"Ao olhar para o relógio posicionado numa das paredes..." - AINDA SEM TÍTULO

Ao olhar para o relógio posicionado numa das paredes da sala onde trabalhava, Edgar ficou alarmado com a mensagem que os ponteiros lhe enviaram: seu expediente já havia terminado há exatos 45 minutos. Como bom workaholic que era, o homem normalmente ficava até mais tarde no escritório adiantando tarefas, resolvendo problemas e bebendo café, mas naquele dia, ele sabia, o trabalho não deveria ter sido tão importante. "Merda, merda, merda!", rosnava, enquanto tentava, de modo engraçado e pouco eficiente, recolher e organizar num calhamaço os papéis que cobriam a mesa amadeirada sobre a qual Edgar costumava ler e redigir processos de pessoas que disputavam a guarda dos filhos ou que reivindicavam pagamentos de pensões atrasadas. Os advogados normalmente são elogiados pela postura controlada que exibem, mas a aflição que tomava conta do semblante de Edgar sugeria que, no momento, ele definitivamente não estava agindo como alguém que aprendeu a sorrir e a acenar mesmo quando via seus argumentos serem derrotados em tribunais.

Os ponteiros do relógio continuavam dando voltas e, de forma semelhante, Edgar também zanzava pela sala afim de ajeitar as coisas para poder ir embora. Obviamente, pelo trabalho que fez, o advogado não subiria ao pódio para receber a medalha de pessoa mais organizada do mundo, mas, àquela altura, aquilo pouco lhe importava. Trancou a porta do escritório, sabendo que a bagunça do lado interno do cômodo teria a mesma proporção assustadora na segunda-feira. Edgar encolheu os ombros, num gesto que sugeria sua despreocupação quanto às coisas fora de lugar, e, prestes a entrar no elevador que o levaria até o andar térreo da empresa, foi parado por uma vozinha feminina irritantemente conhecida:

-Já vai, seu Edgar? - era Cláudia, a recepcionista gostosa que gastava boa parte do salário que recebia em procedimentos estéticos - A Dona Michele não esteve completando anos esses dias? Dê um abraço nela por mim, sim?

-Hã... Ok, pode deixar. - Edgar virou o pescoço para fitar Cláudia. A verdade é que ele mal havia prestado atenção nas palavras da secretária, mas não pôde deixar de reparar, entretanto, nos seios fartos que quase saltavam da blusa decotada da mulher. A beleza de Cláudia deixava o advogado alucinado e, secretamente, ele desejava comê-la em algum lugar inusitado do trabalho. Ah, se o hobby preferido de sua esposa não fosse investigar a vida dele...

"Minha mulher, sim, certo!", o devaneio erótico de Edgar foi pausado bruscamente e, apressado e sem alternativas, o advogado entrou no elevador. Enquanto a estrutura que o abrigava fazia sua descida para o primeiro andar do prédio, o homem lembrou-se de que Cláudia havia mencionado o nome de Michele. "O que será que ela quer com minha mulher? Teria mandado um recado talvez?", Edgar balançou a cabeça, numa tentativa de rememorar as frases proferidas pela secretária boazuda minutos atrás, mas, percebeu, desolado, que sua memória já não o ajudava como antes. "Deixa pra lá, não tem importância", concluiu, saindo do elevador e caminhando em direção ao entardecer de uma sexta-feira de abril.

CONTINUA

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Bela e Convencida
Enviado por Bela e Convencida em 29/06/2017
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