as calcinhas de marlene

- Vai pegar minhas calcinhas, que estão escondidas.

Lá ia eu pela casa procurar suas calcinhas. As vezes ela deixava no quintal, embaixo do travesseiro, sob algum lençol. Uma vez encontrei na cômoda da edícula. Vários dias procurando. A recompensa quase não veio. Ela me jurava que faltava uma que nem ela lembrava onde escondeu.

Quando brigava com o namorado, não queria brincar. Ficava no quarto

Embrulhada de pé a cabeça. Eu me envolvia com outras coisas. Brincava

De menino mesmo.

Numa noite ela saiu do quarto e não me viu.

Passou nua do quarto até o quintal. Nunca tinha visto tão inteira. Do fundo, onde eu estava, dava pra vê-la. se lavando com uma caneca, suas partes de baixo. Jogava água, passava sabão com muita espuma. Depois, mais água fria, jogada de baixo pra cima.

Gostava de me levar pra fazenda. Fazia questão de me dar banho. Banho de rio. Sabão de coco. As pedras protegidas por arvores de copas vazadas e musgos, criava um penumbra rala que se afundava no verde negro do rio. Gostava de me colocar em seu colo e me ensoboava. Me empurrava pro fundo e depois me buscava num mergulho. A água esparramava e as espumas unia agente. Olhava nos olhos dela. Ela recebia, ria e inventava uma urgência: “hora de embora”. Chegando em casa. Iamos tirar o excesso de areia na bica. ”olha pra lá”. Eu obedecia. Só olhava escondido. “Hoje a gente vai brincar?”. “Não sei, estou muito cansada”.Lastimava, andava por toda casa procurando alguma escondida que não dei por conta. Ela sabia como me hesitar. Ficava mais curioso sem a certeza. Entre a pergunta e a resposta vinha um medo amarrado e quente. Quando estava quase dormindo, sentia seus lábios pertinho do meu ouvindo soprando palavrinhas mornas. “escondi uma vermelha”. “Aquela do buraquinho”. As vezes ela adormecia em minha cama. Eu ficava apertado entre ela e a parede. Acordava a toda hora. A luz da vela vagava pelas paredes. Era comum o lençol se levantar e parecer suas partes. Calcinha pequena de algodão. Bichinhos coloridos. A cor de sua pele não se entendia com o mexido da vela. A camiseta folgada revelava os seios entumecidos amarronzados. Sempre duros. Com duas cores dividida pelo sol. A barriga mexia como se soubesse. Ela era inteira lisa.

Eu me levantava. Ia ao banheiro. Olhava no espelho. Me cansava e dormia no cantinho do cama. Acordava com ela me balançando. “vamos comigo ao banheiro. Estou com medo”. Era fora da casa. Ela entrava na casinha de telhas e eu esperava olhando o céu prateado. Um vento tão bom e fresco passava por mim. A porta um pouco aberta. Não dava pra ver. Mesmo assim eu me afundava naquele escuro que guardava ela no fundo. Saia do sanitário se esforçando pra ajeitar a calcinha. “Vamos. Tá tarde”

Uma vez quando cheguei da escola, fui até seu quarto. Seus olhos estavam

Inchados. Sobre a cama todas suas calcinhas cortadas a tesoura. Partiria pra São Paulo dois dias depois. Nunca mais eu vi.