NOSSO TIME
                                                           
 
No ano passado nosso time foi muito mal. Só não ficou na lanterna do campeonato porque tinha outros piores. Afinal, time ruim, puxa-saco e formiga, são coisas que não acabam nunca. Claro, lanterna também não ia ser: nosso time tem tradição, dinheiro, e um elenco que custa uma fortuna. A diretoria prometeu e cumpriu: contratou reforços. Jogadores caros, de seleção e até um estrangeiro, e da seleção de lá. Como nós gostamos de coisa importada! Até jogador de futebol nós gostamos de importar, mesmo exportando os nossos melhores.
Os diretores sabem que, para o próprio bem deles, é bom agradar a torcida. Pois, tirando o dinheiro do patrocínio e da televisão, quem paga as despesas todas do clube, suas mordomias e as de seus amigos e familiares, e outras coisas mais, senão os torcedores? A torcida, na verdade, é a grande financiadora do time, com o pagamento dos ingressos, a paixão, o incentivo, a corrente positiva.
Diretor que vai contra a torcida, inevitavelmente, cai. São poderosos e arrogantes, mas não sustentam por muito tempo posições que desagradam a torcida. Técnico, então, nem se fala. Contrariou os torcedores, cai.
Com reforços, técnico novo e apoio da torcida, o time vai indo razoavelmente bem. Ganhou mais do que perdeu, mas perdeu. E empatou. Mais da metade do campeonato, não está ainda garantido para a segunda fase. Classificam-se oito, e nosso time está em sétimo, mas faltam ainda muitos jogos. Vai dar, a gente tem fé e confiança, mas não dá para não sofrer.
Cada jogo é uma tragédia.
No entanto, as esperanças vão sendo renovadas a cada partida. Vai dar. E estamos sempre lá, incentivando, gritando. E xingando também, quando o juiz rouba (e como eles roubam contra a gente) ou o adversário dá pancada nos nossos jogadores. Quando o técnico dá mancada, substitui errado, não monta o esquema certo, nós o xingamos de burro. Parece que os jogadores não têm mais amor à camisa, jogam pelo dinheiro. Ganham uma fortuna. Muitos deles ficam ricos logo que começam a aparecer bem. E como arrumam mulher bonita!
No fundo, a gente é que paga tudo isso. Mas amamos o time, não vivemos sem ele, por isso estamos sempre torcendo. E pagando ingresso.
O jogo seguia normal, zero a zero, e nosso time perdendo várias chances de gol. Até bola na trave já tínhamos chutado, sem contar as defesas milagrosas do goleiro adversário.
De repente um gol. E não é nosso. O velho ditado: que não faz, leva. Acabamos tomando. E estamos em sétimo. Se perdermos, do jeito que a coisa está embolada, vamos para o décimo. Classificam-se oito. E ai, além de ganhar, teremos de torcer para outros perderem. A matemática deixa a gente maluco. Entendemos é de futebol, matemática não é com a gente. O negócio é ganhar; e estamos perdendo. Para um time que está em décimo primeiro e querendo chegar lá. Tem mais jogos, mas não passa pelos nossos planos deixar de estar entre os oito em instante algum. É arriscado, é chato; tem ainda o fator psicológico, como dizem todos que apreciam o futebol. Tem até comentarista (acho ridículo esses caras que são ex-jogadores e se metem a comentaristas de televisão, pois só falam bobagem e ainda tem aquelas vozes irritantes) que fala num tal de “momento psicológico do jogo”. Sei lá o que é isso, mas ficar fora do grupo de classificados, mesmo antes do término da fase, é muito ruim. E ainda tem as gozações dos amigos, dos inimigos, do vizinho, do chefe. O time do meu chefe está mal, e isso me dá alegria: sou superior a ele, pelo menos como torcedor de futebol. Vou aguentar a gozação dele se meu time ficar fora do grupo dos oito que se classificaram para a outra fase?
Mesmo perdendo, nosso time não se abate em campo, continua lutando e pressionando. Tirando o volante que não está jogando nada, mas o técnico não substitui, porque é da seleção, e dizem que tem o patrocinador que exige sua presença, além dos comentários de que paga parte do seu salário para o técnico escalá-lo, os demais vão jogando, lutando. Mas a bola, a ingrata, não entra. Ainda por cima, o goleiro adversário está em dia de sorte. Acordou com “aquele negócio virado para a lua”. Ou a bola passa raspando a trave, ou vai dentro e ele defende.
O tempo é precioso, e passa mais rápido do que a gente quer e precisa.
Os gandulas nem sempre devolvem a bola com a rapidez que precisamos. Se a gente estivesse ganhando, tudo bem, mas estamos perdendo. Eles demoram. Principalmente o gordinho que está à minha frente. Não sei onde foram inventar gandula gordo.
Será que ele torce por nosso adversário?
Faltam três minutos para terminar o jogo e a bola sai pela lateral. O tal gordinho corre pouco, vai lento para a bola. Não vê, o infeliz, que aqueles segundos a mais que ele gasta são importantíssimos para nós? O juiz não vai dar acréscimo por conta desse atraso, eu sei. Ele já é manjado, não gosta do nosso time. E o gandula parece que também não.
Não aguento, xingo. Os companheiros torcedores, ao meu lado, acompanham. Estamos perdendo e o gordinho não quer cumprir sua obrigação de devolver a bola rápido. Xingamos, gritamos, ameaçamos. Acabo exagerando: levado pela onda de revolta, jogo nele meu rádio portátil. Azar: além de ficar sem o rádio, não acertei o cara.
Continuamos atacando e a bola não entrando. Termina o jogo, com nossa derrota. Um pouco por culpa dos nossos atacantes, que não marcaram gol, um pouco por causa do goleiro adversário, que defendeu demais, um pouco por causa do técnico, que é burro, mas o gandula teve sua parcela de participação na nossa derrota.
Puxei o coro: vaiamos. Mais da metade do estádio vaiou e xingou o gandula. Saímos tristes, mas com a alma lavada.
Quem mandou o cara torcer contra nosso time?








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Jair Humberto Rosa
Enviado por Agmar Raimundo em 15/09/2017
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