O Conto Moderno
Era uma vez um jovem, chamado John, criado as margens do canal do Barreiro, como tantas outras crianças em varias manhãs. A mãe saia para o seu trabalho de faxineira, enquanto que o pai, como na certidão, estava não declarado. John levantava cedo com uma enorme preguiça, mas empurrado por sua mãe, para ganhar a bolsa escola, o garoto se deslocava sem qualquer vontade.
Na mesma escola de seus avôs, curtindo a mesma aula de 1920, diferente em alguns aspectos, quanto ao quadro branco, um pincel caneta, a escola agora estava com a cara de presidio, a quadra de esportes abandonada e os professores cansados e sem estruturas. Combinando o matinal com o noturno, era uma verdadeira guerrilha, entre os poucos que queriam aprender e a maioria, que levava pra dentro da escola tanta mal cultura e desobediência à ordem, aliados dessa rebeldia na fase de adolescentes. Meninos já tinham batido em professores, já tinham sido presos com drogas e armas. Esse era o panorama de um dos ambientes de John, que ao sair da escola, feito fera presa, posta em liberdade, junto com alguns colegas da sua rua, que ele confiava viravam tudo do avesso. Transformaram as poucas brincadeiras de empinar papagaio, pegar lata, elástico, em algo mais produtivo, ou seja, destrutivo, e nas horas mais vagas fumavam, bebiam, andavam de bicicleta a furtar e levavam “petecas” de drogas para vender no cruzamento do sinal, nas praças do centro, nas esquinas das ruas mal iluminadas.
Sempre estava com dinheiro nas mãos e sua mãe ficava feliz, sem querer saber a origem ela só agradecia a “deus”.
Como muitos meninos do nosso dia a dia, ele foi crescendo, entre a adolescência e a desigualdade existente. Era negro, por descendência e resolveu pintar o cabelo de amarelo, colocando pinces, argolas e umas tatuagens em apologia à guerra, elogio a sua mãe e a sua namorada. Andava com o boné ao contrario na cabeça, vestia camisa escura de mangas compridas com capuz e falava gírias e pornografias.
Num dos raros momentos, assistindo ao sol nascer do alto de sua palafita, encantava-se com rio, com as árvores que cresciam ao redor daquele fétido canal. Não obstante, a insensibilidade, algo dentro da alma lhe elevava a um voo ideológico, pensava em transformar todo aquele ambiente, num lugar melhor pra sua comunidade.
Sabendo que naquele ambiente pouco poderia evoluir, pois não haviam incentivos para que os garotos dali se tornassem homens da sociedade, decidiu a cada dia seguir o chamado do caminho, que oferece abundância momentânea e vida passageira.
Foi assim, valorizando os bens, dinheiro e poder de influenciar, de se tornar celebridade, de ser importante na sociedade, que John se integrou a pequenos furtos.
A cidade erguida sobre as nossas cabeças; como prédios, placas, sinais e leis impostas as nossas vontades, quase sempre eram burladas, mas haviam aqueles que não enxergavam como contravenção, tema pitoresco da falta de educação. Nesse termo todos iam e vinham adotando o medo como segurança. Quando o Estado das coisas sem rumo, perdidas se manifestaram. Começaram a surgir os que não perguntam, os que julgam serem os heróis, os que são apoiados pela ditadura da ignorância e pelo sistema, pois matam e nunca são descobertos, são protegidos pelos que fazem juízo de valores, sem enxergar a sua hipocresia.
No bairro tal, havia cidadãos e não cidadãos, crianças e adolescentes assistindo a um jogo de futebol, quando de repente, bem devagar, surge o carro prata, o vermelho e o carro preto, abrem as portas e vê-se sair homens encapuzados, feito a “Kon Klus Khan”, que sem perguntar ou identificar alguém, foram logo atirando, muitos correram, muitos foram alvejados e mortos. O jornal divulgou, a justiça fez o seu alarde, ninguém foi identificado ou punido e o acontecimento passou em branco como a” visagem”, lá do interior, como lenda urbana, que sem perguntar nada matava de susto.
Na noite seguinte, um vigilante vinha chegando em casa e viu o portão da casa do vizinho escancarada, resolveu fecha-lo e enquanto fechava sua esposa assistiu, que o carro preto chegou na surdina e que quando o rapaz se deu conta do perigo, fechou o portão tropeçando de medo e se jogou pra dentro do palanque do vizinho. O carro só baixou o vidro e se foi na escuridão da rua mal iluminada.
Até que numa terça feira de novena, cedo da noite, John após vários furtos, agora conhecido como o “Coiote”, sentado com os seus considerados a beira do canal, a se divertirem com jogo de cartas; entretidos não viram chegar o carro prata, que como sempre calado, se aproximou mais ainda e assassinou seis jovens. O jornal, como manchete estampou “A cidade sangra, as mães choram e o Estado diz estar tudo bem”.
Agora que as famílias estão avisadas, sair a noite é muito perigoso, visto que você pode se deparar com os carros preto, prata ou vermelho e ter a sua sentença de morte decretada, sem qualquer direito de defesa.
A mãe de John pra reconhecer o corpo, anda teria dito, que o menino roubava mas pregava a paz, assim como o Estado hoje faz. Concluiu o Secretário de Segurança em entrevista na manhã seguinte.