Geração vídeogame
Não nego que descendo da “Geração Suspensório”. Para os mais jovens, segundo o Aurélio, suspensórios é um par de tiras que, passando pelos ombros e cruzando-se nas costas, sustenta as calças pelo cós. Antiga peça de vestuário que usei durante a minha infância. Ainda existem saudosistas, a exemplo do Eurico Miranda, Presidente do Vasco da Gama, que mantém esse costume. Era a época em que a bermuda era conhecida como calça curta. Assumo que estou beirando os sete pontos zero, diferentemente de uns e outros, que já octogenários ficam se disfarçando de PQGs (pensam que são gatinhos).
Sou grato ao Grande Arquiteto do Universo, que me concedeu a bênção de poder ultrapassar, com vida, saúde e feições de menino muitas outras gerações, entre as quais a Geração Chiclete, a Coca-Cola, a Discoteca, etc. “Tirando todas de letra. Porém, a modernidade bateu na minha porta. Aí o “bicho” começou a pegar. Já me aproximando dos quarenta, eis que surge a Geração Videogame. Crianças que nunca tinham ouvido falar no tal suspensório recebiam de seus pais o Atari, valioso presente, símbolo de uma nova era. Nós, pais, comprávamos as tais engenhocas para os nossos filhos, mas, poucos foram os que ousaram brincar com seus pimpolhos nesses modernos aparelhos eletrônicos. Muitos por desinteresse, outro tanto, entre os quais eu me incluo, por inabilidade para manusear as novas invenções, deixando que a gurizada brincasse com seus pares. Esses garotos de então, tomaram gosto pela coisa e se tornaram dependentes de tais inventos. O tempo foi passando e novos e complexos videogames foram surgindo no mercado e os pais comprando e cada vez mais a gurizada se aperfeiçoando. Pouco tempo depois surgiram os PCs,( computadores de mesa). Logo, logo a Geração Videogame passou a dominar os computadores com muita desenvoltura. Lembro-me que antes da Geração Videogame para ingressarmos no serviço público, na maioria dos concursos, tínhamos que saber datilografar, técnica que aprendíamos nas escolas de datilografia, manuseando as antigas Remington, Olivetti e afins. Após o curso recebíamos o diploma de datilógrafos. Hoje só manuseando o computador a meninada já aprende a digitar. Quase que paralelamente surgiram os celulares, que também evoluíram e possuem tantos recursos, que se tornaram verdadeiros minicomputadores. Esses adolescentes e jovens adultos, oriundos da Geração Videogame, dominam também com maestria os tais telefones móveis. Porém, como se quisessem reter para si os conhecimentos da informatização adquiridos, eles demonstram imensa má vontade em ensinar aos seus pais, quando estes a eles recorrem. Eles se esquecem de que foram os seus genitores os responsáveis pelos conhecimentos tecnológicos que eles adquiriram.
Um amigo me disse: padeço desse mal. Meus pimpolhos, um menino e duas meninas - justiça se faça ao menino -, hoje já adultos e formados não agiam de forma diferente. Ou melhor, ainda hoje não têm paciência de ensinar o passo a passo, quando a eles recorro. Resolvem a minha pendenga de forma açodada e querem que eu capte o amontoado de informações, meramente técnicas, num abrir e fechar de olhos. Impossível! Eles ainda têm a desfaçatez de me dizer que preciso ir para uma escola de informática. Mas, certa feita, eu dei o troco em uma das filhas. Estava bebericando um saboroso chope, no Shopping, quando o meu celular tocou. Atendi a ligação. Era a mais velha me pedindo para comprar chocolates para ela. Solícito como sempre fui para os meus rebentos, apressei-me em atender ao pedido da princesa. Chegando a casa, gentilmente lhe entreguei a guloseima. Como eu tinha uma pendência a ser resolvida no computador e necessitava dos seus préstimos, a ela recorri pedindo a sua ajuda. Aí a danada esboçou aquela má vontade que deixa qualquer pai irritado.
Não pestanejei e parti para o contra-ataque. Para ser mais franco, apelei: - Já que você não quer me ajudar então me devolva o chocolate. E imediatamente tomei posse da guloseima. Chocólatra como ela é, não contou até três para resgatar a iguaria. Rapidinho se aboletou em frente ao computador e, num passe de mágica, a minha pendência foi resolvida. Contudo, sem o passo a passo para não fugir à regra que eles impõem.
Resumo da ópera: pai tem sempre uma “carta na manga” para usá-la sempre que se deparar com uma situação igual a essa.
Salvador, 03 de maio de 2017.
Valmari Nogueira