.
- Não há motivo para ficar nervosa. Pense nisso como um encontro qualquer. – Disse-lhe, tocando levemente em sua mão.
- Ok. Confesso que não estou muito acostumada.
- Eu sei. Mas não há o que temer. Vamos jantar, dar uma volta e passar a noite juntos.
Nina concordou com a cabeça e tomou um gole de vinho, tentando disfarçar sua ansiedade.
- Você faz faculdade de Direito, não é? Ele perguntou, com meio sorriso no rosto.
- Sim, faço. Estou no sexto semestre.
- Eu sou formado em direito, mas nunca exerci. Fiz faculdade de Administração logo depois de formado e tomei esse rumo.
- Eu quero fazer escola de magistratura.
- É uma boa opção. Você tem futuro.
- Todos temos. Acho...
Pedro sorriu com a afirmação e não disse mais nada.
A comida chegou e ele logo se serviu.
- Não há nada melhor do que comer bem. Concorda?
- Verdade.
- Lembro de dias que eu tinha que me contentar com um lanche na cantina da faculdade no almoço e pão com queijo de noite em casa. Nem sempre eu fui tão bem de vida assim.
Nina se sentia realmente tensa mas a obrigação da noite a fazia tentar encontrar alguma coisa inteligente para dizer, só que no fim as palavras lhe fugiam e ela só conseguia concordar com a cabeça.
Pedro foi falando de coisas triviais de sua vida, e aos poucos ela percebeu que ele era realmente apenas uma pessoa normal. Talvez um pouco viciado em trabalho, mas visivelmente apaixonado pelo que fazia.
Ele era elegante, de alguma forma. Não era boçal como em geral eram as pessoas mais abastadas. Ela conseguia ver nele ainda um resquício de humildade de quem já foi pobre e nunca teve vergonha disso.
Aos poucos Nina entrou na conversa e a noite foi passando. Saíram do restaurante e foram direto para o seu apartamento.
Diego manteve-se em silêncio dessa vez enquanto dirigia.
Pedro morava na cobertura de um edifício à beira mar. O local era enorme, mas sobriamente organizado. Todos os itens se encaixavam perfeitamente num estilo monocromático e opaco. Na varanda havia uma espreguiçadeira branca virada para o lado do mar.
- Gosto de me sentar e assistir o nascer do sol, quando acordo muito cedo, ou estou em uma das minhas noites de insônia.
- Parece um jeito muito bom de se ter insônia, Pedro. Eu passo as minhas virando de um lado para o outro sobre a cama.
Os dois riram e Pedro a trouxe pelas mãos até a varanda. Sentou-a na espreguiçadeira e encostou-se ao parapeito. Ficou olhando enquanto ela afundava na maciez do móvel e sorriu, ao mesmo tempo em que ela sorria, admirada.
- Seja qual forem suas preocupações, quero que as deixe de lado enquanto estiver comigo. Fique à vontade.
- Não estou pensando nisso, - Disse Nina. – Só queria saber por que um cara como você pagaria para sair com alguém como eu. Não tenho nada de especial.
- Tem certeza que esse tipo de sinceridade é algo bom para o seu negócio?
- Você me compeliu a ser sincera hoje. Simplesmente por que eu não vejo nada insincero em você.
- Não esperava ouvir isso, Nina. Não sabia que eu passava toda essa autenticidade.
- Eu esperava que você fosse ser só mais um esnobe que paga para ter uma mulher do jeito que quiser, por que precisa possuí-la, objetificá-la. Mas eu não sinto isso de você.
- Não é esse o meu caso, realmente.
- E qual é?
- Em linhas gerais, eu não estou numa posição de poder desenvolver um relacionamento com alguém... ou deixar que alguém entre em minha vida. É um risco que eu não posso correr... por isso eu resolvi tratar desse lado de uma forma profissional.
- Parece que isso é um peso, pela forma que você fala.
- É. É um peso. Não adiante ter isso tudo se eu não puder dividir com alguém. Nem que seja por algumas poucas noites.
- Você é estranho, Pedro. Mas gosto do que vejo.
Pedro estendeu a mão e Nina a agarrou prontamente.
Os dois ficaram frente a frente e se beijaram.
Não foi um beijo profissional, ou puramente erótico. Havia um magnetismo que Nina não sabia explicar. Não esperou que fosse viver algo assim naquela noite. Esperou uma ação carnal apressada como era de costume. Ela tinha se vestido para fingir, e não sabia que seria capaz de sentir algo de verdade. Era tão confuso quanto tinha sido seu primeiro beijo.
A intensidade os levou da varanda ao quarto, e enfim os seus corpos afundaram na cama enquanto se misturavam e contorciam.
O sexo foi intenso e comprometido.
Conversaram e dormiram entrelaçados, como se fossem íntimos.
Dormiram como duas pessoas normais dormiriam.