O Céu é o Tórax

É uma menina. Tem sete anos, cabelos escuros e uma pinta no lado esquerdo da testa. Está em pé, completamente imóvel, sorriso petrificado. Seus olhos não piscam. Atrás dela, um mar manso, também paralisado; as ondas suaves inertes, como que congeladas durante um dia ensolarado. É uma foto.

A foto está nas mãos do idoso. Ele tem uma pinta no lado esquerdo da testa, marca notável em várias gerações de sua família. Está sentado confortavelmente e observa, de olhos marejados, a imagem da menina. Ao redor dele, tudo vermelho. E o vermelho vibra, como um terremoto escarlate, no compasso do tambor de som grave que ecoa por todos os lados. Ele está dentro de seu próprio coração.

Um coração bonito e grande. Eis o tambor de som grave. Mantra ancestral, essa percussão cardíaca. A primeiríssima música da vida. É onde ele reside agora, consciente dentro dele mesmo.

Do lado de fora, sonda no nariz, fios e mais fios conectados em suas mãos, picadas e mais picadas em suas veias martirizadas. Ele está em coma há semanas. Porém, sentado confortavelmente dentro do próprio coração, com os olhos marejados, ele só pensa na falta que lhe faz sua princesa, sua amada neta. Sua nora colou a foto da pequena, sorridente numa praia de Salvador, na parede ao lado de seu leito, na UTI da Santa Casa.

Breno Freitas
Enviado por Breno Freitas em 03/07/2017
Reeditado em 04/07/2017
Código do texto: T6044583
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