O Mesmo Filme
Eric do Vale
Atendi o telefone, no meio de expediente, e alguém, do outro lado da linha, falou:
-Alô, Rui?
-É ele, quem está falando?
-Sou eu...
Antes de me recuperar do susto, aquela voz continuou:
-Quanto tempo, não é?
- É verdade.
-Quando foi mesmo a última vez que nos vimos?
-Não faço ideia. Acho que foi há nove anos, por aí. O que você conta de novo?
-Eu? Nada. E você?
-Idem.
-A propósito, preciso muito falar com você. Tem algum problema de eu passar no seu escritório, amanhã?
-Problema nenhum.
-Então, está combinado.
Fazia tempo que não nos víamos e bota tempo nisso! Durante dois anos, fomos colegas de escola e sempre que alguém mexia comigo, vinha sempre em meu socorro para me defender. Foi ali que surgiu a nossa amizade. Só voltamos a ter algum contato, depois de muitos anos, por meio de uma rede social. Nessa época, eu me encontrava na metade do curso de direito. Vez ou outra, mandava-lhe algum recado, mas nunca era correspondido e uma vez que já tinha me conformado com aquilo, fui pego de surpresa:
-Olá, Rui. Quanto tempo!
-O quem tem feito?
-Estudando e trabalhando. E você, Rui?
-A mesma coisa, estou no sexto semestre do curso de Direito. E você?
-Perto de terminar administração.
-Qual é o seu telefone, posso te ligar?
-Sim.
Telefonei, logo em seguida, e a conversa não parou mais.
-Quer dizer que você está precisando de dinheiro? _ Perguntei.
-Sim, é para pagar a minha faculdade. Eu até peço desculpas de estar te fazendo esse pedido, Rui.
-Desculpa de quê? Só posso te dizer que estamos no mesmo barco, veja o meu caso: tenho que trabalhar de manhã e ir para a faculdade, à noite. Sem falar na mensalidade que é quase a metade do meu salário.
Passava das dez horas da manhã, quando a minha secretaria disse que tinha uma pessoa querendo falar comigo. Disse que deixasse entrar e ela, assim o fez. Pedi para que se sentasse e ofereci-lhe café e água. Em seguida, perguntei:
-A que devo a honra de sua visita?
-Preciso da sua ajuda.
-Minha ajuda?
-Sim, você é advogado e por sinal, um dos melhores.
Tive a impressão de já ter visto aquele filme antes e por isso, falei:
-Não conte comigo.
-Por quê?
-Me dê uma razão para que eu te ajude.
-Além de ser um grande advogado, nós estudamos no mesmo colégio. Não se lembra quando o pessoal mexia com você e eu te defendia?
- Sou um advogado conceituado e possuo uma excelente clientela, por isso não quero botar tudo a perder por sua causa.
-Por minha causa? Não estou entendo, pode ser mais claro?
- Lembra-se de quando me pediu dinheiro emprestado? Você garantiu, em nome da nossa amizade, que me pagaria, assim que pudesse. Ainda hoje, eu me lembro das suas últimas palavras: “Não vou me sujar com você, por causa de um reles dinheiro.”. Que ironia! Sendo assim, não moverei uma palha para te ajudar.
Antes que dissesse alguma coisa, levantei-me, caminhei até a porta e abri dizendo:
-Passe bem.